Excelente artigo, de André Silva, deputado do PAN na Assembleia da República.
Apenas um Ser Humano, dotado de uma mente superior, lúcido e avançado no tempo, escreveria deste modo um artigo sobre uma prática que já não se justifica no século XXI d.C., e que só existe por dois motivos: interesses económicos obscuros e porque existem ainda criaturas que não evoluíram e carregam instintos assassinos que precisam de exorcizar, divertindo-se a MATAR cobardemente animais indefesos.
A caça, hoje em dia, é uma prática exclusiva de COBARDES.
(I.A.F.)
André Silva
Texto de André Silva
«Ofegava de exaustão e tropeçava nos galhos secos dos trilhos, nem se atrevia a olhar para trás. Saber qual seria o seu destino se os seus perseguidores o capturassem era o que lhe dava combustível para continuar, num movimento de auto preservação instintivo. Os filhos, desprotegidos, já tinham sido mortos. A aflição da perseguição durava já há muitas horas, a energia vital finava. Não percebia porque o queriam matar. Sentia o troar forte dos cavalos mesmo atrás de si, o ladrar dos cães, treinados para o efeito, e os brados eufóricos dos líderes da "corrida". Se o alcançassem seria encurralado e, sem defesa ou escapatória possível, seria espancado com paus até à morte pelos acossadores ou mordido e dilacerado pelos cães. Precisava continuar a correr pela vida…
A Lei da Caça vem dizer que a caça à raposa e ao saca-rabos pode ser exercida de salto, à espera e de batida, podendo ainda a raposa ser caçada a corricão. O processo de caça a corricão é aquele em que o caçador se desloca a pé ou a cavalo para capturar espécies cinegéticas com o auxílio de cães de caça, com ou sem pau, no qual podem ser utilizados até 50 cães.
Estes são os métodos, permitidos na Lei de Bases Gerais da Caça, para perseguir e matar raposas e saca-rabos. Estes são os métodos que os predadores humanos, ditos "evoluídos", utilizam para conviverem e se divertirem aos fins-de- semana numa actividade que lhes proporciona "prazer de viver", conforme ouvimos dizer frequentemente. Uma área económica "muito importante", lá vão tentando convencer-nos também, o mesmo é dizer que estes modos medievais de nos relacionarmos com as outras formas de vida dão lucro. Ah, e defendem que o fazem sempre em harmonia com a natureza, como não poderia deixar de ser. E fazem sempre questão de nos lembrar que não há ninguém que goste mais de animais do que aqueles que os perseguem, os espancam e os matam. Haverá conceitos de harmonia e de equilíbrio mais elevados que aquele que se baseia em divertimento e confraternização em torno de rituais de violência contra seres sensíveis?
A caça à raposa é uma actividade legal no nosso país. Mas significa que é eticamente correcta? Diz-nos a História da humanidade que uma das maiores manifestações de violência são leis injustas que subjugam os mais fracos e indefesos aos interesses dos que detêm poder.
Carimbar de extremistas e fundamentalistas as opiniões e perspectivas diferentes das nossas é, desde sempre, a forma menos sofisticada e mais fácil de tentar manter tudo como está. Para quê mudar leis injustas e práticas violentas? Para não se colocar em crise as tradições, mesmo que isso signifique continuar a estimular crueldades injustificadas.
É irresistível a tentação de invocar conhecimentos científicos como argumentos em defesa de interesses políticos ou corporativos. São vários os argumentos que tentam justificar essa "nobre" actividade da caça à raposa e a utilização de substrato científico para tentar iludir os incautos é, por demais, "sedutora", porque tem funcionado. Para os argumentos de que a raposa não tem predadores, representando uma ameaça para outras espécies, existem várias explicações e soluções científicas. A gestão de um ecossistema, tanto quanto se sabe hoje, consiste em criar condições para que este se mantenha estável, sem perturbação antrópica. Esclarecendo, para não confundir os leitores: as populações de presas são moduladas pelas populações de predadores, mas o reverso também é verdadeiro. As populações de predadores também são moduladas pelas populações de presas. Quando a densidade populacional de predadores é muito elevada as presas diminuem a sua taxa de reprodução, o que tem como consequência a diminuição da população de predadores.
