Porque estamos em plena época da aberração tauromáquica, aqui vos deixo mais um excelente contributo do Dr. Vasco Reis, único Médico-Veterinário português que dá a cara pela causa da Abolição das Touradas.
Este texto é baseado na Ciência Médico-Veterinária, na Etologia (disciplina da Zoologia que estuda o comportamento animal) e na experiência profissional e desportiva do autor, escrito por ocasião do II Fórum da Cultura Taurina nos Açores, e que trago à liça por considerá-lo crucial para o esclarecimento daqueles que ainda têm dúvidas quanto ao que é esta “coisa” a que chamam de “tauro (touro) maquia (lucro, dinheiro)”, e que não passa, literalmente, de lucro à custa da tortura de Touros.
Um triste “espectáculo” de baixo nível cultural e artístico, onde Touros e Cavalos sofrem para gozo de um escasso número de sádicos, também de baixo nível intelectual e moral. Valeu a pena? Vieram mais ricos espiritualmente? Encheram a alma com imagens de rara beleza…?
«A verdadeira realidade da tauromaquia»
Por Vasco Reis - Médico Veterinário
O activista Dr. Vasco Reis, na sua luta pela extinção de uma prática que não dignifica a Humanidade.
«Está anunciado o II Fórum da Cultura Taurina com especialistas de 9 países que se reúnem durante 3 dias na Ilha Terceira, a campeã da “afición” no Arquipélago.
Os efeitos do fórum serão evidentes, visto que a tauromaquia é uma modalidade que assenta em primeira linha na exploração violenta e cruel do touro, sempre, e do cavalo nos programas em que ele é utilizado como veículo do actor tauromáquico e obrigado a tornar-se “cúmplice” da lide, sofrendo ansiedade e esgotamento e arriscando ferimento e morte.
O fórum está a ser considerado como um momento de reflexão, de prestígio para os Açores, de promoção da atractibilidade da Região e como reforço do turismo.
Considero que, quanto à influência sobre o turismo, as vertentes serão duas e opostas:
Poderá atrair aficionados, gente que sob a designação de arte, aprecia a violência e as fases impressionantes do massacre do touro e as arrancadas e as fintas do cavalo dominado pelo cavaleiro. Poderá também atrair gente tornada curiosa pela publicidade enganosa da organização.
Por outro lado, irá afastar turistas conscientes e compassivos, que vão preferir outros destinos, onde tal espectáculo de massacre não seja permitido.
Quanto à influência sobre o prestígio dos Açores, só pode ser muito negativa, porque publicita o facto de que a Região Autónoma, parte de Portugal (que também é atingido), pertence ao retrógrado grupo dos únicos 9 países do Planeta, onde touros e cavalos são massacrados legalmente.
Falta referir-me ao momento de reflexão, que bem necessário é e para o qual eu pretendo contribuir com muito empenho, argumentando resumidamente com o que a Ciência Médico-Veterinária, a Etologia e a minha experiência profissional e desportiva me ensinaram.
A ciência, fundamentada na investigação anatómica, fisiológica e neurológica dos animais usados na tauromaquia, confirma o que o senso comum revela: touros e cavalos sofrem antes, durante e depois dos espectáculos tauromáquicos.
O touro é o elemento sempre massacrado da tauromaquia, desde intensa e prolongada ansiedade a partir do momento em que é retirado do campo, seguindo-se repetidos e dolorosos ferimentos, esgotamento anímico e físico e quase sempre a morte em longa agonia.
O cavalo, dominado e violentado pelo cavaleiro tauromáquico é o elemento obrigado a arriscar tudo e a sofrer perante o touro, desde ansiedade, ferimento físico até a morte.
Animais são seres dotados de sistema nervoso mais ou menos desenvolvido, que lhes permitem sentir e tomar consciência do que se passa em seu redor e do que é perigoso e agressivo e doloroso. Este facto leva-os a utilizar mecanismos de defesa e de fuga para poderem sobreviver. Sem essas capacidades não poderiam subsistir.
Portanto, medo e dor são essenciais e condição de sobrevivência.
É testemunho da maior ignorância ou intenção de ludíbrio, o afirmar-se que algum animal em qualquer situação possa não sentir medo e dor, se for ameaçado ou ferido.
A ciência revela que anatomia, fisiologia e neurologia do touro, do cavalo e do homem são extremamente semelhantes. Os ADN são quase coincidentes.
As reacções destas espécies são análogas perante a ameaça, o susto e o ferimento.
O especismo é uma atitude que, arrogantemente, coloca o Homem numa posição de superioridade, que lhe permite dispor sobre os animais, como quiser.
A compaixão selectiva visa tratar bem certas espécies (em geral cães e gatos) e menos bem, outras, quase consideradas como objectos.
Os animais não humanos são considerados menos inteligentes do que os seres humanos. Podem estar mais ou menos próximos e mais ou menos familiarizados connosco, mas eles são tanto ou mais sensíveis do que nós ao medo, ao susto e à dor.
