Um alerta vermelho dos cientistas, para que haja futuro!
Não é o homem quem domina o mundo.
Aprenda-se a lição que o novo coronavírus veio dar à Humanidade.
«Investigadores afirmam que a pandemia de Covid-19 deve ser encarada como um aviso mortal. Ou seja, devemos pensar nos animais como parceiros, cuja saúde e habitats têm de ser protegidos para evitar o próximo surto global.
O novo coronavírus, que já atravessou o mundo para infectar mais de um milhão de pessoas, começou como tantas pandemias e surtos no passado: dentro de um animal. O hospedeiro original do vírus foi quase certamente um morcego, tal como aconteceu com o ébola, o SARS, o MERS e vírus menos conhecidos como o Nipah e o Marburg. O VIH migrou para os seres humanos há mais de um século, vindo de um chimpanzé. O influenza A “saltou” das aves para os porcos e para as pessoas. Os roedores espalharam a febre de Lassa na África Ocidental. Mas, segundo os cientistas que estudam as doenças zoonóticas, que passam dos animais para as pessoas, o problema não são os animais, somos nós.»
«Os animais selvagens sempre foram portadores de vírus. O tráfico mundial de animais selvagens no valor de milhares de milhões de dólares, a intensificação da agricultura, a desflorestação e a urbanização estão aproximando as pessoas dos animais, dando aos seus vírus aquilo que precisam para nos infectar: oportunidade. A maioria falha, mas alguns são bem-sucedidos. Muito poucos, como o SARS-CoV-2, triunfam, ajudados por uma população humana interligada que pode transportar um agente patogénico para todo o mundo e em poucas horas.
À medida que o mundo se esforça por fazer face a uma crise económica e de saúde pública sem precedentes, muitos investigadores da doença afirmam que a pandemia de Covid-19 deve ser encarada como um aviso mortal. Isso significa pensar nos animais como parceiros, cuja saúde e habitats devem ser protegidos para evitar o próximo surto global.
Peter Daszak, ecologista de doenças e presidente da EcoHealth Alliance, uma organização de saúde pública que estuda as doenças emergentes afirmou que «As pandemias, no seu conjunto, estão a aumentar de frequência. Não é um acto aleatório de Deus. É causado pelo que fazemos ao meio ambiente. Temos de começar a ligar essa cadeia e fazer estas coisas de forma menos arriscada. (…) Os pontos mais propícios à propagação de vírus têm três coisas em comum: muitas pessoas, diversas plantas e animais e rápidas mudanças ambientais.»
Segundo os cientistas, cerca de 70% das doenças infecciosas emergentes nos seres humanos são de origem animal e podem existir cerca de 1,7 milhões de vírus por descobrir na vida selvagem. Muitos investigadores estão à procura dos próximos vírus que poderão passar de animais para os humanos.
Thomas Gillespie, ecologista de doenças da Universidade de Emory, no estado da Geórgia, nos Estados Unidos da América afirmou que «os roedores e morcegos são dos mais prováveis hospedeiros para as doenças zoonóticas. Cerca de metade das espécies de mamíferos são roedores e cerca de um quarto são morcegos. Os morcegos constituem cerca de 50% dos mamíferos nas regiões tropicais com maior biodiversidade e, embora sejam valiosos polinizadores e devoradores de pragas, são também espantosos transmissores de vírus. Têm um sistema imunitário que é uma espécie de super-herói que lhes permite tornarem-se “reservatórios de muitos agentes patogénicos que não os afectam, mas que podem ter um impacto tremendo em nós se forem capazes de dar o ‘salto’”. E cada vez tornamos o “salto” mais fácil.»
No final do ano passado, um coronavírus de morcego-de-ferradura surgiu na China, onde o comércio de animais exóticos é impulsionado por gostos de luxo, pela caça e pela procura de produtos utilizados para fins medicinais. No Wet Market [mercados de animais selvagens ao ar livre] em Wuhan, ligado aos primeiros casos de Covid-19, pelo menos uma loja vendeu animais como filhotes de lobo e gatos-civeta para consumo. Estes mercados, dizem os especialistas, apresentam animais stressados e doentes, empilhados em gaiolas, num ambiente repleto de fluidos corporais, onde também se mata animais e corta carne — condições ideais para o “salto” do vírus entre espécies.
