Domingo, 25 de Abril de 2021

Que “25 de Abril” celebramos hoje: o da ilusão ou o da desconstrução?

 

Passados são já 47 anos, sobre aquela madrugada, na qual, todos os Portugueses pensantes e livres, dotados de Sentido de Cidadania e de Espírito Crítico, depositaram todas as esperanças de ver um Portugal finalmente livre da ignominiosa política despótica que o sufocava.

 

Por tudo o que aqui abordarei, repetindo o que ainda não foi alcançado e o que se destruiu, depois daquele primeiro 25 de Abril, o que teremos para celebrar hoje?

 

Seria da racionalidade que o actual governo, deputados da Nação, presidente da Assembleia da República, presidente da República, autarcas e partidos políticos, fizessem um acto de contrição e pedissem desculpa aos Portugueses, por pouco terem feito pelos ideais de Abril, ainda por cumprir.

 

Portugal é um país em franca decadência moral, social e cultural, e , em quase tudo, está na cauda da Europa, quiçá do Mundo. E disto não nos livra nem o clima, nem as belas paisagens, os monumentos, a gastronomia e a relativa segurança na vida quotidiana. Porque tudo isto é apenas para estrangeiro ver e viver.

 

25 de ABRIL -  Toné.jpg

 

Esta imagem representa a esperança que os jovens, a caminho do Futuro, depositaram na Revolução dos Cravos, sonhando com uma sociedade onde pudessem estudar, tirar um curso, exercer a profissão, na qual tanto investiram, viver e educar os filhos em liberdade…  Quantos deles se arrastam por aí, desempregados, ou com empregos precários?  Quantos deles foram obrigados a emigrar? E não foi para isto que se fez o 25 de Abril.

 

Que 25 de Abril celebramos hoje?

 

Bem, no que me diz respeito, celebro o facto de poder escrever nas linhas, o que até ao dia 25 de Abril de 1974 escrevia nas entrelinhas, através de senhas, para despistar a PIDE. Se bem que, já em “democracia”, no pós-25 de Abril, por ousar dizer verdades inconvenientes, ter sido “importunada” com vários processos judiciais, que acabaram sempre por ser arquivados, porque, obviamente, não era eu a criminosa.

 

Celebro também poder participar em eleições não manipuladas (por enquanto) pelo Poder, para escolher a governação do meu País. Só que foram pouquíssimas as vezes em que os candidatos, que eu tinha como honestos e incorruptíveis, para poderem exercer o Poder, e em quem votei, chegaram ao Poder. Mas não será esta uma particularidade da Democracia?  Não será o Poder o espelho do Povo?

 

Celebro poder viajar para o estrangeiro, sem ter de pedir permissão ao marido.

 

Contudo, NÃO celebro a LIBERDADE de que tanto se fala, quando se fala de Abril, porque LIBERDADE sempre a tive, mesmo com a PIDE a rondar os meus calcanhares; mesmo com a censura a tentar travar-me o PENSAMENTO, porque, para mim, LIBERDADE não é poder fazer ou dizer tudo o que me apetece. Para mim, LIBERDADE é poder PENSAR, ter SENTIDO DE CIDADANIA e ESPÍRITO CRÍTICO, algo que nenhum algoz, por mais autoritário que seja, jamais poderá arrancar de mim, porque, como diz Manuel Freire, na canção que escreveu e compôs, intitulada LIVRE, a qual já cantei com ele (meu primo, em quarta geração), num tempo em que era proibido cantá-la: 



Não há machado que corte
a raiz ao pensamento
(…)
 porque é LIVRE como o vento (…)»

 

E este é o verdadeiro espírito da LIBERDADE, que deveria ser celebrada no 25 de Abril, e não é celebrada, porque o conceito de Liberdade foi amputado, e a tão ansiada DEMOCRACIA PLENA (aquela em que os governantes servem o Povo e o País, e não os lobbies e os seus interesses particulares; aquela em que o Povo é quem mais ordena) está ainda por cumprir,  porque esmagada por governos autoritários, por um Parlamento ao serviço de interesses lobistas, e por presidências da República sem o mínimo sentido de Estado (exceptuando o General Ramalho Eanes).

