Um texto [clicar no link] de leitura obrigatória, independentemente das cores políticas dos leitores, publicado no Jornal Observador, em 24 de Setembro de 2024, o qual me chegou via e-mail (I.A.F.)
A loucura como hipótese
A guerra na Ucrânia é certamente o maior e o mais sério desafio que se coloca a todas as nações e a todos os seres vivos do nosso tempo, desafio que compreende a cada um de nós apenas duas alternativas: acomodação ou resistência.
Todos os dias são publicados textos de defensores de ambas as alternativas, muitos dos nossos amigos dividem-se na escolha e o planeta está dividido entre países e governos de ambos os lados da barricada. De um lado as democracias que, tal como em 1939, defendem a resistência á barbárie de um mundo de loucos sádicos à maneira de Hitler e outros defensores da acomodação, como a forma de evitar males maiores.
Por detrás de ambas as posições está bem vivo o perigo da guerra nuclear, sendo que nesse caso temos novamente duas posições: (1) os que acreditam que a guerra nuclear é de tal forma impensável que nenhum país ou dirigente político cometerá a loucura de desencadear o que poderá ser o fim da vida no planeta; (2) os que pensam, como eu, que tal possibilidade é real e haverá mesmo os que considerem que essa guerra é inevitável, porque no nosso tempo existe no mundo um número suficiente de loucos no poder.
A escolha entre estas duas posições no caso da Ucrânia também não resolve o problema de ambos os lados da equação, porque se a continuação da guerra na Ucrânia implica o perigo da guerra nuclear, a acomodação com as exigências de Putin não garante que a Rússia, com Putin ou sem ele, não aumente futuramente a parada das exigências, como acontece com qualquer ditador bem-sucedido.
Sendo assim voltamos ao início da questão, acomodação ou resistência, são posições justificáveis, em que ambas têm medo da guerra nuclear, mas apontam para formas diferentes de a prevenir. Os primeiros defendem a derrota da Rússia através do seu enfraquecimento económico e do fornecimento de armas há Ucrânia. Os segundos cedendo território à Rússia e aceitando o princípio de que é aceitável o desejo de Putin de restaurar o antigo império russo, ou mesmo a anterior União Soviética, não sabemos. O que implica o recuo da NATO para as suas antigas fronteiras e uma vitória da China e da Rússia, duas autocracias desejosas do domínio geoestratégico do planeta.
A minha posição pessoal tem sido próxima da resistência, mas com a nota de que a paz deve ser procurada por todas as formas, em particular através da ONU. Tenho sido crítico de António Guterres por ter feito muito pouco nesse sentido, o que o conhecendo não me surpreende. Assim, defendi e defendo que a chave do problema reside na China, pelo que na posição do Secretário-Geral das Nações Unidas procuraria a nomeação de uma comissão aprovada na Assembleia Geral de três países para negociar a paz, comissão dirigida pela China. Ou seja, a clarificação da posição da China no conflito, a que a China compreensivelmente tem fugido, teria enormes vantagens para o mundo, eventualmente para a paz.
Existem outras razões para a minha posição de resistência. Desde logo porque sem preservar alguma forma de domínio das democracias nos campos militares, tecnológicos e comerciais, ficaremos todos dependentes das autocracias, o que colocaria em perigo a nossa forma de vida democrática.
Também porque acredito que todos os povos desejam ser livres e que mais cedo ou mais tarde, por si próprios e sem a ajuda externa - que é sempre perigosa e justificativa de reacções contrárias - acabarão por se libertar. O caso presente da Venezuela é um exemplo, a Coreia do Norte o exemplo oposto.
Uma outra questão é que a NATO actua na defesa das democracias e ao longo de setenta anos nunca atacou qualquer país ou região e só existe em cada país por vontade expressa de forma democrática pelos diferentes povos.
