Quinta-feira, 5 de Março de 2015

DAS ESTRANHAS SENSIBILIDADES NAS REDES SOCIAIS

 

Um texto que diz muito. Um texto que diz tudo.

 

Nunca entenderei nem respeitarei os indivíduos que adoptam um animal para o manterem isolado numa varanda, num terraço, ou para o terem amarrado a uma casota ou uma árvore num quintal.

 

 

 

facebook_mini EDITORIAL 7.jpg

 

 

Por Filomena Marta

 

São largas dezenas de apelos lançados no Facebook, de outras tantas dezenas de animais sem tecto ou abandonados à sua sorte por gente sem alma nem escrúpulos.

 

A maior parte são gatos Europeu Comum, o vulgar gatinho de rua, mais ou menos bonito, mais ou menos novo. Mas também de cães, maioritariamente SRD, ou seja, Sem Raça Definida. O comum rafeiro.

 

Há animais que estão largos meses à espera de uma adopção. Há casos em que se passam anos.

 

Há apelos que são repetidamente lançados sem haver uma única partilha. Total indiferença.

 

O mesmo acontece com os anúncios colocados para adopção nos sites próprios para o efeito.

 

O caso do Sebastião, por exemplo. Um gato sénior, com cerca de 12 ou 13 anos, meigo e manso, a viver na rua há pelo menos nove anos. Por erro da protectora, é certo, que sempre teve excesso de zelo e um amor que lhe roubou a possibilidade de ser adoptado jovem. Quando as adopções, apesar de serem difíceis, ainda são possíveis. Quando o caso do Sebastião chegou até mim tratei de o divulgar com pedido de uma adopção generosa, de alguém que pudesse dar um resto de vida confortável a um velhote. Partilhas = 0 e respostas igualmente nulas.

 

Há sempre o mesmo problema. Há mais gente a abandonar do que a adoptar. Há um profundo egoísmo e individualismo na nossa gente. Há falta de amor pelos animais, também. Mas é pior ainda. A inteligência de grande parte das pessoas que por nós passam é idêntica à de uma pedra da calçada. Isso leva a que tenha de ser feito um acompanhamento cerrado das adopções e a que várias vezes as coisas não corram bem pra o animal e este tenha de ser retirado aos adoptantes.

 

Coisas tão básicas e óbvias como preparar a casa para a chegada do animal não são cumpridas. O comedouro é um velho tupperware sem tampa e nem uma cama se compra para que o animal não tenha de dormir no chão duro e frio. Resultado da forma como os animais são vistos por uma excessiva faixa do nosso povo inculto e incivilizado: é só um animal, é uma coisa.

 

Um adoptante que até podia ser pior do que é, com ares de macho latino de segunda categoria, queixa-se repetidamente do dinheiro que já gastou com o animal que adoptou. Porque é a castração e as vacinas, coisas essenciais à saúde e bem-estar do animal. Mas não, é uma chatice. Não é a alegria de partilhar bons momentos com o animal e receber dele uma atenção e carinho incondicional. Não é o companheiro que nos acompanha e mitiga a nossa solidão. É um bicho que está a dar despesa. Mas então por que adoptam? Se não é por amor, então porquê?

 

Todos os relacionamentos que encetamos na vida devem ter por base o amor e a amizade. Seja qual for a espécie.

 

Já me passou de tudo pelas mãos. Gente arrogante e desprovida de qualquer sentimento. Gente apenas estúpida. Gente mal-educada e mal criada. Gente desequilibrada. Mas felizmente também gente inteligente, cuidadosa, maravilhosa. Gente que dedica aos animais o respeito, cuidado e amor que merecem e de que precisam. Gente para quem o seu gato ou cão são elementos da família e grandes amigos. Gente generosa que adopta animais de difícil adopção: cegos, amputados, velhos ou portadores assintomáticos de doenças que podem num futuro incerto ser fatais. Pena é que estes sejam a minoria.