 

Se o 25 de Abril trouxe à sociedade portuguesa alguns benefícios, os malefícios estão a superar esses benefícios, e Portugal retrocede a olhos vistos nas poucas conquistas que o 25 de Abril lhe trouxe. Em 47 anos desconstruiu-se o País que a Revolução dos Cravos, com boas intenções, tentou construir.

 

Como podemos celebrar Abril, se estamos atolados em corrupção, vigarice, hipocrisia, subserviência, servilismo, ganância, negociatas, enriquecimento ilícito, ignorância optativa, irresponsabilidade, negligência, incompetência, condutas terceiro-mundistas, fraudes, paus-mandados e imposições prepotentes?

 

Portugal serve de motejo a países que, apenas por mero interesse, lhe finge amizade, algo que uma cegueira mental acentuada não permite vislumbrar.

 

Já não somos Portugal. Perdemos a nossa IDENTIDADE e a nossa DIGNIDADE de País livre e independente, ao descartarmos a Língua Portuguesa, substituindo-a por uma mixórdia, cada vez mais bizarra e funesta, que nos envergonha a todos.

 

 Eis o que, passados 47 anos, Portugal continua a ser: 

 

 - Um país, onde ainda se continua a viver em pobreza extrema, com crianças e idosos a passarem fome, com bairros de lata às portas de Lisboa, e centenas de sem-abrigo, sem esperança alguma.

- Um país, que continua a ter a maior taxa de analfabetismo da Europa.

- Um país dos que menos gasta na Saúde, com um Serviço Nacional de Saúde caótico, onde falta quase tudo, e o aumento da Tuberculose (agora disfarçada, pela pandemia, que tomou conta das notícias) diz do subdesenvolvimento, do retrocesso e da miséria que ainda persistem por aí.

- Um país que empurra para o estrangeiro os seus jovens mais habilitados: enfermeiros, médicos, engenheiros, investigadores, artistas.

- Um país com o terceiro pior crescimento económico da Europa.

- Um país que mantém o trabalho precário, e salários miseráveis, enquanto que para a “cultura” da morte (touradas e caça), os subsídios são obesos.

-  Um país com a 3ª maior dívida pública da União Europeia.

- Um país cheio de gritantes desigualdades sociais, onde os ricos são cada vez mais ricos, e os pobres, cada vez mais pobres.

- Um país onde ainda há populações que vivem sem água encabada, sem electricidade, sem esgotos, sem telefone.

- Um país cheio de banqueiros e outros que tais ladrões, que sugam o dinheiro do Povo.

- Um país com um governo que se diz de esquerda a fazer políticas de direita.

- Um país com uma Comunicação Social submissa e servilista.

- Um país onde a Justiça anda de rastos, com processos que demoram tempos infinitos, com o intuito de prescreverem; uma justiça extremamente cara, desigual, lenta, injusta, e, em muitos casos, nomeadamente no que respeita ao MP, anda ao sabor de interesses políticos.

- Um país onde a Constituição da República é violada por quem a deveria defender.

- Um país com uma política e políticos desacreditados.

- Um país que promove a violência contra animais não-humanos, o que por sua vez gera a violência contra os seres humanos; um país que os mantêm acorrentados, enjaulados, torturados em público, para gáudio de sádicos e psicopatas.

- Um país com um elevado índice de violência doméstica.

- Um país com um elevadíssimo número de crianças e jovens em risco.

- Um país que atira crianças para arenas de tortura de animais, e permite que sejam iniciadas em práticas violentas e cruéis, roubando-lhes um desenvolvimento normal e saudável, o que constitui um crime de lesa-infância. Impunível.

- Um país cheio de grupos e grupelhos de trabalho; de secretários; de secretários de secretários; de assessores; de secretários de assessores; de comissões; de subcomissões, que não servem absolutamente para nada, a não ser para ganharem salários descondizentes com os serviços que (não) prestam; de deputados a declararem moradas falsas para receberem subsídios ilícitos; de deputados a declararem habilitações falsas;  e  ex-presidentes da República com gabinetes e mordomias, à excepção do General Ramalho Eanes.

- Um país que descura a sua Flora e a sua Fauna, mantendo uma e outra ao abandono e à mercê de criminosos impuníveis.

- Um país que mantém as Forças de Segurança instaladas em edifícios a caírem de podres, e com falta de quase tudo.