Embora os morcegos-de-ferradura sejam caçados e comidos na China, não é fácil perceber como é que o vírus do morcego infectou as primeiras pessoas. O rasto dos primeiros casos levou ao mercado de animais, mas o espaço foi fechado e higienizado antes de os investigadores conseguirem localizar o animal que poderia estar implicado. E provavelmente esta nem foi a localização do tal “salto” do vírus para os humanos em si, o que poderá ter acontecido semanas antes, possivelmente em Novembro. Alguns dos primeiros casos não tinham qualquer ligação com o mercado de animais.
Como o novo coronavírus não é idêntico a nenhum vírus conhecido de morcego, houve algures entre o morcego e o ser humano uma mutação em pelo menos um intermediário, talvez o ameaçado pangolim, um mamífero muito traficado pelas suas escamas.
O surto de SARS de 2003, que acabou por ser associado aos morcegos-de-ferradura por cientistas que se embrenharam em escorregadias grutas forradas por guano [acumulação de fezes de morcegos e aves], foi também rastreado até aos mercados de animais selvagens. Os cientistas acreditam que esse coronavírus “saltou” de morcegos para gatos-civeta — mamíferos semelhantes a gatos, vendidos para consumo — para humanos.
Chris Walzer, director executivo do programa de saúde global da Wildlife Conservation Society (WCS), disse aos jornalistas que «um dos principais ambientes para a ocorrência destes ‘saltos’ são os mercados e o comércio internacional de animais selvagens».
Por sua vez, Fabian Leendertz, veterinário que estuda doenças zoonóticas no Instituto Robert Koch, em Berlim disse que «na África, a diminuição das populações de grandes mamíferos faz com que a caça aponte o alvo a espécies cada vez mais pequenas, incluindo roedores e morcegos, afirmou. Embora alguns animais sejam consumidos para subsistência ou fins tradicionais, as vendas de carne exótica são também uma “enorme economia” nas megacidades em rápido crescimento. É algo que eu pararia primeiro. O risco reside “numa maior pressão de caça e numa maior taxa de contacto para aqueles que vão caçar e para aqueles que depois tratam a carne».
Daszak afirmou que «o comércio internacional de animais exóticos, como répteis e peixes, também é preocupante, porque os animais raramente são testados para detectar agentes patogénicos que possam adoecer os humanos. Quando penso no principal factor de risco, é a gripe A, que está ligada à produção de porcos e galinhas». E Gillespie remata: «Assim como as grandes “explorações fabris” repletas de animais.»
Mas a criação de animais não é o único local em que um vírus pode passar a barreira de espécies. Os seres humanos partilham cada vez mais espaço com a vida selvagem e alteram-na de forma perigosa, dizem os investigadores. A doença de Lyme, causada por uma bactéria, propaga-se mais facilmente no Leste dos Estados Unidos porque as florestas fragmentadas têm menos predadores, como raposas e gambás, que comem ratos que albergam carraças que espalham Lyme, dizem estudos. A construção de edifícios leva a uma coexistência mais estreita com alguns animais selvagens, incluindo morcegos, disse Leendertz.
Os cientistas apontam o aparecimento na Malásia, em 1998, do vírus Nipah, que matou centenas de pessoas em vários surtos na Ásia, como um exemplo vívido de um vírus que passou a barreira e “saltou” para os humanos, alimentado pelas alterações ambientais e pela intensificação da agricultura. A desflorestação de florestas tropicais para a produção de óleo de palma e madeira deslocou morcegos-da-fruta, alguns dos quais acabaram em explorações de suínos, onde também cresciam mangueiras e outras árvores de fruto. Os morcegos “caem mais do que comem”, disse Gillespie — a saliva e as fezes infectaram os porcos que se encontravam em baixo. Os porcos adoeceram e infectaram os trabalhadores agrícolas e as pessoas próximos da indústria.
«Onde quer que estejamos a criar novas interfaces, este é provavelmente um risco que temos de considerar seriamente”, afirmou. “Estamos a forçar a vida selvagem a procurar novas fontes de alimento. Estamos a forçar a mudar o seu comportamento de formas que os colocam em melhor posição para transferir o patogénico para nós».
A Wildlife Conservation Society e outros grupos exortam os países a proibir o comércio de animais selvagens para fins alimentares e a fechar os mercados de animais vivos. Anthony S. Fauci, o maior especialista em doenças infecciosas dos EUA e o rosto da resposta do país à pandemia, disse que a comunidade mundial deveria pressionar a China e outras nações que acolhem esses mercados para os fechar. «Fico perplexo como, quando temos tantas doenças que emanam dessa invulgar interface humano-animal, não nos limitemos a desligá-la», disse Fauci à Fox News.
