O Grupo Parlamentar do PAN - Pessoas - Animais - Natureza questionou o Ministério da Educação sobre uma publicação que a empresa que fornece 85.000 refeições por dia ao sector do Ensino, apresentando várias questões contrárias aos princípios do bem-estar animal e da alimentação saudável ou vegetariana/vegana, distribuiu pelas escolas.
O que pretende o Ministério da Educação fazer com as nossas crianças? Já não basta obrigá-las a escrever "incurrÊtamente" a Língua Materna delas, querem agora também impingir-lhes uma alimentação desadequada e a deseducação para o bem-estar animal?
Isabel A. Ferreira
Origem da imagem: Internet
A Companhia Gertal de Restaurantes e Alimentação, S.A., tem uma cobertura nacional de grande expressão, servindo cerca de 85.000 refeições/dia ao sector do Ensino, desde jardins de infância, escolas, colégios, a universidades e institutos politécnicos.
Inscrevem-se nos princípios da empresa, o "Princípio da Prevenção da Poluição na Origem”, em que é referido o seguinte: “aplicamos continuamente uma estratégia preventiva integrada, garantindo o envolvimento de todas as partes interessadas por forma a aumentar a eco-eficiência, a reduzir os riscos ambientais, os riscos para a saúde humana, optimizando os recursos ao nível dos processos e produtos”.
Constam ainda entre os princípios da empresa o “Princípio da Responsabilidade”, segundo o qual, assumem a responsabilidade das suas decisões, acções e actividades no Ambiente, Economia e Sociedade. Por outro lado, a Gertal assume como objectivos para 2020/2021 os “estímulos a uma alimentação mais saudável e sustentável” e a “redução do sal, açúcar e gordura”.
Para tal a empresa Gertal lançou a Sebenta “Alimenta-te Sem Porquês”, cuja primeira edição teve como mote o regresso às aulas e a preocupação com a alimentação e segurança dos consumidores mais novos, num contexto dominado pela COVID-19, tendo sido distribuídos mais de 70.000 exemplares, a nível nacional, nas escolas, uma iniciativa importante que o PAN saúda.
Porem, neste momento, está a ser distribuída uma outra edição, de 17 páginas, sob a temática “Um dia na quinta”, dirigido a crianças do pré-escolar e primeiro ciclo. Este livro tem como objectivo ajudar as crianças a conhecer melhor os alimentos que comem, a forma como são cultivados e produzidos, quais os seus benefícios, procurando incentivar as crianças a fazerem escolhas saudáveis na sua vida futura. No entanto, esta edição, coloca os animais numa perspectiva utilitarista, como existindo para consumo e interesse humanos, o que assenta totalmente numa perspectiva antropocêntrica. Neste livro, refere-se que os animais de quinta “produzem carne”, o que, do ponto de vista linguístico e semântico, é um erro não acautelado pela revisão da edição, uma vez que os animais não produzem carne, sendo que o seu corpo é que é transformado em carne alimentar.
Por outro lado, dão-se exemplos de que a vaca chega a beber 50 litros por dia e pode produzir 100 copos de leite por dia. Além do erro de linguagem, que deve ser corrigido, esta informação assenta apenas na promoção do consumo, pecando por falta de informação quanto aos impactos da produção de leite e carne no ambiente e na saúde humana. Viola mesmo, o Princípio da “Prevenção da Poluição na Origem” desta empresa, uma vez que a produção agro-pecuária é uma das mais intensas actividades de poluição ambiental.
Mais preocupante é a co-relação que faz entre a existência de porcos na quinta e os “famosos chouriços, presunto ou fiambre, de que tanto gostamos”. Esta assunção de conteúdo é particularmente gravosa, até porque há crianças e famílias que não se alimentam com animais, e, portanto, não se revêem, nem querem rever-se, nesta expressão do livro, que demonstra ser claramente discriminatória para com todas as crianças e familiares cuja alimentação seja vegetariana ou vegana, e cujos princípios de bem-estar animal não são compatíveis com o consumo de animais no prato.
Esta postura projecta opções e opiniões pessoais de quem escreveu ou orientou esta edição, não sendo aceitável a sua transmissão inconsequente junto das escolas e crianças.
Por outro lado, sendo a Gertal, uma empresa que se diz pautar por princípios de sustentabilidade e preocupada com o impacto da alimentação no ambiente, é incoerente que fale da agro-pecuária e não informe que esta é uma das áreas de actividade mais poluentes e responsável pelos gastos de água e devastação de ecossistemas, bem como não aborde outras opções mais saudáveis para a saúde e para o ambiente.
A alimentação é, de facto, um vector estratégico da saúde humana, sendo amplamente reconhecido o seu papel na prevenção de doença ou, em caso contrário, no surgimento de patologias resultantes de hábitos alimentares não-saudáveis, como a obesidade, a diabetes, as doenças cardiovasculares e a hipertensão arterial, com consequências gravosas para a vida das pessoas, para o erário público e para a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde.
A educação para uma alimentação saudável tem de ser transversal a todos os contextos, coerente entre aquelas que são as orientações e evidências científicas existentes e com as práticas quotidianas instituídas em todos os sectores sociais. É, particularmente importante, a educação para uma alimentação saudável junto das populações mais jovens, em fases de desenvolvimento físico e mental muito exigentes, sobretudo quanto às questões da qualidade e quantidade nutricionais, tendo a escola um papel essencial, seja através da literacia em saúde, seja através de práticas concretas instituídas nas comunidades escolares.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea e) do artigo 156.o da Constituição da República Portuguesa e da alínea e) do n.o 1 do artigo 4.o do Regimento da Assembleia da República, o PAN, por intermédio do presidente da Assembleia da República e nos termos e fundamentos que antecedem, solicita as seguintes informações ao Ministério da Educação:
Quando as vai tomar?
É esta a lógica educativa de promoção de saúde e de mitigação dos impactos humanos no ambiente que o Ministério da Educação considera dever ser utilizado junto das crianças? É com este tipo de conteúdos e mensagens educativas, que o Ministério considera que deve ser elaborado o esperado Referencial para o Bem-Estar Animal?