- Um país onde ainda existem Escolas com instalações terceiro-mundistas, sem as mínimas condições para serem consideradas um lugar de aprendizagem; e com tribunais, como o de Monsanto, que parece um galinheiro abandonado.

- Um país onde as prisões são lugares de diversão, com direito a vídeos publicáveis no Facebook; e onde droga é traficada, descaradamente.

- Um país cheio de leis e leizinhas inúteis e retrógradas, que não servem para nada, a não ser para servir lobbies dos mais hediondos, e proteger criminosos impuníveis.

- Um país que não promove a Cultura Culta, e apoia a tortura de Touros e Cavalos, a que muitos querem, porque querem, que seja arte e cultura

- Um país que apoia chorudamente a caça, assente em premissas falsas e exterminadoras.

- Um país, cujo Sistema de Ensino é dos mais caóticos, desde a implantação da República, onde falta quase tudo, e com a agravante de se estar a enganar as crianças com a obrigatoriedade da aprendizagem de uma ortografia que não é a portuguesa, a da Língua Materna delas, estando-se a incorrer num crime de lesa-infância. Impunível.

- Um país, que tinha uma Língua Culta e Europeia, e hoje tem um arremedo de língua, uma inconcebível mixórdia ortográfica portuguesa, imposta ditatorialmente por políticos pouco ou nada esclarecidos e servilistas, que estão a fabricar, conscientemente, os futuros analfabetos funcionais, e a promover a iliteracia. E já sou poucos os que escrevem correctamente a sua Língua Materna.

- Um país onde os governantes não sabem escrever correCtamente, a Língua oficial do País que dizem servir: a Portuguesa. E como referiu Maria Alzira Seixo: «Ao menos, Salazar sabia escrever».

- Um país onde, parvamente, se começou a dizer “olá a todos e a todas, amigos e amigas, portugueses e portuguesas”, como se esta linguagem, dita inclusiva, viesse resolver as disparidades sociais. Uma desmedida parolice.

- Um país, com um presidente beijoqueiro e viciado em selfies (agora suspensas devido à pandemia) e um primeiro-ministro que não tem capacidade para ver o visível, muito menos o invisível, que qualquer cego, de nascença, vê à primeira vista.

- Um país, que em 2018/2019 foi marcado por uma constante contestação social, com o número mais elevado de sempre de greves em todos os sectores da sociedade portuguesa, número que continuaria a aumentar em 2020/2021 não fosse a invasão covideira.

- Enfim, um País que perdeu o rumo, e faz de conta que é um país.  

 

Os 47 anos da Revolução dos Cravos não foram ainda suficientes para acabar com todas estas nódoas negras que mancham a  Democracia que deveria ter nascido do 25 de Abril?

 

Enquanto tudo isto (e muito mais, que agora não me ocorre) não sair da lista do que não se quer para um País de Primeiro Mundo, evoluído e civilizado, o que há para comemorar em mais este 25 de Abril?

 

Como disse Manuel Damas, num texto escrito há dois anos, no Facebook, por esta altura:

 

Não foi para isto que se fez Abril. Falta cumprir Abril, porque falta:

 

- recuperar a Honestidade;

-recuperar a Seriedade;

- recuperar a Dignidade;

- recuperar o Pudor.

- recuperar o Sentido de Estado.

- recuperar o Sentido de Missão no exercício da Política para o Povo e pelo Povo.

 

E acrescento eu:

- Falta também recuperar a vergonha na cara.

 

Isabel A. Ferreira

***

Uma entrevista ao autor da imagem, que ilustra este texto, a quem faltam apoios para sobreviver da sua ARTE:

 

Entrevista Toné.png

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 11:11

link do post | Comentar | Ver comentários (8) | Adicionar aos favoritos
Domingo, 19 de Abril de 2020

A grande farsa das comemorações do “25 de Abril”

 

O texto que se segue foi escrito em 26 de Abril de 2016.

Poderia escrevê-lo hoje, sem lhe mudar uma vírgula.