É, portanto, nosso dever ético não lhes causar sofrimento desnecessário.
"A compaixão universal é o fundamento da ética" - um pensamento superior do filósofo alemão Arthur Schopenhauer.
A tauromaquia está eivada de especismo sobre o touro e sobre o cavalo.
O homem faz espectáculo e demonstração da sua "superioridade" provocando, fintando, ferindo com panóplia de ferros que cortam, cravam, atravessam, couro, músculos, tendões, órgãos vitais, esgotam, por vezes acabam por matar o touro, em suma lhe provocam enorme e prolongado sofrimento para gáudio de uma assistência que se diverte com o sofrimento, a agonia e a morte de um animal.
Isto é comparável aos espectáculos de circo romano, há muito considerado espectáculo bárbaro, onde escravos e cristãos eram obrigados a lutar e a matarem-se uns aos outros ou eram atirados aos leões para serem devorados.
O cavalo é dominado com ferros castigando as gengivas bucais e a língua e esporas mais ou menos agressivas, até cortantes, no ventre.
Esta montada é posta em risco de mais ferimento e de morte, pelo cavaleiro tauromáquico, que o utiliza como veículo para combater e vencer o touro.
O sofrimento do cavalo soma-se aqui ao do touro.
Na tauromaquia, touro e cavalo são excluídos de qualquer compaixão, antes pelo contrário, estão completamente submetidos à violência e ao sofrimento.
E o espectáculo é ainda legal em Portugal e mais oito países, publicitado e mostrado na comunicação social, aclamado, fonte de negócio, de prosa e de poesia. Que tristeza.
Tauromaquia é a “arte” de dominar e massacrar touros e cavalos e organizar com isso espectáculos para recreação de aficionados ou de simples curiosos.
Mas nesta “arte” não são somente touros e cavalos que sofrem.
São muitas as pessoas conscientes e compassivas, que por esta prática de violência e de crueldade se sentem extremamente preocupadas e indignadas e sofrem solidariamente e a consideram anti educativa, fonte de enorme vergonha e atentatória da reputação internacional de Portugal, obstáculo dissuasor do turismo de pessoas conscientes, que se negam a visitar um país onde tais práticas, que consideram "bárbaras", acontecem! Porque fazem sofrer os animais os chamados “artistas”? Dar-lhes-á isso algum gozo?
Será isso admirável, corajoso, heróico?
Com certeza que existem boas e inócuas alternativas para os aficionados, para os trabalhadores tauromáquicos, para os "artistas", para os campos e para os touros e cavalos.
Os campos podem ser utilizados de outro modo.
A raça pode ser mantida sem a cruel tauromaquia.
Os trabalhadores, campinos e ganadeiros podem continuar o seu trabalho.
Os forcados, cujo papel só surge depois do touro ter sido massacrado e esgotado previamente, podem dedicar-se a actividades ou desportos leais e entre iguais, onde valentia, luta corpo a corpo são fulcrais, como o boxe, a luta livre e outros e que exigem espírito de equipa, como o rugby por exemplo, considerado desporto de cavalheiros.
Aconselho, pela sua mensagem, alguns vídeos extremamente informativos, muito influentes no processo que teve lugar no Parlamento da Catalunha de que resultou a votação que levou à proibição de corridas de touros naquela região autónoma espanhola, facto que está tendo enorme repercussão mundial.
Fundamentado no acima exposto, anseio pela proibição das corridas de touros em Portugal e no mundo. Não quero nem posso admitir que qualquer região ou nação seja vergonhosamente conhecida no seu trato aos animais como sendo uma região ou nação bárbara, retrógrada e cruel.
Na certeza de que V. Exas. tomarão em consideração esta minha mensagem assino-me
Vasco Manuel Martins Reis, médico veterinário desde 1967,
Actualmente aposentado em Aljezur.
Permitam-me o seguinte curto extracto do meu currículo, o qual ilustra alguma da minha experiência prática que dita muitas das minhas opiniões:
Trabalhei 7 anos na Suíça, 10 anos na Alemanha, 3 anos nos Açores (na Praia da Vitória, Ilha Terceira, onde existe afición e onde tive de intervir obrigatoriamente no acompanhamento dos touros nas touradas na minha qualidade de médico veterinário municipal) e 21 anos em Portugal Continental.
Trabalhei sempre, entre outras espécies, com bovinos e cavalos.
Fui cavaleiro de concurso hípico completo e detentor de dois cavalos polivalentes.
Conheço bem os cavalos, a sua personalidade e as suas aptidões.
Fui entusiástico jogador de rugby durante três anos.
Vasco Reis»
Nota: escusado será dizer que este saber do Dr. Vasco Reis, entrou por um ouvido e saiu pelo outro, dos que têm o poder de acabar com esta prática bárbara. E isto acontece porque em cérebros mirrados se não entra nem um grão de poeira, como poderá entrar a Sabedoria? (I.A.F.)