Um texto magnífico de Teresa Botelho, no Blogue Retalhos de Outono, que diz do triste e pobre e medíocre, muito medíocre, estado da Nação…
É pouco provável que o povo acorde. Está dopado com futebol e novelas. E a televisão é a seringa.
Os das touradas pagam IVA a 6% (IVA igual ao das Artes Maiores e do pão dos pobres) para estraçalhar seres vivos dotados de sensibilidade, interesses próprios e dignidade, conforme o reconheceu o Parlamento de Bruxelas, há coisa de uma semana, existindo já legislação que efectiva este reconhecimento, mas apenas fora das fronteiras da Península Ibérica, ou seja na EUROPA e algumas outras partes do mundo. Razão tinha o meu professor de Geografia, na universidade brasileira que frequentei, o qual dizia que a Península Ibérica pertencia à África. Na altura, levantei-me e barafustei. Hoje, ter-lhe-ia dado razão.
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Texto de Teresa Botelho
«O Campo Pequeno tocou hoje na Assembleia!
Quem é que teve o desplante de chamar "Casa da Democracia" a esse edifício neoclássico onde se burla o povo que, de venda nos olhos, a sustenta?
O governo decidiu que o IVA das touradas, não deveria ser de 6% como outros espectáculos, por ser considerado violento e inadaptado à actual evolução civilizacional, mas foi desautorizado não só pela maioria dos partidos, como por metade do grupo parlamentar que o suporta.
Enfim, não será por ninharias que o amianto de certas escolas deixará de ser retirado, as estradas reparadas, os equipamentos médicos renovados, ou se compre pelo menos um comboio novo, para fingir que se investe qualquer coisinha nos transportes públicos.
Voltemos então à "Casa da Democracia" e à votação do IVA das touradas, com música de fundo, olés e uma homenagem especial ao "grupo de forcados do largo do Rato" cujo número afinal é de 43, embora a maioria não consiga já com um gato pelo rabo (salvo seja), quanto mais com um touro...
Nestas coisas de pegas de caras e bandarilhas, a união das bancadas é como aqueles casamentos de conveniência, onde as desavenças e as traições se resolvem com um cartão de crédito.
Um deputado do PSD que por acaso não devia ter grandes razões para graçolas, visto que é um dos arguidos por recebimento indevido de vantagens das viagens ao Euro 2016, pagas pela Olivedesportos e que era para ter sido resolvido no passado mês de Agosto (2018), mas que pelos vistos não o foi por causa do calor, mas se não se falou mais nisso, foi porque agora já faz frio.
O humorista de turno, foi Luís Campos Ferreira que brindou a Assembleia da República com a música da tourada, gravada talvez no seu telefone, pela sua estimada mana Fátima Prós e Contras, durante algum orgasmo familiar experimentado durante as touradas transmitidas pela RTP.
Assim são os políticos portugueses, tranquilos e confiantes, dependendo da quadrilha, porque alguns, como é o caso deste honesto deputado, nem precisam rebaixar-se a justificar as faltas, coisa que, para qualquer funcionário público, dá processo disciplinar, mas para os "trabalhadores da Democracia", não é preocupante, visto que na "Subcomissão de Ética", quem lá está são os amigos. »
Fonte do texto:
A propósito do IVA nas touradas, mal sabia a Ministra da Cultura que, ao dizer que as touradas não são uma questão de gosto, mas de civilização, estaria a dar uma oportunidade aos Portugueses de mostrarem isso mesmo:
que as touradas são uma questão de civilização.
Nunca, como nestas últimas semanas, borbulharam por aí textos e programas pró e contra as touradas, numa esgrima em que os contra, com os seus argumentos racionais, claramente venceram os pró que, como argumentos, apresentaram as maiores irracionalidades de que há memória.
Deixo-vos com mais um excelente texto que mostra o quanto os aficionados estão longe da Civilização.
É assim, majestoso e belo, pastando pacificamente no prado, ao pôr-do-sol, que o Touro deve ser estimado…
O PÚLPITO DOS CHARLATÕES
Texto de António Guerreiro
«Na passada segunda-feira vi o programa Prós e Contras, na RTP 1, e a conclusão a que cheguei, no final, é que há assuntos sobre os quais a televisão, seja pelas características e exigências actuais deste medium, seja pela profunda ignorância e filistinismo dos autores e apresentadores dos programas, presta um serviço fraudulento de desinformação, presta-se a ser o veículo de ideias que não deveriam poder ser difundidas e amplificadas num estação pública, em programas que se reclamam do estatuto de serviço público. O nível da abjecção e da total ausência de pudor é diariamente atingido naqueles programas da manhã e da tarde que supõem a existência de um público lobotomizado. Mas aqui, nos Prós e Contras, apesar da deriva demagógica do título, indiciando que há muita probabilidade de as coisas não correrem bem, supõe-se que é um programa para uma classe de espectadores bem informados, que esperam muito mais do que um serão de entretenimento.