É o que se chama controlo retroactivo de predadores. Interferir com estes sistemas que são dinâmicos por definição dinâmicos só prejudica as suas dinâmicas naturais. A caça é uma das actividades que mais perturba a vida selvagem. Provoca perturbações nas populações locais das espécies-alvo, mas igualmente das espécies não visadas. Os seres humanos são reconhecidos pela fauna como potenciais predadores e quando detectam a sua presença, os animais adoptam comportamentos de fuga para sobrevivência. A energia disponível de um animal é finita e é gerida de acordo com as suas actividades vitais (procura de alimento, abrigo, defesa de território, reprodução, cuidados parentais, etc.). O aumento do gasto energético nos comportamentos de fuga causa diminuição da aptidão e redução do sucesso reprodutor. A sobrevivência dos juvenis depende principalmente dos cuidados parentais. Se os progenitores abandonam o ninho devido à perturbação antrópica, este abandono pode ser letal. A fuga representa um dispêndio energético suplementar imediato e, frequentemente, o abandono do ninho ou da prole.
É também importante sabermos que os distúrbios causados pela caça não só afectam as espécies-alvo, mas quase todas as espécies presentes no território de caça. O balanço não necessita de tender sempre para o lado dos predadores. Se não confundirmos a natureza da fauna com a parte oportunista e competitiva da natureza humana, talvez consigamos analisar estas questões com uma mente verdadeiramente aberta à mudança. E se não for possível aceitar a diferença de pontos de vista, éticos e científicos, respeitá-la com dignidade é uma aprendizagem bem mais nobre do que caçar outras espécies de forma cruel para manter interesses financeiros, tradições bolorentas e "prazeres" levianos.»
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André Silva nasceu a 2 de Abril de 1976, formado em Engenharia Civil e vegetariano, é deputado e porta-voz do PAN, Pessoas - Animais - Natureza
Fonte:
http://www.sabado.pt/opiniao/convidados/andre_silva/detalhe/nao_gosto_de_caca_serei_extremista.html
Um texto do médico veterinário Dr. Vasco Reis
Para ler e reflectir… e depois disto só quem for completamente acéfalo é que continuará a dizer que os Touros e os Cavalos não sofrem…
Aqui estão os embriões de um Cavalo, de um Bovino (Touro) e de um Ser Humano. Quem conseguir dizer que embrião pertence a qual espécie... saberá muito mais do que imagina… Mas se não souberem, perguntem e responderei. E depois pasmem-se...
«Touro, Cavalo, Homem»
Por Dr. Vasco Reis - (médico-veterinário)
Nas três espécies:
O desenvolvimento embrionário é idêntico nas primeiras fases e pouco diverge nas fases seguintes, além de aspectos morfológicos e de alguns órgãos não essenciais.
Pode verificar-se que o esquema anatómico (aparelhos e sistemas) é comum; fisiologia e neurologia são idênticas.
A semelhança de sistema nervoso (centros nervosos, nervos) é flagrante.
A partir de encéfalos (central onde se processa o sentir, o pensar, o compreender, o decidir, o reagir) com estruturas correspondentes nas 3 espécies, é de se esperar que senciência/sentidos, emoções, consciência, sentimentos, estados de disposição, reacções sejam muito semelhantes nas três.
Os vários comportamentos confirmam isso mesmo, implicando semelhanças de necessidades (ar, alimento, água, movimento, espaço, liberdade); de sentidos; de consciência do que se passa à volta; de inteligência; de sentimentos; de emoções; de humores; de reacções a agressão, dor, ferimento, susto, prisão, cio; de confiança e desconfiança; de amizade; de sentido de guarda e de protecção; de ligação sentimental maternal, filial, paternal, fraternal, de grupo; de gosto por carícia, por desafio, por provocação, por brincadeira, etc.
Agressão a um touro ou a um cavalo - seres sencientes - é causadora de sofrimento, não muito diverso do que sofreria um ser humano em circunstâncias análogas.
Sofrimento físico (dor) é fundamental para compelir o ser a defender-se, a afastar-se do agente causador e a procurar segurança e alívio. A dor é assim fundamental e imprescindível para a defesa e a sobrevivência do ser e da espécie.
Não é reacção que se ponha de lado com mais ou menos excitação ou com mais ou menos hormonas (ao contrário do que Illera pretende na sua pseudociência).
As plantas são seres desprovidos de sistema nervoso e, portanto, não podem sentir dor, não têm consciência, não podem reagir rapidamente, não podem fugir. Não sofrem!
Vasco Reis, médico veterinário
Aljezur, 13 de Janeiro de 2014.
