Sábado, 18 de Janeiro de 2020

Estranho mundo, o nosso…

 

«Exige-se do jornalista que faça quase instantaneamente um trabalho parecido com o do historiador. Daí a importância da sua cultura, do seu conhecimento da actualidade, do seu sentido crítico, e também da sua habilidade em utilizar os meios que estão à sua disposição para se informar tão completamente quanto possível e assim informar os outros com eficiência» (Philippe Gaillard, mestre do Jornalismo Francês).
 
 
Que mundo será este, o nosso?
 
 

Deus.png

Copyright © Isabel A. Ferreira 2009
 
 
Aldous Huxley, considerado um dos maiores escritores de Língua Inglesa bem como um dos mais aliciantes e inquietantes romancistas do século XX, escreveu uma obra intitulada Admirável Mundo Novo, na qual apela para a consciência dos homens e denuncia o perigo que ameaça a Humanidade se o homem não se tornar surdo ao canto da sereia do falso progresso.
 
Neste livro, o autor apresenta-nos uma visão de um futuro (imaginado) onde o selvagem (o homem que não foi mecanizado) não tem outra saída senão a do suicídio.
 
Tempos mais tarde, Huxley escreve um outro romance que intitula Regresso ao Admirável Mundo Novo, onde nos revela até que ponto o que fantasiou no seu primeiro romance se tornou realidade. E, de um modo irónico, apresenta-nos os aspectos da vida do seu tempo que lhe confirmaram ou tenderam a confirmar a fantasia do seu Admirável Mundo Novo.
 
Sem o engenho nem a arte de Aldous Huxley, evidentemente, proponho-me igualmente a apelar para a consciência dos homens do tempo que passa, e denunciar uma certa ignorância que ameaça transformar o nosso país, num lugar sem lei, onde qualquer indivíduo faz o que bem entende, violentando com isso a imagem humana de uma sociedade que se diz responsável e orgulhosa dos seus valores culturais, sociais, religiosos e morais, sem que alguém, de direito, interfira, com lucidez.
 
Assim, tal como Aldous Huxley (ainda que mal me compare) vejo-me impelida a reflectir sobre este Estranho Mundo o Nosso, onde, curiosamente, as leis não se fazem cumprir, e com tal reflexão tentar alertar os cidadãos menos atentos, para o que ao nosso redor se vai passando.
 
E se os cães ladram e a caravana passa, isto é, se aqueles que têm um objectivo definido (ainda que esse objectivo seja o de infringir a lei), não se preocupam com a desaprovação alheia e continuam a provocar os cidadãos e as autoridades, temo que estes cidadãos e estas autoridades tenham perdido o respeito por si próprios, permitindo todo o género de abusos sem reagirem firmemente, e necessitam rever urgentemente o seu código de ética pessoal e profissional, regressando à escola para estudar as leis que ainda vão vigorando no país e que não permitem que se violente, por exemplo, os direitos das crianças, uma vez que os homens perderam a vergonha e a dignidade, não sei se definitivamente.
 
Cada cidadão tem (ou devia ter) um papel específico a representar na sociedade pela qual é responsável, ou seja, aos médicos cabe cuidar de todo e qualquer doente; aos padres alimentar com palavras do Evangelho o espírito dos crentes; aos advogados defender os bons e atenuar as penas dos maus; aos juízes fazer justiça, e não apenas cumprir leis inadequadas, e assim por diante…
 
Quanto aos jornalistas, o melhor é utilizar as palavras dos grandes mestres (que a nova geração, ao que parece, já não lê): «Qualquer que seja o seu posto, o jornalista honesto exerce uma função social relevante» (Victor Silva Lopes).
 
«O jornalista é o historiador do quotidiano: tem de ver o que muitos ignoram; tem de estar onde os outros não estão. É o homem dos mil olhos dividido em mil homens: vive de factos e de ideias – alimenta a curiosidade dos leitores com palavras. Com palavras que terão sempre de possuir força, dignidade e honra. Imagem devolvida do que se passa no coração do Mundo, o jornal é um comportamento moral e o jornalista um estafeta que passa o testemunho, desde há milénios, quando o homem primitivo comunicou, para todos os séculos, a verdade circundante – gravando nas grutas de Altamira as rudes tarefas, os seus doces amores, os seus amargos desesperos» (Baptista-Bastos).
 