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Livro de recitações
“Os movimentos a favor dos animais, ou melhor, os movimentos contra a crueldade com os animais, fazem parte da tradição humanista dos séculos XIX e XX.”
José Pacheco Pereira, PÚBLICO, 17/11/2018
José Pacheco Pereira escreveu uma crónica a defender o fim das touradas, intitulada Os que “amam” muito os touros e os torturam e matam. Há uma passagem dessa crónica, acima citada, que gostaria de refutar. A tradição humanista, seja ela de que século for, é precisamente a ideologia que está na base das convicções acerca dos homens, dos animais, da natureza e da técnica que servem ainda de argumento para quase tudo, inclusivamente para apoiar as touradas. O nazismo foi um humanismo (como foi dito por um filósofo que escreveu sobre o assunto). Até na globalização há um humanismo integral. Na nossa época, impôs-se em certos domínios a noção de pós-humano, mas o humanismo é muito perseverante. Não é fácil alguém declarar-se anti-humanista. Pensa-se logo que é um misantropo e não alguém que recusa a máquina antropológica que nega a verdadeira fractura do homem.
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O último Prós e Contras era sobre as touradas, sobre as razões que levam uns a defender que elas devem ser mantidas e sobre as razões que levam outros a defender que elas deviam ser abolidas. Como sabemos, este debate está instalado entre nós com bastante virulência e já se percebeu que ele é extremamente incómodo para alguns partidos políticos e para o Governo, que quer fugir dele como o diabo da cruz. É preciso dizer que ele não deve ser desvalorizado, com aquele argumento de que há coisas muito mais importantes e esta não passa de algo inócuo. O que está aqui em jogo, a discussão de fundo, é algo fundamental que se inscreve no cerne da biopolítica contemporânea. A ideia de que está em curso ou já se consumou um animal turn, uma viragem animal, convoca-nos hoje seriamente através de uma bibliografia imensa que se tem produzido nos últimos anos sobre o assunto, vinda sobretudo dos lados da filosofia. O que descobrimos quando frequentamos esta vasta bibliografia é que a questão animal, nas suas mais variadas dimensões (morais, antropológicas, legais, etc.), incluindo a questão maior de saber se eles podem e devem ser sujeitos de direito, está presente nas grandes obras de filosofia, desde Aristóteles a Heidegger, de Derrida e Martha Nussbaum.
Está longe, portanto, de ser uma questão exclusiva do nosso tempo. Daí que seja chocante ouvir pessoas que são chamadas a falar sobre o assunto porque lhes é conferida, por qualquer razão, autoridade para tal, mas discorrem sobre ele com a maior das ignorâncias.
Neste último Prós e Contras destacou-se neste exercício de desinformação e de ignorância um aficionado chamado Luís Capucha, imbuído de filosofia das Lezírias que nem dá para comentar neste espaço. Mas vale a pena revisitar um dos seus argumentos, o de que regime nazi foi muito amigo dos animais e fez legislação que o comprova, para dizer que esse mito com origem na propaganda (“O nosso Führer ama os animais”) já foi longamente desmentido, em primeiro lugar por Victor Klemperer, o autor de LQI. A Linguagem do III Reich. E, no início dos anos 90, em França, Luc Ferry publicou um livro onde transmitia essa mensagem (e onde traduzia documentos da legislação nazi) que foi muito contestado e deu origem a uma enorme polémica. Ora, o que se passa entre nós é que alguém (na circunstância, um professor universitário de Sociologia) pode dar-se ao luxo de fazer afirmações na televisão como se fossem verdades irrefutáveis, desconhecendo ou fazendo que desconhece a contestação e a polémica que elas suscitaram. Este dispositivo retórico, propagandístico e inimigo do saber e da ciência porque é usado com fins exclusivamente ideológicos é o do discurso político, em relação ao qual já criámos muitas defesas, mas não pode ser a regra numa discussão na televisão pública, sobre um assunto sério, para o qual se convida, para o debate, “especialistas”, gente a quem se confere uma qualquer autoridade. O sociólogo, o aficionado, o propagandista e o inimigo do saber, tudo na mesma pessoa, só na televisão é que é possível.
(As passagens a negrito são da responsabilidade da autora do Blogue)
Fonte:
«Esta montadora tauromáquica disse no “Prós e Contras” que desde pequena ouvia conversas lindas acerca da tortura de animais. Cresceu nesse ambiente de violência e hoje o dia-a-dia dela é lindo…»
ERA COMO UM FILHO, TENDO CONSUMADO A VENDA POUCOS DIAS APÓS ESTE TER FICADO FERIDO, E, POR MERO ACASO, NÃO TER MORRIDO!