Finalmente, todos sabemos que as democracias, como as conhecemos, enfrentam perigos externos e perigos internos, sendo estes tanto ou mais perigosos que os externos. Esta é a razão por que defendo um novo modelo de gestão mais democrática em todos os níveis da vida dos diferentes países. Mais democracia e mais e melhor educação democrática, o que passa por revolucionar o modelo de educação dos povos, ao colocar a educação dos comportamentos e das competências ao nível do que existe na educação dos conhecimentos. Tenho escrito o suficiente sobre o assunto para não necessitar de mais explicações.
O fenómeno Trump nos Estados Unidos deve colocar todas as democracias a estudar as causas da sua existência e a trabalhar, como defendo, na melhoria do processo democrático. Hoje não basta votar de quatro em quatro anos e a participação democrática dos cidadãos no governo da colectividade é uma necessidade existencial. O combate à exploração económica onde ela existe é uma segunda via, mas sem cedências às manhãs que cantam, que é uma outra forma de ataque ao funcionamento democrático dos povos.
Como muitos de nós neste planeta dividido, tenho as maiores angústias e as maiores dúvidas sobre o futuro. Possuo, todavia, a consciência da necessidade de evitar os extremos, estejam estes onde estiverem. Em democracia os extremos nunca resolveram as dificuldades e os perigos existentes. Mas também não desconheço que haverá sempre alguém que descobrirá terceiras e quartas vias de solução para o dilema colocado, entre a resistência e a acomodação, o que considero serem apenas formas mais ou menos subtis de fugir à questão com que nos debatemos.
24-09-2024
Henrique Neto
Dizem-me os filósofos que a ciência não busca devidamente - e por ordem de prioridades - os conhecimentos mais indispensáveis às necessidades e à felicidade do homem. Os cientistas, por sua vez, dizem-me que a filosofia não sabe explicar – com rigor - as descobertas científicas alcançadas.
Fonte da imagem: https://www.madrimasd.org/blogs/universo/2013/09/13/144426
Reconheço a minha ignorância, ou limites, quer de uma quer da outra: ciência e filosofia. Porém, tenho conhecimento que a filosofia foi uma grande senhora há cem anos: entrava pelas instituições, habitava nos palácios reais, comandava os estabelecimentos de ensino, as religiões e anotava os desvios socias, com os seus comportamentos anárquicos e por aí fora.
A ciência não dominava nesses tempos longínquos. Actuava despercebidamente, envergonhadamente, incerta, medrosa e poucas vezes concluía, com certezas, da sua acção praticada.
Pelo que, embora a filosofia tenha sido desviada do ensino, ela continua activa, vai explicando o que pode, pela simples razão de que é a filosofia que explica a ciência.
Os filósofos, queixam-se-me, e eu limito-me a escutá-los, pois melhor não sei fazer.
Dizem-me que a ciência não consegue explicar a existência de Deus e a da alma no homem. Apenas dizem que o homem e a natureza sofrem e/ou beneficiam da evolução, defendida por Charles Darwin. Mas a filosofia exige que a ciência diga de onde vem o poder, de o homem e da natureza, terem a evolução.
De Deus, dizem os cientistas, ainda não conseguimos lá chegar. A alma, concretamente, também não, pois não sentimos que o indivíduo possa ser duas coisas: corpo e alma, pois é um individuo, um só ser que está à vista.
Ora os filósofos, embora aceitem que a ciência prova que o homem tem consciência – diferente de alma – acusam-nos dessa banal afirmação, porque qualquer lorpa – dizem os filósofos – sabe que o homem tem consciência total de si mesmo: tem a sensação do desejo, da dor, do amor, da raiva, da imagem, da tristeza ou da alegria, da felicidade ou infelicidade e muitos mais atributos.
Queixam-se ainda os filósofos, de que a ciência, em relação aos animais, pouco avançou. Apenas descobriram que os animais têm (somente) o instinto de caçar para comer e o instinto de defesa. Pelo que, diz a ciência, logo que os animais não tenham fome e não se sintam em perigo, dormem e fazem sexo – mas não têm a consciência desse gasto nem a consciência do amor aos filhos que a fêmea pariu.
