Até que enfim que encontro alguém que, nesta questão da Covid-19, põe os pontos nos is, com a lucidez requerida.
Um texto do Dr. Pedro Girão, Anestesiologista na empresa Hospital da Luz Arrábida e responsável de Anestesiologia na empresa Hospital de Magalhães Lemos, E.P.E.
Por Pedro Girão
«DO PÂNICO E OUTROS MONSTROS»
O tema do Covid cansa. Após uns dias de pausa, venho resumir o essencial das minhas posições.
Sou médico há 31 anos. Acredito em doenças infecciosas, em bactérias, vírus e fungos, acredito nos tratamentos e soluções que a Medicina “clássica” foi e vai encontrando: anti-sépticos, antibióticos, anti-víricos, vacinas, etc. Acredito na eficácia das máscaras e no seu uso obrigatório em situações específicas. Acredito na necessidade de isolamento de doentes em situações concretas. E acredito que cada tratamento e cada medida têm o seu lugar próprio, o seu tempo próprio e o seu uso sensato.
Dito isto, defendo (desde o início, conforme está escrito e gravado) que o modo como se encarou e geriu o Covid é profundamente insensato e errado, a nível global. Houve um erro de análise e um erro de resposta, como sempre acontece quando se entra em pânico. E o que temos visto, desde o início, é isso mesmo: o mundo a ter um ataque de pânico. E eu, como médico, pelos mesmos motivos que me fazem acreditar em tudo o que listei acima, acredito também que um ataque de pânico é uma resposta patológica e que necessita de tratamento. Mas faço parte de uma minoria, pois a maioria das pessoas permanece no pânico ou alimenta o pânico.
O principal mediador desse ataque de pânico foram e continuam a ser os media. Desde o início, o foco não está nos doentes nem em quem precisa, o foco está em quem tem medo de ficar doente, que é naturalmente toda a gente (e em Portugal isso foi fácil pois o exemplo veio de cima, desse expoente máximo da cobardia hipocondríaca que temos como presidente). Desde o início, o foco não está em proteger a saúde das pessoas, o foco está em aplicar medidas de efeito duvidoso, ainda que indirectamente atacando a saúde das pessoas. Desde o início, o foco não está na sociedade, está no indivíduo que se vê a si mesmo como o centro do mundo.
Na minha opinião, a única saída era e ainda é manter a calma, proteger os vulneráveis, apostar no sistema de saúde, preparar as pessoas para a normalidade do que se ia passar e do que se está a passar. Anormal é considerar que uma doença auto-limitada coloca em risco todo o mundo. Anormal é impor medidas sem saber as consequências (com a tranquilidade de saber que, tenham ou não efeito, no final se pode sempre ter a desfaçatez de dizer que sem elas teria sido pior). Anormal é procurar saídas rápidas e mal estudadas (e sim, as prometidas vacinas estão nesse grupo de coisas excelentes mas que não foram suficientemente avaliadas). Anormal é esperar o Messias quando a solução está em nós.
Lamentavelmente, este assunto tornou-se num campo de batalha entre extremos, o que não faz qualquer sentido, e cansa também. Uns e outros, contra e a favor, em tudo e por tudo. Discussões, agressões e insultos. Máscaras, confinamentos, vacinas, tudo serve para o mesmo fim inútil. Lembra-me um casal que discute, sem sentido, a propósito de todos os assuntos. Mas a discussão num casal, em cujos pormenores cada um pode mostrar que tem mais razão, esconde apenas uma verdade: a falta de amor. E o que eu vejo à minha volta, nas medidas e regras estúpidas, nos encerramentos do atendimento ao público, nas limitações de deslocamentos, no impedimento de visitas, nas proibições mesquinhas, o que eu vejo em tudo isso não são medidas científicas (porque não as são, mas isso é outra conversa), é desprezo pelos outros, é individualismo selvagem, é insensibilidade, é falta de amor.
É pena que seja essa a política oficial, é pena que seja essa a vontade apoiada pela maioria. Quem está doente nunca toma boas decisões, mas o ataque de pânico tornou-se crónico e estou cansado de alertar o(s) doente(s) para o que não quer(em) ver. Parafraseando Almada Negreiros, se isto é Portugal, eu quero ser espanhol - mas neste caso Espanha está igual, todo o mundo está igual, e o Inverno em Marte está desagradável. Resta, portanto, deixar passar o tempo, e esperar que o mundo, doente e em pânico, não se suicide na ânsia de uma cura que é impossível, porque o monstro é a sua própria sombra.
Fonte: https://www.facebook.com/photo/?fbid=10225725208415942&set=a.3119140256439