 

Mas vou reproduzi-lo apenas para lhe acrescentar algo que é necessário dizer hoje, sobre a liberdade que os políticos querem comemorar no próximo dia 25 de Abril, em pleno Estado de Emergência, para que se saiba que a liberdade não foi reprimida, enquanto retiram ao povo (e muito bem) a liberdade de celebrarem as suas crenças ou, pior ainda, de acompanhar até à última morada os seus ente-queridos, ainda que pudessem cumprir (como, ao que parece, os políticos cumprirão) o devido distanciamento e a recomendada protecção.

Porque liberdade não é fazer tudo o que se quer, nem da parte do Povo, nem principalmente da parte dos governantes, quando estes querem impor ao Povo o que o Povo não quer.

 

E há tanta coisa que o Povo não quer, e que os governantes fazem questão de lhe impingir, como as celebrações de um 25 de Abril à porta fechada, apenas para aqueles que desconhecem o verdadeiro sentido de Liberdade.

 

Melhor seria sugerir àquele Povo que costuma celebrar o 25 de Abril que, nesse dia, a uma determinada hora, venha às janelas e às varandas e cante em uníssono a “Grândola Vila Morena”  - o hino da Liberdade. Seria muito mais democrático.

 

Porque Liberdade não é o Povo poder fazer tudo o que quer, e muito menos os governantes, pós-25 de Abril, poderem agir como se fossem ditadores disfarçados de democratas.

 

Cartaz 25 de Abril.png

Ontem [26 de Abril de 2016] pretendeu-se comemorar o “Dia da Liberdade”. Os repórteres televisivos insistiram nesta tónica, como se o “25 de Abril” tivesse sido planeado para dar ao povo português a liberdade de fazer o que quer.

 

Ontem, ouvi um repórter perguntar a um menino: «O que é para ti a liberdade?» Como a criança hesitou, o repórter apressou-se a “ajudá-lo” a pensar e disse: «É fazer tudo o que tu queres…?». E a criança anuiu.

Pois nada mais pernicioso para se dizer a alguém que ainda é um menino.

 

Porque Liberdade não é o Povo poder fazer tudo o que quer, e muito menos os governantes, pós-25 de Abril, poderem agir como se fossem ditadores disfarçados de democratas.

 

Liberdade é ter consciência de que não se pode fazer tudo o que se quer, quando vivemos numa sociedade em que o todo faz parte de tudo, e que esse tudo é a Vida, no seu significado mais universal.

 

E isto não foi ainda alcançado pelo 25 de Abril de 1974.

 

O “25 de Abril” foi planeado para derrubar um regime ditatorial, imposto por António Oliveira Salazar, o qual se arrastou por quase 50 anos e, durante o qual, milhares de pessoas foram perseguidas, encarceradas e assassinadas.

 

No regime ditatorial, quem mais ordenava era o ditador que, ao menor gesto de desobediência civil ou ousadia de se falar contra o sistema, enviava os cidadãos, à força da violência, para o Tarrafal, um campo de concentração engendrado para “ acolher” os que tinham a consciência de que não se pode fazer tudo o que se quer, ou seja, os cidadãos verdadeiramente livres, aqueles que, mesmo agrilhoados, eram livres, porque a verdadeira liberdade é a da consciência.

 

Regressada do Brasil em 1968, para continuar o meu curso na Universidade de Coimbra, encontrava-me nessa cidade no 17 de Abril de 1969, quando o então Presidente da República, Américo Thomaz, ali se deslocou para a inauguração do novo edifício das Matemáticas.

 

Para honrar a palavra dada aos estudantes, Alberto Martins, o então presidente da Associação Académica de Coimbra, hoje deputado da Nação, pelo PS, pediu a palavra para falar em nome da Academia.

 

Para Américo Thomaz, esta “ousadia” constituiu um insulto, e Alberto Martins foi detido nessa mesma noite, o que desencadeou uma crise académica de grandes proporções.

 

Todos nós, que participámos no que então se seguiu, éramos jovens e livres, e amávamos a nossa liberdade de ser, de estar e, sobretudo, de pensar, e os grilhões da ditadura não conseguiram nunca cortar a raiz ao nosso pensamento, porque como cantou Manuel Freire (que curiosamente nasceu no dia 25 de Abril de 1942, e é meu primo, ainda que em terceiro grau), no seu canto de intervenção “Livre”: «Não há machado que corte a raiz ao pensamento… porque é livre como o vento… porque é livre…»

 

E é esta a verdadeira liberdade.