Sendo verdade que a ciência pouco ou nada se preocupa em descobrir a existência de Deus e da alma (no homem), preocupou-se apenas em recordar á Humanidade que o homem é dotado de consciência com os atributos acima descritos.
Se a consciência tem a lei gravada em si, como pensar, agir, julgar, podemos dizer também que o raciocínio vem da consciência. E que dirão a filosofia e a ciência, da inconsciência que existe na humanidade, sobretudo em homens inteligentes ou de grandes responsabilidades sociais?
Ora a inconsciência, se estamos de acordo, define/tem-na o animal e o homem. Logo, a inconsciência é irracional e o mais que pode conseguir é actuar pelo faro, do qual não tem consciência.
E se estamos de acordo que há homens inconscientes, pois podem estar endemoninhados, desnorteados, exaltados, fanáticos e muito mais estados de inconsciência, porque não apontar meia dúzia de inconscientes bem conhecidos do planeta e da história, de homens sem Deus ou com Ele, sem alma ou com ela?
Que consciência terá tido um Lenine e um Stalin da União Soviética, um Trotsky e um Mao Tsé-Tung da China, um Kin Jong-Um da Coreia do Norte ou um Vladimir Putin, invasor da Ucrânia ou de um Hitler da II guerra mundial? E que dizer da consciência de um Trump da América e de um Bolsonaro do Brasil, de um José Sócrates e de um Ricardo Salgado em Portugal?
Toda esta canalhocracia, é consciente ou inconsciente? Têm Deus e alma ou são portadores de instinto e faro como a animalidade? A ciência ainda não estudou a inconsciência de muitos homens e a filosofia, por isso mesmo, não pode explicar mais nada. Portanto, avenham-se.
A ciência que conheço, é a tarimba da vida e, a filosofia que anuncio é a paz, a justiça social e o bem comum, que tardam.
Artur Soares
(O autor não segue o acordo ortográfico de 1990)
Raif Badwi foi condenado a 10 anos de prisão e 1000 chicotadas pelo crime de PENSAR e DIZER A VERDADE
O prémio sobre a liberdade de pensamento do Parlamento Europeu, conhecido pela designação de Prémio Sakharov, reconhece, cada ano, uma personalidade que se tenha destacado na luta pelos direitos humanos. É um reconhecimento cheio de simbolismos políticos. Uma decisão política. O próprio nome do prémio tem um profundo significado político: lembra-nos a ditadura na União Soviética e o papel que Andrei Sakharov, um cientista nuclear russo, desempenhou na luta pelas liberdades e os direitos das pessoas, na parte final do regime comunista.
Este ano, a escolha recaiu no activista saudita Raif Badawi, um blogger que está preso desde 2012 na Arábia Saudita e que, entre outras coisas, foi condenado ao castigo público de 1 000 chicotadas. Badawi tivera a coragem de apontar o dedo à Universidade Islâmica Imam Muhammad ibn Saud como sendo um viveiro de extremistas religiosos e de terroristas.
Na verdade, o caso de Raif Badawi permite que nos lembremos que a política externa da Europa e do Ocidente em relação à Arábia Saudita é um enredo de ambiguidades e de jogos de dupla linguagem. A preocupação tem sido a de não ofender o regime de Riade. Ora, esse regime precisa de uma Europa que lhe fale a verdade e que lhe diga, nomeadamente, que as suas práticas legais e sociais estão em profunda contradição com os valores universais. São, de facto, inaceitáveis. E que não há desculpa alguma, incluindo na área religiosa ou dos costumes, que possa justificar as absurdidades e as violências praticadas pela liderança da Arábia Saudita.
Por isso, para além de felicitar a coragem de Raif Badawi, há igualmente que reconhecer o mérito da decisão deste ano do Parlamento Europeu.
in:
http://victorangelo.blogs.sapo.pt/uma-boa-decisao-premio-sakharov-2015-684186