Fonte:
https://www.facebook.com/vmmreis/posts/1206826349407743?notif_t=notify_me¬if_id=1484337081059237
Mais um avanço vindo de Espanha. Mais um exemplo vindo de Espanha, com o qual Portugal tem a aprender! Município espanhol reconhece cães e gatos com os mesmos direitos dos humanos
Um município na Espanha acaba de tomar uma decisão histórica, que representa uma grande vitória para os animais.
Na pequena cidade de Trigueros del Valle, região de Castela e Leão, o conselho municipal votou unanimemente em favor de definir cães e gatos como “residentes não-humanos”, o que equivale a conferir a essas espécies direitos similares àqueles dos seres humanos que vivem no município. As informações são do site The Independent.
“Cães e gatos vivem entre nós há mais de mil anos. O prefeito precisa representar não só os residentes humanos, também deve auxiliar os outros,” afirma Pedro Pérez Espinosa, actual prefeito da cidade de cerca de 330 habitantes e membro do Partido Socialista Operário Espanhol.
Entidades defensoras de animais comemoraram a decisão, que confere mais protecção a gatos e cães. “Hoje, somos mais próximos, como espécies, e somos mais humanos, graças à sensibilidade e inteligência demonstradas pelas pessoas de Trigueros del Valle. Esse foi um óptimo dia para cidadãos humanos e não-humanos também,” segundo a organização Rescate 1.
Os novos direitos concedidos a essas espécies também alegraram os opositores das touradas, pois a medida inclui um dispositivo que proíbe “qualquer acção que cause a mutilação ou morte de um residente não-humano.”
Muitos municípios e regiões espanhóis já proibiram as touradas e, para activistas, a nova legislação de Trigueros del Valle também tem a proibição como objectivo.
Regiões como a Catalunha já baniram a prática, desafiando o governo federal de Madrid, que, lastimavelmente, estaria considerando incluir as touradas no património nacional espanhol. Essa medida ofereceria isenções fiscais aos organizadores de touradas e, essencialmente, permitiria que as proibições regionais à prática sejam ignoradas.
Esse não é o único caso em que não-humanos passam a ser titulares de direitos similares aos dos seres humanos. Nos Estados Unidos, há um forte movimento de luta pelo reconhecimento dos direitos de chimpanzés. Em Maio, uma corte norte-americana decidiu que quatro chimpanzés prisioneiros em um laboratório de uma universidade não poderiam ser tratados como propriedade, concedendo personalidade jurídica aos primatas. Foi a primeira vez que direitos individuais foram reconhecidos em favor de sujeitos não-humanos nos Estados Unidos, o que indica que há uma tendência positiva nas cortes do país.
Nota da redacção: A ANDA luta para que um dia, todos os animais tenham seus direitos reconhecidos, em todas as cidades de todos os países do mundo.
Fonte: ANDA
Fonte:
(Magnífico texto)
in Blogue Por Falar noutra Coisa
http://porfalarnoutracoisa.blogspot.pt/2014/07/10-argumentos-favor-da-tourada.html
«Já escrevi sobre tourada mas senti que me tinham faltado algumas coisas, e como a semana passada foi assunto quente, aqui ficam opiniões que são minhas. Deixo-vos com 10 argumentos a favor da tourada.
A TOURADA É TRADIÇÃO E CULTURA
É uma actividade que remonta ao século XII, altura em que a maioria das pessoas não sabia ler nem escrever, em que a consciência humana e social era quase nula e ainda se cagava em penicos. Por si só este argumento é parvo, já que os coliseus romanos, queimar bruxas na fogueira e a escravatura também eram tradições culturais de tempos antigos. Felizmente vamos evoluindo enquanto espécie, alguns pelo menos, e vamos adaptando as nossas tradições aos valores da sociedade.
SÓ VÊ QUEM QUER, SÃO GOSTOS E TEMOS QUE RESPEITAR
Sim, a liberdade de opinião é sempre de valorizar. Tem que existir toda a liberdade para se ser parvo é um facto, que é o que este argumento é. Comentaram uma vez aqui no blogue a dizer "Eu também não gosto de boxe, quando está a dar na TV mudo". Comparar boxe com tourada é o mesmo que comparar violação com sado-masoquismo. Ambos fazem dói-dói mas num estão lá os dois por livre vontade. Quando se fala de direitos e civismo, o gosto e a liberdade não são para aqui chamados, muitos padres também gostam de criancinhas e não é por aí que se vai legalizar a pedofilia.
NÃO COMES CARNE?