 

Durante os poucos anos em que vivi a ditadura de Salazar eu era tão livre como sou hoje.

 

O “25 de Abril” não me restituiu a liberdade (que eu sempre tive).

 

O “25 de Abril” livrou-me da censura da ditadura, podendo agora escrever nas linhas o que então escrevia nas entrelinhas.

 

Das cartas que escrevia ao meu Pai, que se encontrava no Brasil, e a quem eu devia justificar o facto de me recusar a fazer exames, enquanto ele, lá,  se “sacrificava”, para me manter a estudar em Coimbra, apenas uma carta foi interceptada pela PIDE, porque nunca imaginei que pudessem violar correspondência privada. Cheguei a ser “visada” pela PIDE, que “desculpou” a minha liberdade de dizer ao meu Pai o que estava a passar-se em Cpombra, por eu ter vindo de um país estrangeiro e nada saber das “regras” do meu País.

 

Só ouve uma coisa a fazer: Passei a escrever nas entrelinhas tudo o que se passava em Coimbra, não só para o meu Pai, como para os outros jovens que lutavam contra o Regime, e que esperavam por notícias fora de Coimbra.

 

E as minhas cartas seguiram, com toda a informação do que estava a passar-se numa Coimbra “fechada” para o mundo.

 

Durante todo esse período eu mantive a minha liberdade intacta.

 

Até quando, no ano lectivo de 1973/74, ainda como Bacharel, dei aulas na Escola Secundária Frei João de Vila do Conde, e me recusei a dar uma lição de História, que falava dos grandes feitos de Salazar.

 

Disse aos alunos que aquilo era mentira e não era para se estudar. Dei-lhes a versão dos factos históricos reais, até porque os vivênciei em Coimbra, no ano tórrido de 1969,  e risquei com um X as páginas dessa matéria, uns quinze dias antes de acontecer o “25 de Abril”.

 

Um dos meus alunos era filho de um agente da PIDE. Mas ainda assim atrevi-me a não distorcer a História. Eu era uma Professora livre, não um pau-mandado da ditadura.

 

Por isso, quando ontem ouvi, a torto e a direito, nas televisões, dizerem que se comemorava o “dia da liberdade”, pensei cá comigo: isto não é nada pedagógico.

 

Não se deve passar às crianças e a um Povo ainda pouco esclarecido esta falsa ideia de liberdade. As “definições” que ontem ouvi de “liberdade” deixaram-me na dúvida se viverei num Portugal do ano 2016, ou dos anos 30, 40, 50, 60… Foi um desastre!

 

O Povo continua confuso. Os jornalistas continuam a servir o regime. O regime continua a enganar o Povo, com uma democracia que ainda não se libertou do atraso de vida do passado, mantendo uma cultura inculta, com a agravante de estarem a vender Portugal ao desbarato.

 

Quem é verdadeiramente livre nunca deixa de o ser, ainda que agrilhoado.

 

Por isso, o que ontem se comemorou em Portugal, foi a farsa de um “25 de Abril” ainda por cumprir.

 

É urgente um verdadeiro “25 de Abril” para que a ditadura desta falsa democracia, que tem um pé preso a um passado que remonta aos tempos da monarquia, seja derrubada, e Portugal possa seguir o caminho da evolução e da verdadeira liberdade, porque liberdade não é fazer tudo o que se quer, nem da parte do Povo, nem principalmente da parte dos governantes, quando estes querem impor ao Povo o que o Povo não quer.

 

Liberdade é ter consciência de que não se pode fazer tudo o que se quer, quando vivemos numa sociedade em que o todo faz parte de tudo, e que esse tudo é a Vida, no seu significado mais universal.

 

E isto não foi ainda alcançado pelo "25 de Abril" de 1974.

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 14:48

link do post | Comentar | Ver comentários (2) | Adicionar aos favoritos
Terça-feira, 26 de Abril de 2016

A grande farsa das comemorações do “25 de Abril”

 

Ontem pretendeu-se comemorar o “Dia da Liberdade”. Os repórteres televisivos insistiram nesta tónica, como se o “25 de Abril” tivesse sido planeado para dar ao povo português a liberdade de fazer o que quer.