«Exige-se do jornalista que faça quase instantaneamente um trabalho parecido com o do historiador. Daí a importância da sua cultura, do seu conhecimento da actualidade, do seu sentido crítico, e também da sua habilidade em utilizar os meios que estão à sua disposição para se informar tão completamente quanto possível e assim informar os outros com eficiência» (Philippe Gaillard, mestre do Jornalismo Francês).
 
Finalmente, às autoridades, entre outras atribuições, cabe fazer cumprir as leis aplicáveis (porque existem algumas completamente inaplicáveis, inúteis e destrutivas), zelar pela integridade física e moral dos cidadãos e defendê-los contra toda e qualquer afronta.
 
Mas vá-se lá agora saber por que é que no nosso país somos agredidos continuamente pelas mais diversas perversidades, sem que haja uma luz ao fundo do túnel, que nos dê, pelo menos, a esperança de que algo está a fazer-se para se modificar as leis decadentes, que são as nossas, para podermos dizer: até que enfim, a tranquilidade que merecemos está connosco.
 
Miguel de Cervantes, que tinha uma visão de águia, além do D. Quixote e outras obras interessantíssimas, deixou-nos este pensamento, depois de ver os seus carrascos a serem condenados, e o qual cito frequentemente, porque também creio nele: Deus suporta os maus, mas não eternamente…
 
Quanto ao Homem, que é mortal e imperfeito, deverá suportar esses maus eternamente?
 
 
Isabel A. Ferreira
 
 
publicado por Isabel A. Ferreira às 16:02

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Sábado, 12 de Dezembro de 2009

«Os Mal-Amados», livro de Fernando Dacosta

 

Copyright © Isabel A. Ferreira 2009
 
No dia do seu aniversário, a minha modesta homenagem, Fernado Dacosta.
 
 
Parabéns Fernando Dacosta!
Em 12 de Dezembro de 1945, nasce em Caxito, Angola, completando precisamente hoje, 64 anos.
Não conheço pessoalmente Fernando Dacosta. Só de nome. E que nome! Só da obra. E que obra! Um dia, talvez, me depare com ele, algures, num lugar de livros, e então, se ele não for vedeta (como penso que não será, porque quem é grande não precisa dessas coisas menores, como muitos que eu já tive o desprazer de conhecer), aproximar-me-ei dele e agradecer-lhe-ei a estética das palavras que deixou escritas nos seus livros, para meu deleite.
Sou uma leitora compulsiva. Tenho sempre uma montanha de livros à espera de serem lidos, mas nem sempre as coisas correm conforme o meu desejo. Gostaria de ter mais disponibilidade para a leitura. Mas em mim, existe também o apelo da escrita, e todas as coisas menores de um quotidiano de mulher, em idade activa, confinada à casa, porque o mercado de trabalho para alguém que escreve é absolutamente nulo. Sim, pode escrever, mas de borla (dizem-me). De borla, como se alguém pudesse alimentar-se de “borla”! O que me vale são algumas traduções e revisões tipográficas que dão para o vício: a compra de livros.
Se temos um livro para publicar, há que pagar a edição, com dinheiro que ainda não ganhámos. Talvez sejamos os únicos “obreiros” em Portugal (nos países com gente inteligente dentro, não é assim) que têm de pagar o que produzem, a “patrões”, que só mais tarde, (e é preciso andar a mendigar dois, três anos) nos dão uma migalhinha do produto desse trabalho, que, por vezes, demora anos a executar. E a sensação com que ficamos é a de que pegue lá uma esmolinha, e que seja pelas alminhas do purgatório! Quando for para o Céu, Deus Nosso Senhor a recompensará! O trabalho de criação é nosso, mas temos de pagá-lo, ao contrário das coisas normais. Isto é imoral, mas é a realidade portuguesa dos desapadrinhados da Literatura. No entanto, na primeira, quem quer cai, na segunda cai quem quer. Continuo a aguardar tempos mais inteligentes.
Daí sentir-me também mal-amada!
Mas quem sou eu, comparada com os mal-amados sobre os quais Fernando Dacosta fala no seu belíssimo livro? Não sou ninguém! E isso que importa? Nada, também!
No entanto, não é de mim, nem da minha marginalidade, como autora, que venho aqui tratar. Quero falar de Fernando Dacosta. Deste seu livro, em particular, que me deu um especial prazer a ler, e da sua escrita límpida, irrepreensível, fora da norma actual, que é a má escrita que por aí prolifera. Mas é essa má escrita que vende, e são os próprios agentes da cultura (os editores) que investem e promovem essa mediocridade. Logo ninguém se admire do estado da Nação.
 