O argumento mais parvo de todos que infelizmente é utilizado por muitos vegans para atacar quem não o é, em vez de apoiarem quem está a tentar acabar com a tourada. Comer carne só seria comparável à tourada se começassem a cobrar bilhete para ir ao matadouro assistir ao break dance que as vacas e os porcos fazem quando estão a ser electrocutados. Com direito a transmissão televisiva e a desfile de homens de calças vermelhas, mulheres oxigenadas com filhos de cabelo à playmobil pela mão a dizer "Veja Martim, veja a vaca a contorcer-se, se não fosse tradição e cultura era horrendo, agora assim é uma caturreira." E eu até sou vegan não praticante como já aqui escrevi.
OS TOUROS BRAVOS ESTARIAM EXTINTOS SEM AS TOURADAS
E então? 99% das espécies que já existiram estão extintas. Não fomos nós que as matámos todas, é o curso da natureza. Se for de forma natural é deixá-las ir, não faz muito sentido, a meu ver, manter uma espécie viva para lhe causar sofrimento. Esse argumento seria o que os apoiantes da escravatura utilizariam se a raça negra se estivesse a extinguir. Antes extintos do que escravos, digo eu que nunca fui escravizado mas pelo que li não devia ser agradável.
O TOURO NÃO SOFRE
Este argumento é parvo. Já viram que há um padrão nos argumentos? Não digo que sofra mais que em muitos matadouros, provavelmente sofre menos, mas não é isso que está em causa. É o espectáculo deprimente que se monta à volta de um animal que está a ser espicaçado e sangrado. Mesmo que as bandarilhas não lhe doam assim tanto, não justifica a ritual medieval que hoje em dia é mais para agradar à direita "chique" do que ao povo. Ver pessoas na plateia a tapar a cara de horror, mas que vão na mesma porque está na moda... era um par de chapadas à padrasto para aprenderem.
OS TOUROS SÃO ANIMAIS AGRESSIVOS E NASCERAM PARA A LIDE
Os touros são animais territoriais e selvagens e como tal, quem lhes invada o território sujeita-se a levar com um chifre nas nalgas. Fora isso são animais normais colocados entre a bandarilha e parede, onde se vêem forçados a marrar nos forcados. Nunca vi um touro a andar a vaguear à noite, escondido em esquinas e becos à espera de uma rapariga perdida para a violar. Nunca vi gangues de touros com lenços na cabeça a arranjar confusão no bairro alto. No entanto os humanos fazem isso e nós, infelizmente, não os pomos numa arena a serem espetados com bandarilhas no lombo. Agressivo e parvo é o ser humano, uns mais que outros.
É UMA ARTE BONITA DE SE VER
Também é bonito ver mulheres nuas na rua (algumas) e não é por isso que é legal. Infelizmente. A definição de arte e a beleza são subjectivas, se o Da Vinci para a tinta dos seus quadros tivesse utilizado bebés e um espremedor de laranjas, também continuavam a ser obras de arte, mas os meios não justificavam os fins. Cá para mim a arte que os aficionados se referem é ver a tomatada dos toureiros ali toda pronunciada no meio dos collants e lantejolas, normalmente de tons rosas e amarelos. Sim, é realmente uma arte conseguirem arrumar aquilo para um lado e ainda conseguirem andar como deve ser.
ATRAI TURISMO
Acredito que sim, mas sabem o que também atrai turismo? Prostituição e drogas. Há até quem vá a certos países de 3º mundo para comer criancinhas. É esse o turismo que queremos ter? Eu cá passo bem sem os estrangeiros que querem ver um animal a sofrer, prefiro mil vezes um grupo de 10 ingleses bêbedos a vomitar.
DÁ EMPREGO A MUITA GENTE
O desemprego é na sua maioria mau, mas há muita gente que está desempregada porque ou não quer trabalhar ou não tem capacidades para fazer nada. Se a tauromaquia é a única coisa que se sabe fazer na vida então se calhar o desemprego é justo. Sem subsídio neste caso se faz favor. Mais uma vez, a droga e a prostituição também dão emprego a muita gente, a diferença é que no caso da droga e da prostituição a legalização iria diminuir o número de pessoas que estão nessa vida contra a sua própria vontade.
