Copyright © Isabel A. Ferreira 2010
Tinha apenas 12 anos. Uma história de vida triste. Vítima de bullying, uma prática violenta, perpetrada por “valentões” que não passam de grandes cobardes.
Hoje em dia diz-se bullying. No tempo em que eu andava na escola, não se dizia nada. Não sei. Não me lembro. Mas já existia esta prática, ou algo parecido.
Lembro-me de que havia um rapaz matulão, que era o terror dos rapazes. Todos eles apanhavam e sofriam agressões violentas, em silêncio. Envergonhados. E ninguém se atrevia a fazer queixa dele ou a fazer-lhe frente.
Um dia, farto, talvez, de agredir os rapazes, virou-se para as meninas. E então as coisas pioraram. Andávamos todos aterrorizados. Quando o matulão aparecia, encolhíamo-nos todos a um canto, e ele escolhia as vítimas.
Sei que não devia contar o que ainda assim vou contar. Tratou-se de uma experiência, e talvez não sirva de exemplo, uma vez que o bullying é cometido por vários cobardes contra um inocente. Ali era um matulão contra um ou mais.
Um dia, chegou a minha vez. Tinha eu doze anos, tal como o Leandro. Como nunca suportei a violência, jurei a mim mesma, que aquele fulano em mim não punha aquelas manápulas terríveis. Deu-me então uma fúria tal que, ao primeiro ataque, engalfinhei-me com ele, e ele apanhou tantas, mas tantas, que teve de se esconder debaixo de uma mesa, à frente de uma assistência apavorada. A humilhação foi terrível para ele. No final, fiquei aterrorizada, pois pensei que depois disto não me safava.
Todos os meus amigos pensaram o mesmo.
E o que, então, aconteceu foi surpreendente: o matulão, saiu muito devagar debaixo da mesa, e humilhadíssimo, talvez por ter sido batido por uma menina, deixou o recinto de cabeça baixa, e nunca mais, nunca mais, depois disto, se meteu a valentão com mais ninguém no colégio ou fora dele. E, lentamente, foi se integrando até ser aceite como “amigo”.
Anos mais tarde, teve de ser internado no Hospital Psiquiátrico Sobral Cid, em Coimbra, por se tornar frequentemente violento. Sabendo disso, estando eu a estudar em Coimbra, fui visitá-lo. Ele ficou eternamente agradecido pela minha visita, e pela “lição que lhe dei um dia” (palavras dele). Uns tempos mais tarde, fui ao funeral deste jovem que não tece vez, na sociedade.
Cheguei à conclusão de que os valentões, no fundo, são uns grandes cobardes, ou têm problemas psicológicos, e quando alguém lhes faz frente, não passam disso mesmo, uns cobardes, e recolhem-se à sua insignificância.
Hoje em dia, as coisas estão mais sofisticadas.
Às escolas cabe dar segurança às crianças. As crianças devem ser instigadas a denunciar estas agressões, e os agressores deveriam ser expulsos do ensino e levados para um reformatório onde teriam de aprender a ser civilizados, se quisessem regressar a uma sociedade organizada.
Não se admite que se deixe chegar a violência a tais extremos, que “obrigue” um menino de 12 anos a suicidar-se. Alguém terá de se responsabilizar por esta morte precoce. Terrível. Inacreditável!
Que sociedade é esta, a nossa?
Espero que a morte do Leandro sirva para mudar alguma coisa quanto a este fenómeno deprimente, incivilizado, primitivo, bárbaro, que é o bullying, para que nenhum outro menino tenha de se atirar ao rio, para não viver em sofrimento.