 

Ontem, ouvi um repórter perguntar a um menino: «O que é para ti a liberdade?» Como a criança hesitou, o repórter apressou-se a “ajudá-lo” a pensar e disse: «É fazer tudo o que tu queres…?». E a criança anuiu.

Pois nada mais pernicioso para se dizer a alguém que ainda é um menino.

 

Cartaz 25 de Abril.png

Porque ter liberdade não é o povo poder fazer tudo o que quer, nem os governantes pós-25 de Abril poderem agir como se fossem ditadores disfarçados de democratas.

 

Liberdade é ter consciência de que não se pode fazer tudo o que se quer, quando vivemos numa sociedade em que o todo faz parte de tudo, e que esse tudo é a Vida, no seu significado mais universal.

 

E isto não foi ainda alcançado pelo 25 de Abril de 1974.

 

O “25 de Abril” foi planeado para derrubar um regime ditatorial, imposto por António Oliveira Salazar, o qual se arrastou por quase 50 anos e, durante o qual, milhares de pessoas foram perseguidas, encarceradas e assassinadas.

 

No regime ditatorial, quem mais ordenava era o ditador que, ao menor gesto de desobediência civil ou ousadia de se falar contra o sistema, enviava os cidadãos, à força da violência, para o Tarrafal, um campo de concentração engendrado para “ acolher” os que tinham a consciência de que não se pode fazer tudo o que se quer, ou seja, os cidadãos verdadeiramente livres, aqueles que, mesmo agrilhoados, eram livres, porque a verdadeira liberdade é a da consciência.

 

Regressada do Brasil em 1968, para continuar o meu curso na Universidade de Coimbra, encontrava-me nessa cidade no 17 de Abril de 1969, quando o então Presidente da República, Américo Thomaz, ali se deslocou para a inauguração do novo edifício das Matemáticas.

 

Para honrar a palavra dada aos estudantes, Alberto Martins, o então presidente da Associação Académica de Coimbra, hoje deputado da Nação, pelo PS, pediu a palavra para falar em nome da Academia.

 

Para Américo Thomaz, esta “ousadia” constituiu um insulto, e Alberto Martins foi detido nessa mesma noite, o que desencadeou uma crise académica de grandes proporções.

 

Todos nós, que participámos no que então se seguiu, éramos jovens e livres, e amávamos a nossa liberdade de ser, de estar e, sobretudo, de pensar, e os grilhões da ditadura não conseguiram nunca cortar a raiz ao nosso pensamento, porque como cantou Manuel Freire (que curiosamente nasceu no dia 25 de Abril de 1942, e é meu primo, ainda que em terceiro grau), no seu canto de intervenção “Livre”: «Não há machado que corte a raiz ao pensamento… porque é livre como o vento… porque é livre…»

 

E é esta a verdadeira liberdade.

 

Durante os poucos anos em que vivi a ditadura de Salazar eu era tão livre como sou hoje.

 

O “25 de Abril” não me restituiu a liberdade (que eu sempre tive).

 

O “25 de Abril” livrou-me da censura da ditadura, podendo agora escrever nas linhas o que então escrevia nas entrelinhas.

 

Das cartas que escrevia ao meu Pai, que se encontrava no Brasil, e a quem eu devia justificar o facto de me recusar a fazer exames, enquanto ele, lá,  se “sacrificava”, para me manter a estudar em Coimbra, apenas a primeira carta foi interceptada pela PIDE, porque nunca imaginei que pudessem violar correspondência privada. Cheguei a ser “visada” pela PIDE, que “desculpou” a minha liberdade de dizer ao meu Pai o que estava a passar-se em Coimbra, por eu ter vindo de um país estrangeiro e nada saber das “regras” do meu País.

 

Só ouve uma coisa a fazer: Passei a escrever nas entrelinhas tudo o que se passava em Coimbra, não só para o meu Pai, como para os outros jovens que lutavam contra o Regime, e que esperavam por notícias fora de Coimbra.

 

E as minhas cartas seguiram, com toda a informação do que estava a passar-se numa Coimbra “fechada” para o mundo.

 

Durante todo esse período eu mantive a minha liberdade intacta.