 

No nosso atrasado país as pessoas não entendem que haja regras e cuidados impostos para a adopção de um animal. Chegam a ficar escandalizadas quando sabem que há entrevistas aos potenciais adoptantes, que os animais são entregues em casa para se confirmar as condições existentes e que há um acompanhamento posterior à adopção. A triste mentalidade é a de “vou aí escolher um gatinho”. Ninguém “vai ali” escolher uma criança. A responsabilidade de ter um animal é idêntica e isso diz tudo. É um ser vivo que sente e sofre que fica dependente de nós, do nosso amor e do nosso constante acompanhamento e atenção. Não é aquela coisa que se amarra com uma corrente a uma árvore e a quem se dá os restos do jantar.

 

Mas isto é o que se passa com os vulgares gatos e cães cujas ternurentas fotografias são divulgadas vezes sem conta nas redes sociais pelas mesmas pessoas sensíveis, e que recolhem indiferença e não são sequer partilhadas. São redes sociais! As partilhas são importantes para que a informação chegue ao máximo de pessoas possível, porque algures poderá estar um bom adoptante para aquele animal.

 

O que me traz à sensibilidade elitista das pessoas. Partilhei uma cadelinha de raça Yorkshire encontrada perdida ou abandonada, não se sabe. Acredito que perdida, pois estava vestida com uma roupinha de malha. Quem a recolheu, recusou dar o contacto e disse que iria entregá-la no canil municipal. Não me lembro de alguma vez ter tido tantas partilhas por causa de um animal, nem de ter tantas pessoas a dizer “fico com ela”, mesmo sem saberem se tinha dono ou não.

 

Fenómeno idêntico se passa com os gatinhos cinzentos, chamados “azuis”, que apesar de serem simples Europeu Comum são muito parecidos com os gatos de raça Russian Blue (Azul Russo), Chartreux ou Korat. Sempre que um gatinho desses é divulgado chovem contactos vindos dos mais variados idiotas, que adoram ter gatinhos a combinar com a decoração lá de casa. Não seja por isso, porque um belo gato preto vai bem em qualquer decoração, não há nada mais elegante… nem nada que seja deixado tão para o fim da lista, ignorado, escorraçado e rejeitado.

 

Um dia, quiçá, iremos tornar-nos um povo culto, inteligente e evoluído. Afinal, a esperança é última a morrer…

 

Filomena Marta

 

Fonte:

http://petcourrier.com/index.php/pt/edit/633-das-estranhas-sensibilidades-nas-redes-sociais

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:22

link do post | Comentar | Adicionar aos favoritos

Mais sobre mim

Pesquisar neste blog

 

Dezembro 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

Posts recentes

DAS ESTRANHAS SENSIBILIDA...

Arquivos

Dezembro 2024

Novembro 2024

Outubro 2024

Setembro 2024

Agosto 2024

Junho 2024

Maio 2024

Abril 2024

Março 2024

Fevereiro 2024

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Agosto 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Dezembro 2021

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Agosto 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Agosto 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Direitos

© Todos os direitos reservados Os textos publicados neste blogue têm © A autora agradece a todos os que os divulgarem que indiquem, por favor, a fonte e os links dos mesmos. Obrigada.
RSS

AO90

Em defesa da Língua Portuguesa, a autora deste Blogue não adopta o Acordo Ortográfico de 1990, nem publica textos acordizados, devido a este ser ilegal e inconstitucional, linguisticamente inconsistente, estruturalmente incongruente, para além de, comprovadamente, ser causa de uma crescente e perniciosa iliteracia em publicações oficiais e privadas, nas escolas, nos órgãos de comunicação social, na população em geral, e por estar a criar uma geração de analfabetos escolarizados e funcionais. Caso os textos a publicar estejam escritos em Português híbrido, «O Lugar da Língua Portuguesa» acciona a correcção automática.

Comentários

Este Blogue aceita comentários de todas as pessoas, e os comentários serão publicados desde que seja claro que a pessoa que comentou interpretou correctamente o conteúdo da publicação. 1) Identifique-se com o seu verdadeiro nome. 2) Seja respeitoso e cordial, ainda que crítico. Argumente e pense com profundidade e seriedade e não como quem "manda bocas". 3) São bem-vindas objecções, correcções factuais, contra-exemplos e discordâncias. Serão eliminados os comentários que contenham linguagem ordinária e insultos, ou de conteúdo racista e xenófobo. Em resumo: comente com educação, atendendo ao conteúdo da publicação, para que o seu comentário seja mantido.

Contacto

isabelferreira@net.sapo.pt