Situada na travessa de Cedofeita, nº 64 A, na cidade do Porto, a Livraria Lumière (Alfarrabista) acaba de lançar o seu 44º Catálogo Bibliográfico de Livros Seleccionados, homenageando Luísa Dacosta, uma das maiores estilistas da Língua Portuguesa, recentemente falecida.
Capa do catálogo
Contracapa
No Catálogo constam cerca de 260 obras, algumas raras, dos mais variados autores portugueses, entre eles a homenageada.
Esta é uma oportunidade para os apreciadores da escrita de Luísa Dacosta adquirem o livro «Luísa Dacosta – no sonho a liberdade…», da autoria de Isabel A. Ferreira, do qual esta livraria tem a exclusividade de venda.
«Trata-se de um trabalho que, de modo algum pretende ser académico ou erudito, crítico ou de análise linguística. É apenas um olhar despretensioso, de leitora e admiradora da escrita de Luísa Dacosta; a experiência de uma jornalista que segue o percurso literário da escritora desde 1984; uma abordagem pessoal, tendo também em conta o que viveu a escritora, ao longo de vários anos, e o conhecimento do seu modo desassossegado de ser, e do seu pensamento irreverente».
Os leitores podem fazer a sua encomenda por telefone, carta ou e-mail, ou então deslocar-se à livraria, um espaço simpático, onde podemos encontrar os livros que desejamos, escritos em bom Português.
Link para o catálogo:
https://drive.google.com/file/d/0B3aUDDhZdqF9Y0pibTVaOE02eHM/view
Link para a Livraria:
http://livrarialumiere.blogspot.pt/
Por Rui Zink
«Pessoas cinzentas para quem o dinheiro é tudo decidiram chatear quem, vivendo melhor ou pior, se dedicava às indústrias criativas.
O que é um autor? O fisco sabe. O que são direitos de autor? O fisco sabe. Durante décadas, o trabalho criativo tinha benefícios fiscais. Antes de pensarem no Abuso e no Privilégio (palavras que, amarga ironia, cada vez mais estão a ser utilizadas contra os fracos), peço para se lembrarem de uma coisa: poucas classes como a dos artistas fazem tanto trabalho pro bono. Sobretudo no Natal: “Os direitos de autor deste disco/livro/etc. reverterão para…” As escolas não têm dinheiro para pagar a escritores, músicos, actores? Convidam-nos.
Eu já me habituei a puxar do cartão de militante da JSD sempre que recebo um “convite”. Porque de antemão sei que é uma borla. Entrementes, na cabeça do neofisco, sou um chulo da nação, uma cigarra preguiçosa. Tá mal. Mas eles acham que nos andámos a divertir durante demasiado tempo.
E agora o fisco-formiga vem vingar-se das cigarras. É normal. Numa época em que se celebra o empreendedorismo, onde a economite é a nova dinamite e o negocismo o novo ideologismo (isto é, Nova Verdade Absoluta), pessoas cinzentas para quem o dinheiro é tudo decidiram chatear quem, vivendo melhor ou pior, se dedicava às indústrias criativas. Avanço com um exemplo: uma conferência já não é reconhecida pelos contabilistas como trabalho criativo. Então é o quê? “Autopromoção”, já calhou responderem com o sorrisinho sacana de quem pode & manda.
É a vingança dos contadores de dinheiro contra os contadores de histórias. O regime fiscal magoa e mói. A graça é que, como em tempos de antanho, quem tem a navalha maior é que decide o que é o quê.
A situação não é inédita. É um retrocesso, mas não é inédita. No tempo em que os livros eram apreendidos pela PIDE, o agente da autoridade tinha um poder maior do que o mais severo crítico literário: o de tirar a obra da circulação e, eventualmente, mandar o autor para o merecido banho de cadeia. José Vilhena fez um livro cujas ilustrações eram, todas-todinhas, reproduções de obras-primas da arte, de Goya a Munch. Isso não impediu que dezenas de agentes da PIDE e da PSP o apreendessem com o argumento, repetido, de “conter imagens pornográficas”. Nunca se pode ter razão, não sobretudo contra a Arrogância da Ignorância. (Verdade seja dita que Vilhena estava a pedi-las: o livro em questão chamava-se A Cama.)
Em 1990 os Felizes da Fé fizeram um teatro em forma de manif na Rua Augusta, de “apoio aos países em vias de extinção”. A polícia veio em estado de alerta, porque era uma manifestação ilegal. Havia cartazes ameaçadores como este meu favorito: “Alemanha há só uma/as duas e mais nenhuma.” De nada serviram os protestos dos detidos de que era teatro de rua numa rua adequada para a função, e por isso não carecia de nada. As autoridades insistiram, surdas como só as autoridades sabem ser: queriam o papelinho do Governo Civil. Não havia, não houve, e os actores lá foram presos. É como diz Fernando Pessoa: nunca se pode ter razão, nem na Rua Augusta.
Este regresso triunfal da estupidez não é felizmente exclusivo nacional. Em França, em 2011, um fiscalista de génio tentou um belo golpe que, tivesse resultado, seria o açambarcar da galinha dos ovos de ouro. O belga Uderzo acumulara durante 50 anos milhões como co-autor do Astérix. E agora vinha o genial contabilista explicar que tal fora um lamentável erro a carecer do justo correctivo: Uderzo recebera como co-autor quando devia ter recebido apenas como mero ilustrador. Um golpe notável: porque, deixasse Uderzo de ser considerado autor, teria de devolver o pilim “irregularmente recebido” como direitos de autor. Muito dinheirinho para construir a Nova França de Sarkozy. Por azar, Uderzo tinha bons advogados (o dinheiro dos direitos também serve para isso) e a indignação geral – mundial mesmo – acalmou os ânimos do fisco e fez recuar o esbulho.
