Desconheço se há ou não há alguma estátua erigida a algum crítico. Pode ser que haja. Havendo, e pelo menos nas centenas de estátuas que conheço, nunca no seu frontispício vi ou li o cognome de “Crítico, ou “Crítico justo”.
Desconheço ainda se tal actividade é profissão ou dom, e se é necessário ser “doutor de crítica” e se existe qualquer sindicato ou associação de críticos. Neste meu mundo, nestes últimos cem anos, isto é, durante as três repúblicas que já vivemos - pois já vamos na quarta - penso que é a actividade com mais evidência – o criticismo.
Vemos críticos duma ponta à outra do quintal e nos mais variados sectores da vida profissional, social, familiar, económica e religiosa. No desporto então, é “um ver se te avias”: não há jornais, televisões e tempo que chegue, para se ler e ouvir as críticas dos críticos.
Todo mundo critica, todo o mundo percebe do Mundo!
Pensando bem e analisando melhor, o crítico, aquele crítico que se aceitaria e se deveria respeitar, havia de ser aquele que percebesse “com profundidade” o que criticasse (para construir), e aquele, portanto, que fizesse ou fosse muito melhor que os que construíram. Mas não!
No reino do meu mundo, com as reduzidíssimas excepções, o crítico que temos, vemos, lemos ou ouvimos, é aquele que vive do que diz e que pretende vender a ideia de que é ou faz melhor, do que aqueles que vai criticando.
No reino do meu mundo, os críticos, para além da espada ou da faca que usam para esquartejar quem quer que seja, actuam cobardemente tantas vezes e não há leis que o julguem. Atiram pedras em todas as direcções e são fortes em pontapear coxos.
No reino do meu mundo, os críticos, desde que bem ouvidos e bem lidos nas entrelinhas, revelam tantas vezes inveja e incapacidade, chegando aos pontos de até os mortos e bem enterrados não escaparem às investidas das suas críticas.
Os críticos do meu reino, têm dificuldade em admirar seja quem for e o que quer que se faça: não são capazes de usar um grama de bálsamo ou de um unguento simples, para amortecer qualquer queda ao seu semelhante.
Os críticos do meu reino, ou são gordos ou são magros: os primeiros, porque comem lautas refeições à borla para não criticarem e desaparecem; os segundos, porque perante tanta inveja e tanta incapacidade, pouco comem e, tais defeitos, seca-os.
Também existem no reino deste meu mundo, os elogiadores, que, bem lá no fundo, também são críticos. Elogiam os compadres, os ofertantes de algo, ou aqueles onde podem “sacar qualquer coisa”. E desconheço, pesa-me a verdade, quando o elogio teve início. Nem tão pouco sei, onde se iniciou.
Sabe-se também que sempre houve quem tivesse necessidade ou obrigação de recorrer ao elogio. Uns por delicadeza, simpatia ou para sossegar almas desorientadas. Outros recorrem ao elogio para manterem a respiração dos incompetentes, dos frustrados e dos verdugos, uma vez que o elogiador pode carecer dessa gente; ainda outros, porque se não disparam o elogio, ficam parados na vida ou desconhecidos da sociedade.
Sempre hão-de existir os cineastas da vida. O mal é que neste género de arte, por norma, não se ama ninguém. E se parecem amar, não passam de actores a mostrarem virtudes que não têm.
O povo do meu reino possui estranhos tiques, ou então vivemos num tempo sem nexo e de atropelos.
Recorremos ao elogio mútuo, sentimo-nos bem ao viver com um certo punhado de ilusões. Tantos, não sabendo viver sem serem elogiados ou bajulados, desconhecem que podem estar a receber um carro sem volante e sem travões, dado por essas raposas profissionais da hipocrisia. Como diria, e muito bem a escritora Agustina Bessa Luís: “os elogios poderão ser “verdades engarrafadas”, que a serem bebidas, poderão ser uma zurrapa”.
Quantas vezes nas televisões do nosso reino se ouve o elogio mútuo, que além de parecer organizado é ainda teatralizado? Milhares de vezes!
Concluiu-se, assim, que só os mortos se devem elogiar, como faziam os Sacerdotes aos monarcas mortos no Egipto, elogiando o que bastava e sem que os vivos ouvissem!
Tais críticos e elogiadores provam o mal que padecem e as virtudes que não adubaram: enfermam da falta de verdade em suas vidas.
(Artur Soares – escritor d’Aldeia)
(O autor não usa o actual acordo ortográfico)