Publicação efectuada com base nas declarações de Ana Batista durante o Prós e Contras (RTP1) de 12/05/2014: “OS MEUS CAVALOS SÃO COMO OS MEUS FILHOS; SÃO A MINHA FAMÍLIA" e “O MEU CAVALO DIVERTE-SE, PORQUE O MEU CAVALO FOI CRIADO PARA TOUREAR”...
Na notícia sobre a venda do Xique a um colega (que treina cavalos para morderem em touros).
Links:
Programa Prós e Contras, início aos 71:00 - http://www.rtp.pt/play/p1099/e153836/pros-e-contras
Notícia sobre a venda do Xique - http://farpasblogue.blogspot.pt/2012/06/ventura-compra-cavalo-ornellas-de-ana.html
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Gostaríamos também de deixar aqui um acesso a umas imagens em vídeo, mas o indivíduo que foi vendido divertiu-se tanto, mas tanto, no momento retratado na foto desta publicação, que os vídeos cujos links gostaríamos de aqui deixar foram removidos do Youtube!
http://tourada-portugal.blogspot.pt/2012/05/video-da-colhida-de-ana-batista-na.html
Fonte:
E o que parece verdade é apenas ilusão.
Mas os aficionados ficaram contentes.
Precisaram de encher a arena da morte, para mostrarem que ainda estão “vivos”. À custa de quê? De um prejuízo descomunal.
Com o campo pequeno à beira da insolvência, e depois de o formidável banho de água fria que os aficionados tomaram no Prós e Contras, que os estendeu ao comprido, era preciso mostrar que ainda estão de pé.
Foi deste modo, que parece grandioso mas é apenas falácia, que Roma se despediu dos “espectáculos” bárbaros no Coliseu de má memória.
Assim será com o campo pequeno.
A chusma, sedenta de sangue, aplaude a tortura de bovinos, bem à maneira dos Homo Obtusus Primarius da Roma antiga. O que mudou desde então? Apenas o vestuário e os penteados. De resto, a mentalidade e a atitude é a mesma. Não é vergonhoso em pleno século XXI, depois de Cristo, ainda existir uma tal incultura?
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A primeira tortura de bovinos, do ano de 2014, levou ao campo pequeno a habitual minoria inculta e marialva, que de facto encheu o recinto.
Mas ninguém se iluda: a esmagadora maioria de quem lá esteve não pagou bilhete, e só assim (os torcionários sabem disso) é que arena encheu. De outro modo, seria um fiasco, como têm sido as touradas e garraiadas e vacadas realizadas este ano.
É o fim.
Não pintem os lábios a um cadáver já apodrecido. Podem ficar com restos putrefactos nas mãos.
Isabel A. Ferreira
Fonte da foto: http://farpasblogue.blogspot.pt/2014/05/momentos-de-gloria-ontem-no-campo.html
Um magnífico texto a propósito do programa da RTP «Prós e Contras» sobre touradas, publicado no Blog Anima Sentiens, um lugar onde se respira sensibilidade, bom senso e fina ironia, da autoria de Filomena Marta.
Por Filomena Marta
Uma redução, em termos culinários, é algo que se deixa ferver até que a humidade evapore e fiquem os ingredientes reduzidos e concentrados. Foi precisamente isto que se passou no programa “Prós e Contras” sobre a “Festa Brava”, que passou a 12 de Maio na RTP1. O sofrimento a que um animal é sujeito foi reduzido. Mas ao sê-lo foi também concentrado.
Um debate triste de tristes figuras. Fugiu-se do tema “sofrimento” como o diabo da cruz e até se vestiu o touro como um super-herói.
Desculpem, é mentira. Estou a faltar à verdade. Falou-se de sofrimento sim, do sofrimento comovente e tocante daquelas pobres famílias, dizem que são umas cinco mil, que quase de lágrima ao canto do olho contam a grande beleza, a estética e a ética que a tourada tem. A ética ninguém nunca lhes explicou o que significa e é usada abusivamente, agora a estética é uma coisa discutível: aqueles riquíssimos e caríssimos fatos são francamente bonitos… o sangue a escorrer nas costas do boi é que já me deixa dúvidas.
A teoria dos toureiros, dos aficionados e de uma coisa vagamente parecida com um veterinário é a de que o touro não sente dor. Ficamos a saber que o touro não faz parte dos mamíferos, classe a que o ser humano também pertence, não tem uma anatomia e morfologia comum a todos os mamíferos e é uma espécie de ser supra-terrestre que tem a capacidade de ter um ferro enterrado no lombo sem sentir dor. Pressupomos também que é um mestre em efeitos especiais e que aquela coisa vermelha que lhe escorre pelo lombo não é sangue, mas uma qualquer espécie de molho de tomate apenas para dar emoção aos aficionados.