 
Só agora tive oportunidade de ler «Os Mal-Amados» (que ficou em espera desde 2008), versão recriada do «Nascido no Estado Novo» (2001). Gosto de livros que falem de homens e de mulheres que deixam um rasto luminoso, por onde passam, e são esses, quase sempre os mal-amados.
Fernando Dacosta, jornalista e escritor de grande mérito, também ele um ser luminoso, tem uma escrita escorreita, cristalina, sem falhas, sem erros, sem obscenidades (agora tão na moda). Palavras correctamente dispostas, com grande sensibilidade, para dizer de existências, de pensamentos, de histórias, de sentimentos, de saberes.
Em «Os Mal-Amados», Fernando Dacosta fala-nos de factos da nossa História, de personalidades que a marcaram, e com quem privou e bebeu-lhes a essência da sobrevivência, neste nosso país, que parece ter nascido malfadado, mas riquíssimo em existências, gestas e gestos valorosos, que poderiam colocar-nos nos píncaros, se o povo que aqui nasceu não se tivesse em tão má auto-estima, e deixasse de venerar a inferioridade que vem de além-fronteiras.
No livro de Fernando Dacosta, além de me deleitar com a leitura da Língua Portuguesa utilizada de um modo magnífico, fascinaram-me as confidências de personalidades que, cada uma ao seu jeito peculiar, contribuíram para acrescentar ao nosso já tão rico espólio (não importa qual) algo de muito invulgar, ou não fossem essas personalidades pessoas invulgares.
Algumas delas tive também o prazer de conhecer pessoalmente, como Agostinho da Silva e Mário Viegas, entre outros, e com os quais partilhei pequenos episódios pitorescos, que talvez um dia, me dê para divulgar. Mas antes tenho muito caminho pela frente, para poder chegar aonde chegam os grandes (se é que algum dia chegarei!); ou então como chegam os que têm vidinhas pequeninas e redondinhas para contar.
Dizia então que «Os Mal-Amados» é um livro que os amantes da leitura devem ler, por todos os motivos e mais um. E esse mais “um”, é o que diz Baptista-Bastos (também este um Grande Homem Português, do Jornalismo e das Letras), na badana do livro: «Grande jornalista (o Fernando), porventura o maior repórter da sua geração; trouxe a sensibilidade, o colorido, o lado humano, secreto, porventura quase insondável dos factos quotidianos».
Abriu-nos uma janela para uma paisagem grande do nosso País e de alguns dos protagonistas da nossa história comum.
Obrigada, Fernando Dacosta.
Parabéns pelo livro, e pelo aniversário.
 
Isabel A. Ferreira
 
 
publicado por Isabel A. Ferreira às 16:41

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Domingo, 7 de Junho de 2009

Estranho mundo, o nosso…

 
«Exige-se do jornalista que faça quase instantaneamente um trabalho parecido com o do historiador. Daí a importância da sua cultura, do seu conhecimento da actualidade, do seu sentido crítico, e também da sua habilidade em utilizar os meios que estão à sua disposição para se informar tão completamente quanto possível e assim informar os outros com eficiência» (Philippe Gaillard, mestre do Jornalismo Francês).
 
 
Que mundo será este, o nosso?
 
 

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Copyright © Isabel A. Ferreira 2009
 
 
Aldous Huxley, considerado um dos maiores escritores de Língua Inglesa bem como um dos mais aliciantes e inquietantes romancistas do século XX, escreveu uma obra intitulada Admirável Mundo Novo, na qual apela para a consciência dos homens e denuncia o perigo que ameaça a Humanidade se o homem não se tornar surdo ao canto da sereia do falso progresso.
 
Neste livro, o autor apresenta-nos uma visão de um futuro (imaginado) onde o selvagem (o homem que não foi mecanizado) não tem outra saída senão a do suicídio.
 
Tempos mais tarde, Huxley escreve um outro romance que intitula Regresso ao Admirável Mundo Novo, onde nos revela até que ponto o que fantasiou no seu primeiro romance se tornou realidade. E, de um modo irónico, apresenta-nos os aspectos da vida do seu tempo que lhe confirmaram ou tenderam a confirmar a fantasia do seu Admirável Mundo Novo.
 