A China, que interrompeu brevemente o comércio de gatos-civeta após o surto da SARS, anunciou em Fevereiro uma proibição do transporte e venda de animais selvagens, mas apenas até que a epidemia do novo coronavírus seja eliminada. É necessária legislação permanente, afirmou Aili Kang, directora executiva do programa WCS para a Ásia.
«É necessária uma vigilância mais rigorosa das doenças dos animais selvagens — encará-los como “sentinelas», disse Leendertz. «Certo é que há uma percepção generalizada de que a construção em habitats selvagens pode alimentar crises de saúde pública» afirmou Gillespie. Muitos investigadores afirmam que a actual pandemia sublinha a necessidade de uma abordagem mais holística de “saúde única”, que encara a saúde humana, animal e ambiental como estando interligadas.
«É necessário que haja uma mudança cultural a partir de um nível comunitário sobre a forma como tratamos os animais, a nossa compreensão dos perigos e dos riscos para a biossegurança a que nos expomos», afirmou Kate Jones, professora de Ecologia e Biodiversidade do University College London. «Isso significa deixar os ecossistemas intactos, não destruí-los. Significa pensar de uma forma mais duradoura».
Fontes: ANDA
Apresento-vos mais um texto, um magnífico texto de um jovem que lê e estuda, e está a anos luz dos deputados da Nação que pugnam pela tortura de Touros nas arenas portuguesas.
Senhores deputados do PS, do PCP, do PSD, do CDS/PP: se ainda não leram, leiam este texto de Daniel Catarino da Silva e sintam-se envergonhados, pelo menos, desta vez…
Origem da imagem:
https://www.fascinioegito.sh06.com/boiapis.htm
O TOURO QUE QUERIA SER CÃO
Texto de Daniel Catarino da Silva
(Estudante de Biomedicina na University College London)
«A tourada, despida de toda a roupagem e maravilha sensorial, consiste em retirarmos prazer do sofrimento de um ser colocado em posição inferior. É a apologia da barbárie.
Discute-se se se discute civilização quando são discutidas touradas. Debatendo nós noções fundamentais acerca do tratamento de animais que consideramos em inferior posição e, assim, o autocontrolo sobre o nosso próprio poder e o quadro de valores que nos define enquanto espécie, que outra coisa poderemos nós estar a discutir que não civilização?
Recordo aqui uma porção elucidativa da lei aprovada em 2014 - “Quem, sem motivo legítimo, infligir dor, sofrimento ou quaisquer outros maus-tratos físicos a um animal de companhia é punido com pena de prisão”. Daqui retiro duas ilações. Ou deduções. Ou outra coisa qualquer. Existe um princípio fundamental que faz distinguir, em essência ou natureza, os animais de companhia dos demais. Ou, em alternativa, existe um motivo legítimo para, e cito, infligir dor e sofrimento nos animais. A famosa terceira via, porventura, é uma embriaguez de hipocrisia.
Sempre ouço, das mais diversas e tremendas fontes de sapiência, que nós, seres humanos, somos animais racionais, não somos como os outros. Somos mais evoluídos. Somos superiores. Não, meus caros, não somos. Está nos livros. E quem não os lê, que olhe em volta. A vaidosa superioridade, que espertamente gostamos de ostentar, serve apenas como hábil máscara de hipocrisia, ocultando em trajes, música, arenas e espectáculo, a saciedade que nos dá o cheiro a sangue. Somos iguais à bicharada que tanto desprezamos. Só que nos vestimos melhor.
A marcha pelos direitos dos animais assenta na consciencialização e no conhecimento que progressivamente acumulamos sobre a biologia animal e, especificamente, sobre aspectos da sua dimensão sensorial, emocional, social e até do seu sentido de consciência. Os humanos não são uma entidade celestial, lateral à arborização evolutiva que a Natureza arquitectou, num caminho para atingir um qualquer gáudio teleológico. A evolução é um processo gradual e que diferencia espécies fundamentalmente numa lógica quantitativa, na qual o Homem é excelso numas capacidades e medíocre noutras tantas.