PREOCUPEM-SE ANTES COM OS CÃES ABANDONADOS
As coisas não são mutuamente exclusivas. A questão é que uma acontece às escondidas (e agora já é crime), a outra passa na RTP. É normal que chame mais à atenção. Não acho que quem goste de tourada seja automaticamente atrasado mental e má pessoa como acho de quem abandona um cão. Quem faz isso a um animal com o qual conviveu e devia ter criado laços, para o deixar a sofrer algures na beira de uma estrada ou numa mata, devia morrer. Quem faz isso é impossível ser uma pessoa decente e devia estar numa arena a ser sodomizado por uma manada de touros com elefantíase do pénis. O touro sempre tirava algum prazer assim.
Por falar na nova lei que criminaliza os maus tratos a animais, como sabem só se aplica aos de companhia. Será que se eu tiver um touro amestrado lhe posso espetar ferros no lombo para o ensinar a dar a sentar e dar a pata? E os circos a mesma coisa, aliás os circos com animais e as touradas têm um ponto em comum, ambos maltratam e exploram seres vivos contra a sua vontade e ambos têm palhaços, no caso das touradas costumam estar também nas bancadas.
***
Posto isto, quero apenas terminar dizendo que respeito muito mais quem gosta de tourada e diz que gosta porque sim, porque cresceu com isso e não está preocupado com o touro. Que o sofrimento do animal não o preocupa. Respeito muito mais quem tem essa honestidade do que quem tenta dar um destes argumentos parvos que fazem tanto sentido como a tourada ainda existir. Nenhum.
PS - Quem gostou, pode ler também este texto. Quem não gostou, pode ir lá deixar ofensas.»
Os primitivos usaram a inteligência; os modernos abusam do Poder.
Copyright © Isabel A. Ferreira
in Manual de Civilidade - Edição Maio de 2000
(Origem da foto) http://www.escolasapereira.com.br/v_pagina.php?a=tag428
Perguntas-me por que razão te dirijo todas estas palavras?
Por nada de especial.
Apenas pretendo evitar, se for esse o caso, que não comprometas o futuro, com os teus excessos, com os teus exageros, com a tua inabilidade, com a tua cegueira. É que gostaria de viver o que me resta da vida, sem ter de me preocupar contigo. Por isso, decidi expor-te o meu pensamento.
Quando criança, fui criança e costumava dizer: «Quando eu for grande quero ser...». Tanta coisa eu quis ser! Já passei pela juventude e fui apenas o que tive de ser. Nem criança, nem adulta. Apenas jovem. Hoje, estou a meio do meu percurso. Continuo a seguir em frente, claro! Vivo como posso e como sei. Não sou criança, também não sou jovem. Sou apenas o que sou. Como convém.
Quando ultrapassar o Cabo da Boa Esperança, navegarei em outras águas, talvez um pouco mais turvas, mas nem por isso deixarão de ser boas águas para navegar, e provavelmente continuarei a seguir o meu caminho, com a tranquilidade da primeira idade, pois viver cada época de cada vez é a evolução natural da vida. Pretender invertê-la não criará o caos?
Todas as vidas começam de um modo muito primitivo. Uma simples e frágil sementinha transforma-se num belo e frondoso embondeiro, se lhe derem condições. A isto chama-se progresso: movimento para a frente.
Diz-se que o homem também nasceu primitivo. Vivia em cavernas, andava nu e utilizava instrumentos muito rudimentares. No entanto, esse homem primitivo e inculto fez algo que o homem moderno, esparramando tanta sabedoria e tão alta tecnologia, não conseguiu fazer: progresso. Os antigos usaram a sua inteligência, e da pedra à madeira, da madeira à cerâmica, da cerâmica ao metal, tirando partido do fogo, dos ventos e das águas, inventaram quase tudo o que está na base das sociedades ditas modernas.
Todavia, o que o homem primitivo construiu apenas com a sua inteligência, habilidade, e muito engenho e arte, o homem moderno destrói com a sua alta tecnologia. Inabilmente. Desinteligentemente.
E o que faz o homem do nosso tempo com o espantoso progresso dos seus primitivos antepassados? Transforma-o num moderno retrocesso, e o pior é que se vangloria desse feito, assim como de outros feitos também.
Diz ufanado: «Navego na Internet». Isso é bom. É muito bom. Mas navega igualmente em outras águas, onde se vão extinguindo todas as espécies...
Saberás qual é a diferença entre o homem primitivo e o homem moderno?
O homem primitivo usou a inteligência em prol do progresso; o homem moderno abusa do progresso em prol do retrocesso.
E chama a isso PODER.
in «Manual de Civilidade» © Isabel A. Ferreira