 

Até quando, no ano lectivo de 1973/74, ainda como Bacharel, fui dar aulas na Escola Secundária Frei João de Vila do Conde, e recusei-me a dar uma lição de História, que falava dos grandes feitos de Salazar.

 

Disse aos alunos que aquilo era mentira e não era para se estudar. Dei-lhes a versão dos factos históricos reais, até porque os vivi,  e risquei com um X as páginas dessa matéria, uns quinze dias antes de acontecer o “25 de Abril”.

 

Um dos meus alunos era filho de um agente da PIDE. Mas ainda assim atrevi-me a não distorcer a História. Eu era uma Professora LIVRE, não um pau-mandado da ditadura.

 

Por isso, quando ontem ouvi, a torto e a direito, nas televisões, dizerem que se comemorava o “dia da liberdade”, pensei cá comigo: isto não é nada pedagógico.

 

Não se deve passar às crianças e a um Povo, ainda pouco esclarecido, esta falsa ideia de liberdade. As “definições” que ontem ouvi de “liberdade” deixaram-me na dúvida se viverei num Portugal do ano 2016, ou dos anos 30, 40, 50, 60… Foi um desastre!

 

O Povo continua confuso. Os jornalistas continuam a servir o regime. O regime continua a enganar o Povo, com uma democracia que ainda não se libertou do atraso de vida do passado, mantendo uma cultura inculta, com a agravante de estarem a vender Portugal ao desbarato.

 

Quem é verdadeiramente livre nunca deixa de o ser, ainda que agrilhoado.

 

Por isso, o que ontem se comemorou em Portugal, foi a farsa de um “25 de Abril” ainda por cumprir.

 

É urgente um verdadeiro “25 de Abril” para que a ditadura desta falsa democracia, que tem um pé preso a um passado que remonta aos tempos da monarquia, seja derrubada, e Portugal possa seguir o caminho da evolução e da verdadeira liberdade, porque liberdade não é fazer tudo o que se quer.

 

Liberdade, repito,  é ter consciência de que não se pode fazer tudo o que se quer, quando vivemos numa sociedade em que o todo faz parte de tudo, e que esse tudo é a Vida, no seu significado mais universal.

 

E isto não foi ainda alcançado pelo "25 de Abril" de 1974.

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 12:01

link do post | Comentar | Adicionar aos favoritos (1)

Mais sobre mim

Pesquisar neste blog

 

Outubro 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

Posts recentes

Que “25 de Abril” celebra...

A grande farsa das comemo...

A grande farsa das comemo...

Arquivos

Outubro 2024

Setembro 2024

Agosto 2024

Junho 2024

Maio 2024

Abril 2024

Março 2024

Fevereiro 2024

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Agosto 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Dezembro 2021

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Agosto 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Agosto 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Direitos

© Todos os direitos reservados Os textos publicados neste blogue têm © A autora agradece a todos os que os divulgarem que indiquem, por favor, a fonte e os links dos mesmos. Obrigada.
RSS

AO90

Em defesa da Língua Portuguesa, a autora deste Blogue não adopta o Acordo Ortográfico de 1990, nem publica textos acordizados, devido a este ser ilegal e inconstitucional, linguisticamente inconsistente, estruturalmente incongruente, para além de, comprovadamente, ser causa de uma crescente e perniciosa iliteracia em publicações oficiais e privadas, nas escolas, nos órgãos de comunicação social, na população em geral, e por estar a criar uma geração de analfabetos escolarizados e funcionais. Caso os textos a publicar estejam escritos em Português híbrido, «O Lugar da Língua Portuguesa» acciona a correcção automática.

Comentários

Este Blogue aceita comentários de todas as pessoas, e os comentários serão publicados desde que seja claro que a pessoa que comentou interpretou correctamente o conteúdo da publicação. 1) Identifique-se com o seu verdadeiro nome. 2) Seja respeitoso e cordial, ainda que crítico. Argumente e pense com profundidade e seriedade e não como quem "manda bocas". 3) São bem-vindas objecções, correcções factuais, contra-exemplos e discordâncias. Serão eliminados os comentários que contenham linguagem ordinária e insultos, ou de conteúdo racista e xenófobo. Em resumo: comente com educação, atendendo ao conteúdo da publicação, para que o seu comentário seja mantido.

Contacto

isabelferreira@net.sapo.pt