Se nada for mudado – e os artistas não tiverem um bocado de coragem –, 2015 arrisca-se a ser um ano ainda mais negro do que o costume para muitos e muitos autores portugueses. Não é só uma questão de dinheiro: é também uma questão de princípio. (E, receio, de fim.)
Docente universitário FCSH-UNL»
Fonte: http://www.publico.pt/portugal/noticia/asterix-au-portugal-1680133
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Excelente, Rui Zink.
A Arte, todas as Artes Nobres em Portugal (porque as há menores, e essas recebem subsídios do Estado Português) não são suficientemente dignas para merecerem uma distinção monetária. Os artistas e os autores, esses, são o tapete onde a sociedade limpa os pés e sacode o pó do capote. (Isabel A. Ferreira)
Em 08 de Agosto de 2014 enviei à IGAC, com o meu mais veemente repúdio, o link correspondente ao seguinte texto:
http://arcodealmedina.blogs.sapo.pt/touros-de-fogo-em-portugal-com-o-aval-451608
Reza a crónica que no dia 15 de Agosto a arena de tortura de Coruche receberá pela primeira vez um concurso de recortadores internacional com Touros de fogo, o que constitui um crime face à lei portuguesa.
E gabam-se os organizadores desta crueldade que acrobatas portugueses, espanhóis e franceses farão as delícias naturalmente de um público sádico e ignorante, que goza com o sofrimento de um ser vivo.
E isto para comemorar a Nossa Senhora da Salvação, que fará tudo menos salvar esta gente do fogo dos infernos.
Como toda a gente sabe, Touros de fogo não são permitidos em Portugal, mas num país sem rei nem roque, tudo é permitido nas barbas das autoridades.
Naturalmente indignada, como um direito meu, consignado na Constituição Portuguesa, enviei uma denúncia à IGAC, antes da consumação dos factos.
E da IGAC recebi esta resposta:
«Exma. Senhora
Isabel Ferreira
No seguimento do e-mail infra, encarrega-me o Senhor Inspe[c]tor-geral das A[c]tividades Culturais de informar o seguinte:
Em relação à comunicação remetida a esta Inspe[c]ção-geral sobre o assunto em epígrafe, sublinha-se que, diferentemente do veiculado, não foi produzida qualquer autorização pela IGAC para utilização do recinto descrito, para o espe[c]táculo em causa.
Informa-se, ainda, que os espe[c]táculos de recortes não se enquadram no regulamento do espe[c]táculo tauromáquico nem se integram no conceito de espe[c]táculo de natureza artística, não sendo assim da competência desta Inspe[c]ção-geral a autorização de realização de espe[c]táculos daquela natureza.
Neste domínio, a competência da IGAC intervém apenas na autorização de utilização de recintos fixos de espe[c]táculos licenciados para outras a[c]tividades, não enquadradas em qualquer das modalidades supra referidas, a qual depende da avaliação do tipo de utilização do recinto face às características do mesmo.
Por último, agradece-se desde já todos os elementos facultados a esta Inspe[c]ção-geral e que serão tidos em atenção numa possível avaliação de pedido de autorização de utilização do recinto.
Com os melhores cumprimentos
ELISABETE RODRIGUES
Técnica Superior [?] da Dire[c]ção de Serviços de Estratégia, Inovação e Comunicação
INSPE[C]ÇÃO-GERAL DAS A[C]TIVIDADES CULTURAIS
Acrescentar valor à cultura, aos autores e ao espe[c]táculo [?????????]».
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Como todas as mensagens que recebo merecem resposta, aqui deixo o que enviei à Exma. Senhora Dona Elisabete Rodrigues:
Exma. Senhora ELISABETE RODRIGUES,
Técnica Superior da Direcção de Serviços de Estratégia, Inovação e Comunicação
INSPECÇÃO-GERAL DAS ACTIVIDADES CULTURAIS
Agradeço a gentileza da resposta.
Sendo assim, este caso ainda é mais grave do que parece.
Está repleto de contornos criminais.
Esperamos, pois, que sejam tomadas a devidas providências por parte das autoridades competentes, e que os prevaricadores sejam severamente punidos, para que não se repitam, em território português, estas iniquidades, que estão ao nível de um qualquer país terceiro-mundista.
Se Portugal fosse um País livre da praga tauromáquica, que o catapulta para um passado, onde imperava a ignorância no seu estado mais puro, estes vergonhosos episódios não conspurcariam a sociedade portuguesa contemporânea, que se quer evoluída, civilizada e culta, e eu não estaria aqui a escrever estas linhas, totalmente desapropriadas ao tempo que corre.
Permita-me acrescentar que gostei muito do V. lema:
«Acrescentar valor à cultura, aos autores e ao espectáculo».
Pois esperamos que a Direcção de Serviços de Estratégia, Inovação e Comunicação comece a pôr em prática este lema, e que eu regresse a este Blogue, para elogiar (e não mais para criticar) a IGAC, uma vez que poderiam decidir acrescentar valor à cultura, aos autores e ao espectáculo, não autorizando barbaridades destas e outras consentidas por uma lei ilegal.
Com os meus melhores cumprimentos e com aquela esperança que não morrerá nunca, e aguardando que as autoridades desautorizem tal barbaridade,
Isabel A. Ferreira