Sem o engenho nem a arte de Aldous Huxley, evidentemente, proponho-me igualmente a apelar para a consciência dos homens do tempo que passa, e denunciar uma certa ignorância que ameaça transformar o nosso país, num lugar sem lei, onde qualquer indivíduo faz o que bem entende, violentando com isso a imagem humana de uma sociedade que se diz responsável e orgulhosa dos seus valores culturais, sociais, religiosos e morais, sem que alguém, de direito, interfira, com lucidez.
 
Assim, tal como Aldous Huxley (ainda que mal me compare) vejo-me impelida a reflectir sobre este Estranho mundo, o nosso, onde, curiosamente, as leis não se fazem cumprir, e com tal reflexão tentar alertar os cidadãos menos atentos, para o que ao nosso redor se vai passando.
 
E se os cães ladram e a caravana passa, isto é, se aqueles que têm um objectivo definido (ainda que esse objectivo seja o de infringir a lei), não se preocupam com a desaprovação alheia e continuam a provocar os cidadãos e as autoridades, temo que estes cidadãos e estas autoridades tenham perdido o respeito por si próprios, permitindo todo o género de abusos sem reagirem firmemente, e necessitam rever urgentemente o seu código de ética pessoal e profissional, regressando à escola para estudar as leis que ainda vão vigorando no país e que não permitem que se violente, por exemplo, os direitos das crianças, uma vez que os homens perderam a vergonha e a dignidade, não sei se definitivamente.
 
Cada cidadão tem (ou devia ter) um papel específico a representar na sociedade pela qual é responsável, ou seja, aos médicos cabe cuidar de todo e qualquer doente; aos padres alimentar com palavras do Evangelho o espírito dos crentes; aos advogados defender os bons e atenuar as penas dos maus; aos juízes fazer justiça, e não apenas cumprir leis inadequadas, e assim por diante…
 
Quanto aos jornalistas, o melhor é utilizar as palavras dos grandes mestres (que a nova geração, ao que parece,  já não lê): «Qualquer que seja o seu posto, o jornalista honesto exerce uma função social relevante» (Victor Silva Lopes).
 
«O jornalista é o historiador do quotidiano: tem de ver o que muitos ignoram; tem de estar onde os outros não estão. É o homem dos mil olhos dividido em mil homens: vive de factos e de ideias – alimenta a curiosidade dos leitores com palavras. Com palavras que terão sempre de possuir força, dignidade e honra. Imagem devolvida do que se passa no coração do Mundo, o jornal é um comportamento moral e o jornalista um estafeta que passa o testemunho, desde há milénios, quando o homem primitivo comunicou, para todos os séculos, a verdade circundante – gravando nas grutas de Altamira as rudes tarefas, os seus doces amores, os seus amargos desesperos» (Baptista-Bastos).
 
«Exige-se do jornalista que faça quase instantaneamente um trabalho parecido com o do historiador. Daí a importância da sua cultura, do seu conhecimento da actualidade, do seu sentido crítico, e também da sua habilidade em utilizar os meios que estão à sua disposição para se informar tão completamente quanto possível e assim informar os outros com eficiência» (Philippe Gaillard, mestre do Jornalismo Francês).
 
Finalmente, às autoridades, entre outras atribuições, cabe fazer cumprir as leis aplicáveis (porque existem algumas completamente inaplicáveis, inúteis e destrutivas), zelar pela integridade física e moral dos cidadãos e defendê-los contra toda e qualquer afronta.
 
Mas vá-se lá agora saber por que é que no nosso país somos agredidos continuamente pelas mais diversas perversidades, sem que haja uma luz ao fundo do túnel, que nos dê, pelo menos a esperança de que algo está a fazer-se para se modificar as leis decadentes, que são as nossas, para podermos dizer: até que enfim, a tranquilidade que merecemos está connosco.
 
Miguel de Cervantes, que tinha uma visão de águia, além do D. Quixote e outras obras interessantíssimas, deixou-nos este pensamento, depois de ver os seus carrascos a serem condenados, o qual cito frequentemente, porque também creio nele: Deus suporta os maus, mas não eternamente…
 
Quanto ao Homem, que é mortal e imperfeito, deverá suportar esses maus eternamente?
 
 
Isabel A. Ferreira
 
publicado por Isabel A. Ferreira às 15:22

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