Quer isto significar que não há a pedra e o Homem, haverá sim um gradiente de complexidade intelectual e social entre todos os animais. Gradiente, aliás, que espelha a maquinaria interna dos mesmos. O que atribui ao homem as suas excepcionais qualidades é, não uma descendência divina espírita, mas o cérebro que traz consigo. Do mesmo modo, tantas outras espécies, com complexidades distintas, carregam consigo o substrato biológico que lhes permite, embora com menor grau de complexidade, sentir felicidade, dor, ansiedade, angústia, desejo, entre tantas outras sensações. Espécies mais sofisticadas como o elefante, o golfinho ou o chimpanzé organizam-se em intricadas relações sociais, sociedades onde se assiste à prática de funerais, onde se faz o luto, onde há uma teia hierárquica social mutuamente reconhecida, onde se brinca e se ajuda, onde se ensina e se aprende. Onde há cuidado, protecção, laços que duram uma vida, onde há aquilo a que, francamente, qualquer um de nós que olhasse atentamente chamaria amor.
E onde temos uma noção mais próxima desta sofisticação da natureza é junto daquilo que temos por perto, já que ao desconhecido cedemos à tendência humana de voluntária desconsideração. Nos nossos gatos, e sobretudo nos nossos cães, encontramos ecos suaves da nossa própria dimensão e sentido de consciência, decorrendo daí uma vontade colectiva de os proteger, incluindo com instrumento legal. Sentimos repulsa, em geral, por quem abusa dos seus animais de estimação, agredindo-os sistematicamente, ou sujeitando-os a condições de vida degradantes. Ninguém grita, “Espanque o seu cão! Vá, mais!”. Mas, já pelo cair da noite, a chiqueza folclórica reúne-se no Campo Pequeno para se rejubilar com o tradicional e “legitimamente” admirado espectáculo cultural que é a grande tourada portuguesa. O puritanismo quotidiano contra a violência é substituído pelo excitante e vibrante arrepio dos poros que sentimos quando, lá em baixo, na arena, o mestre cavaleiro, de grande destreza, acaba de trucidar um pouco mais o dorso do animal. Mas, como diz a lei, tal é legítimo. E como não é de mais citar, certamente “existe um motivo legítimo para infligir dor e sofrimento nos animais” quando esse motivo é o deleite de uma multidão que “legitimamente” parece ter todo direito de tirar prazer da tortura de um animal. É porque é disso que se trata. É que para ouvir música, apreciar trajes, visitar arenas ou vislumbrar animais, existem outras actividades que não envolvem esfacelar um ser vivo.
Há com certeza um sentido de espectáculo numa tourada, mas isso está longe de configurar uma noção de arte ou cultura. Alguém duvida que uma luta de gladiadores ou outras demonstrações de maior crueldade nos circos romanos configuravam grandes espectáculos? Seguramente que, com toda a sua violência e visceralidade, aqueciam as paixões das suas assistências, tal é a tendência primal do homem para se enfeitiçar com o sangue, com a morte e com a brutalidade. Não por isso lhe podemos chamar arte, nem tão pouco poderemos justificar qualquer acto com a invocação da tradição. Como este parágrafo deixa subentendido, tradições perdem-se nos caminhos da História. Felizmente, as sociedades evoluíram ao longo de séculos para entender a arte como um elevador intelectual, como um elemento de transcendência da nossa “existência animal”, despertador e provocador da consciência cívica, como um veículo de significado e como uma forma de expressão e comunhão da nossa complexa humanidade.
A tourada, despida de toda a roupagem e maravilha sensorial, consiste em retirarmos prazer do sofrimento de um ser colocado em posição inferior. É a apologia da barbárie. Até segundo uma visão antropocêntrica, é-me difícil compreender esta lógica. Então, se nos consideramos mais valiosos que o restante mundo natural, se somos melhores que os outros animais, não deveria isso trazer a responsabilidade e o dever de deles cuidar? Não é a verdadeira medida de um homem ou mulher a forma como trata aqueles em posição inferior à sua? Eu sou um humanista e no meu modelo de humano não há espaço para o prazer com a tortura e o sofrimento.
A lei que temos contra os maus-tratos a animais está certa e espelha já a tal orientação de civilização. Mas o mesmo carácter pedagógico e dissuasor que imprime ao condenar o abuso dos animais de companhia é cabalmente e escandalosamente desautorizado, quando, no mesmo quadro legal, se permite não só maltratar, mas brutalizar outros animais, para puro deleite de uma plateia. O grande mantra: só lá vai quem quer. Bem, menos os touros. Como uns são filhos e outros enteados, também uns são cães e outros touros. Citando, com a devida ironia, Miguel Esteves Cardoso, como é linda a puta da vida.
(As passagens a negrito são da responsabilidade da autora do Blogue)
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