Quarta-feira, 18 de Dezembro de 2024

«Bicadas do meu Aparo»: “Críticos e estátuas, no reino do meu mundo”, por Artur Soares

 

Desconheço se há ou não há alguma estátua erigida a algum crítico. Pode ser que haja. Havendo, e pelo menos nas centenas de estátuas que conheço, nunca no seu frontispício vi ou li o cognome de “Crítico, ou “Crítico justo”.

Desconheço ainda se tal actividade é profissão ou dom, e se é necessário ser “doutor de crítica” e se existe qualquer sindicato ou associação de críticos. Neste meu mundo, nestes últimos cem anos, isto é, durante as três repúblicas que já vivemos - pois já vamos na quarta - penso que é a actividade com mais evidência – o criticismo.

 

Vemos críticos duma ponta à outra do quintal e nos mais variados sectores da vida profissional, social, familiar, económica e religiosa. No desporto então, é “um ver se te avias”: não há jornais, televisões e tempo que chegue, para se ler e ouvir as críticas dos críticos.

 

Todo mundo critica, todo o mundo percebe do Mundo!

 

Oscar Wilde.PNG

 

Pensando bem e analisando melhor, o crítico, aquele crítico que se aceitaria e se deveria respeitar, havia de ser aquele que percebesse “com profundidade” o que criticasse (para construir), e aquele, portanto, que fizesse ou fosse muito melhor que os que construíram. Mas não!

 

No reino do meu mundo, com as reduzidíssimas excepções, o crítico que temos, vemos, lemos ou ouvimos, é aquele que vive do que diz e que pretende vender a ideia de que é ou faz melhor, do que aqueles que vai criticando.

 

No reino do meu mundo, os críticos, para além da espada ou da faca que usam para esquartejar quem quer que seja, actuam cobardemente tantas vezes e não há leis que o julguem. Atiram pedras em todas as direcções e são fortes em pontapear coxos.

 

No reino do meu mundo, os críticos, desde que bem ouvidos e bem lidos nas entrelinhas, revelam tantas vezes inveja e incapacidade, chegando aos pontos de até os mortos e bem enterrados não escaparem às investidas das suas críticas.

 

Os críticos do meu reino, têm dificuldade em admirar seja quem for e o que quer que se faça: não são capazes de usar um grama de bálsamo ou de um unguento simples, para amortecer qualquer queda ao seu semelhante.

 

Os críticos do meu reino, ou são gordos ou são magros: os primeiros, porque comem lautas refeições à borla para não criticarem e desaparecem; os segundos, porque perante tanta inveja e tanta incapacidade, pouco comem e, tais defeitos, seca-os.                                                                                                              

Também existem no reino deste meu mundo, os elogiadores, que, bem lá no fundo, também são críticos. Elogiam os compadres, os ofertantes de algo, ou aqueles onde podem “sacar qualquer coisa”. E desconheço, pesa-me a verdade, quando o elogio teve início. Nem tão pouco sei, onde se iniciou.

 

Sabe-se também que sempre houve quem tivesse necessidade ou obrigação de recorrer ao elogio. Uns por delicadeza, simpatia ou para sossegar almas desorientadas. Outros recorrem ao elogio para manterem a respiração dos incompetentes, dos frustrados e dos verdugos, uma vez que o elogiador pode carecer dessa gente; ainda outros, porque se não disparam o elogio, ficam parados na vida ou desconhecidos da sociedade.

 

Sempre hão-de existir os cineastas da vida. O mal é que neste género de arte, por norma, não se ama ninguém. E se parecem amar, não passam de actores a mostrarem virtudes que não têm.

 

O povo do meu reino possui estranhos tiques, ou então vivemos num tempo sem nexo e de atropelos.

 

Recorremos ao elogio mútuo, sentimo-nos bem ao viver com um certo punhado de ilusões. Tantos, não sabendo viver sem serem elogiados ou bajulados, desconhecem que podem estar a receber um carro sem volante e sem travões, dado por essas raposas profissionais da hipocrisia. Como diria, e muito bem a escritora Agustina Bessa Luís: “os elogios poderão ser “verdades engarrafadas”, que a serem bebidas, poderão ser uma zurrapa”.

 

Quantas vezes nas televisões do nosso reino se ouve o elogio mútuo, que além de parecer organizado é ainda teatralizado? Milhares de vezes!

 

Concluiu-se, assim, que só os mortos se devem elogiar, como faziam os Sacerdotes aos monarcas mortos no Egipto, elogiando o que bastava e sem que os vivos ouvissem!

 

Tais críticos e elogiadores provam o mal que padecem e as virtudes que não adubaram: enfermam da falta de verdade em suas vidas.

 

(Artur Soares – escritor d’Aldeia)

 

(O autor não usa o actual acordo ortográfico)                                                                                                                 

                                                                                                     

publicado por Isabel A. Ferreira às 18:55

link do post | Comentar | Adicionar aos favoritos

Mais sobre mim

Pesquisar neste blog

 

Fevereiro 2025

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28

Posts recentes

«Os três almirantes»

Milhares de portugueses e...

«Futuro da tauromaquia es...

Contra o regresso de "Sor...

O mundo dos homens

27 de Janeiro - Assinala...

«Bicadas do Meu Aparo» – ...

Trasladação de Eça de Que...

Boas Festas e o meu muito...

«Bicadas do meu Aparo»: “...

Arquivos

Fevereiro 2025

Janeiro 2025

Dezembro 2024

Novembro 2024

Outubro 2024

Setembro 2024

Agosto 2024

Junho 2024

Maio 2024

Abril 2024

Março 2024

Fevereiro 2024

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Agosto 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Dezembro 2021

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Agosto 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Agosto 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Direitos

© Todos os direitos reservados Os textos publicados neste blogue têm © A autora agradece a todos os que os divulgarem que indiquem, por favor, a fonte e os links dos mesmos. Obrigada.
RSS

AO90

Em defesa da Língua Portuguesa, a autora deste Blogue não adopta o Acordo Ortográfico de 1990, nem publica textos acordizados, devido a este ser ilegal e inconstitucional, linguisticamente inconsistente, estruturalmente incongruente, para além de, comprovadamente, ser causa de uma crescente e perniciosa iliteracia em publicações oficiais e privadas, nas escolas, nos órgãos de comunicação social, na população em geral, e por estar a criar uma geração de analfabetos escolarizados e funcionais. Caso os textos a publicar estejam escritos em Português híbrido, «O Lugar da Língua Portuguesa» acciona a correcção automática.

Comentários

Este Blogue aceita comentários de todas as pessoas, e os comentários serão publicados desde que seja claro que a pessoa que comentou interpretou correctamente o conteúdo da publicação. 1) Identifique-se com o seu verdadeiro nome. 2) Seja respeitoso e cordial, ainda que crítico. Argumente e pense com profundidade e seriedade e não como quem "manda bocas". 3) São bem-vindas objecções, correcções factuais, contra-exemplos e discordâncias. Serão eliminados os comentários que contenham linguagem ordinária e insultos, ou de conteúdo racista e xenófobo. Em resumo: comente com educação, atendendo ao conteúdo da publicação, para que o seu comentário seja mantido.

Contacto

isabelferreira@net.sapo.pt