Na sequência de afirmações supremamente científicas como estas temos, obrigatoriamente, de ir mais longe. Existe uma outra classe de seres no planeta à margem dos vulgares mamíferos. São seres especiais e também eles não sentem dor. É perfeitamente aceitável que no recinto de brincadeira, festa e confraternização onde se encontram para jantaradas touros e toureiros haja umas picardias mais atrevidas e ora agora te enfio eu um ferro, ora agora te enterro eu um corno. Tudo bons amigos e que ninguém se preocupe nem com uns, nem com outros, porque são ambos seres especiais. Nem o touro sente dor, nem o toureiro sofre com a cornada. É tudo a fingir.
Pois a verdade é que até ontem não se tinha a certeza que há quatro divisões diferentes no reino animal: os Homens, os Animais, os Touros e os Toureiros. Ah, mil perdões, esqueci-me de uma quinta divisão! Aquela divisão referida por uma toureira ao dizer “os meus cavalos divertem-se”.
Óbvio! Mas existem dúvidas que seja divertido ter uma criatura montada no lombo, a bater com esporas na barriga e a fazer avançar contra o perigo?! Nenhumas! É de rir até às lágrimas de tanto prazer e alegria.
Portanto está estabelecido: os touros não sentem dor, os cavalos divertem-se, os toureiros são um ramo paralelo dos humanos com capacidades especiais e os outros todos, gente e bichos, são umas aberrações que por aqui andam neste mundo a sentir dor, medo e a ter sentimentos.
Mas uma coisa é certa, ainda bem que os tauromáquicos não precisam de ajuda para denegrir a sua imagem, porque se os touros dependessem dos “amigos dos animais” estavam francamente “feitos ao bife”. Houve três intervenções com substrato, a de Rita Silva, a de uma veterinária e a de uma jurista. Mas isso nem sequer se tornou importante, porque um rufia sentado no painel encarregou-se de enterrar a Festa Brava com bravura e dar um belo exemplo do que é realmente um aficionado… mas eu, se fosse aficionada, não tinha gostado nada daquela representação. A menos que gostem de ser conotados com expressões pouco simpáticas.
Houve duas alturas muito interessantes no debate:
1. Um toureiro acesamente defendia a sua liberdade. Porque a liberdade dos abolicionistas terminava onde começava a dele… pois é, tal como a dele termina onde começa a dos abolicionistas. Mas ó criaturas!!!! E onde fica a liberdade do touro?!
2. Aquela coisa vagamente parecida com um veterinário, um senhor de ar “grave” e idade suficiente para pensar antes de falar, entre muitas outras pérolas de sabedoria arrancou um “os animais não têm direitos, porque não têm deveres”. Ora bem, como é que se escreve uma gargalhada…? É que já cansa ter de explicar que uma criança de dois anos também não tem deveres e tem direitos… mas como isto tem matéria para uma crónica inteira, passando pelos trabalhos forçados de todos os animais ao “serviço” do Homem, terá de ficar para outra altura.
Mas ver homens feitos a dizer disparates como “o touro não sente dor” e a queixarem-se de ser coitadinhos porque não os deixam fazer a sua “Festa” e os chamam de “assassinos” seria bastante triste, se não fosse primeiramente ridículo.
Depois há a tradição. Ah… a tradição! Um toureiro, aquele que defendia a sua liberdade, mostrou-se chocado com a comparação feita com a escravatura e a menção ao filme “12 anos escravo”. Um choque incompreensível, de facto, pois tratava-se de tradição. O negro não era considerado sequer um ser humano, não sentia dor como os seres humanos e não tinha alma. E era uma tradição. Tal como era tradição o circo romano, os gladiadores (geralmente escravos) e os cristãos na arena com os leões. Como é ainda hoje tradição a mutilação genital feminina, a lapidação e o casamento infantil.
As outras “tradições” inevitavelmente terminaram e duvido que houvesse alguém naquele programa, tauromáquicos incluídos, que defendesse a tradição da lapidação e da mutilação e do casamento infantil.
O ser humano tem evoluído. Nem sempre no bom sentido, também a maldade tem ganhado requinte, mas sem evolução ainda viveríamos em cavernas. Se calhar… ainda há quem viva, num plano mental e civilizacional. Mas estes são perigosos, pois andam por aí disfarçados de “gente moderna” e muitos até têm “cursos superiores”. O que nunca ninguém lhes disse é que na Faculdade não se ensina nem se aprende carácter, sensibilidade, humanidade ou sensatez.
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Fadgen era um touro de lide até Christophe Thomas, um activista anti-touradas, o salvar. Fadgen era um touro de lide, até se tornar um animal de estimação. Todos os seres vivos têm direito a uma vida sem tortura e sem sofrimento, o touro não é uma excepção.