Porque os anos passam, e Portugal marca passo, não progride, não avança, não se civiliza, não tira o pé, que tem fincado, na Idade Média, retorno a mais este excelente texto do Dr. Vasco Reis, Médico-Veterinário (*), o qual dedico a um barranquenho que me escreveu, levado por uma ignorância de que não tem culpa. Mas depois de ler as palavras que se seguem, já não tem desculpa.
Também o dedico aos nossos (des)governantes e deputados da Nação, que não conseguem passar da cepa torta e continuam a apoiar a selvajaria descrita neste texto, por quem estudou a fundo o que é ser animal.
Quanta ternura! Quanta beleza! Quanta dignidade! Por que têm de ser torturados em nome dos prazeres mórbidos de gente desprezível?
Texto de Vasco Reis (Médico-Veterinário)
TAUROMAQUIA I
Na Tourada à Portuguesa, importa mencionar: o terrível sentimento de claustrofobia e pânico que o touro sofre desde que é retirado violentamente da campina e transportado em aperto e confinado; o maltrato antes da lide na arena com a finalidade de o enfraquecer física e animicamente; a provocação e a tortura durante a lide e no fim desta, com a retirada sempre violenta e muito dolorosa das bandarilhas; após a lide, metido no transporte e no curro onde fica esgotado, deprimido, ferido, dorido e febril, em acidose metabólica horrível que o maldispõe e intoxica, até que, dias depois, a morte o liberte de tanto sofrimento.
O cavalo sofre esgotamento e terrível tensão psicológica ao ser usado como veículo, sendo dominado, incitado e lançado pelo cavaleiro e obrigado a enfrentar o touro, quando a sua atitude natural seria a de fuga e de pôr-se a uma distância segura.
À força de treino, de esporas que o magoam e ferem, de ferros na boca e corrente à volta da mandíbula, que o magoam e o subjugam, o cavalo arrisca morte por síncope/paragem cardíaca, ferimentos mais ou menos graves, até a morte na arena.
É difícil, senão impossível, acreditar que toureiros e aficionados amem touros e cavalos, quando os submetem a violência, risco, sofrimento.
Importa reconhecer que em todas as actividades tauromáquicas, mais ou menos cruentas, o sofrimento da captura, claustrofobia e pânico da prisão, do transporte, do curro, estão sempre presentes.
TAUROMAQUIA II
Aqui umas noções concisas de Ciência a quem interessar:
Sistema nervoso, mais ou menos evoluído, é algo comum aos animais.
Plantas não têm sistema nervoso, não têm sensibilidade, não têm consciência.
Não têm a capacidade de fugir ao perigo, à agressão, por exemplo, ao corte, à seca, ao fogo.
Animais humanos e não humanos são seres dotados de sistema nervoso, mais ou menos desenvolvido, que lhes permitem sentir e tomar consciência do que se passa em seu redor e do que é agradável, perigoso e agressivo e doloroso. Estes seres experimentam sensações, emoções e sentimentos muito semelhantes. Este facto leva-os a utilizar mecanismos de defesa e de fuga para poderem sobreviver. Sem essas capacidades não poderiam sobreviver. Portanto, medo e dor são essenciais e condição de sobrevivência.
Afirmar-se que nalguma situação não medicada, algum animal possa não sentir medo e dor se for ameaçado ou ferido, é testemunho da maior ignorância ou intenção de negar uma verdade vital. Alguém acha que isso é possível aos humanos?
A ciência revela que o esquema anatómico, a fisiologia e a neurologia do touro, do cavalo e do homem e de outros mamíferos são extremamente semelhantes.
As reacções destas espécies são análogas perante a ameaça, o susto, o ferimento.
O senso comum apreende e a ciência confirma isto. Portanto, homem, cão, gato, touro, cavalo, coelho, porco, ovelha, cabra, etc., sentem e sofrem de maneira semelhante, seja privação da liberdade, tensão de transporte, sede e fome, medo e pânico, cansaço, agressão, ferimento.
Depois desta explicação, imaginem o sofrimento horrível que uma pessoa teria se fosse posta no lugar de um touro capturado e conduzido ao “calvário” de uma tourada.
Conclusão comportamental ética?
Seres humanos (tauromáquicos) não devem infligir a outros seres de sensibilidade semelhante (touros e cavalos), sofrimentos a que os próprios infligidores (tauromáquicos) não aceitariam ser submetidos.
TAUROMAQUIA III
E porque se permite a Tauromaquia, actividade que assenta na violência e no sofrimento público de animais, legalizado e autorizado por lei e até apreciado, aplaudido e glorificado por alguns?
Para perpetuar uma tradição cruel e retrógrada, que sacrifica animais, prejudica a sociedade e o relacionamento com outros seres nossos companheiros da Terra, embota a sensibilidade, deseduca a juventude para uma vida pacífica e compassiva?
Para que se cumpra uma lei que permite a tortura, lei essa que é contra a Lei de Protecção dos Animais?
Para satisfazer algumas poucas pessoas entusiastas da Tauromaquia, actividade indissociável de violência e de sofrimento?
Para exibicionismo e proventos para os artistas que violentam os animais (touros e cavalos) ou que se aproveitam deles depois destes estarem feridos e esgotados?
Para sustentar alguns postos de trabalho à custa do sofrimento dos touros e cavalos?
Para permitir negócios à custa do sofrimento de touros e cavalos?
Para atraírem turistas incautos ao engano? Na sua maioria estes saem das praças incomodados e indignados com o espectáculo?
Embora esta actividade contribua para dissuadir a vinda a Portugal de muitos turistas, porque abominam a tauromaquia e evitam este país de arenas de tortura?
Embora indignem, revoltem e envergonhem imensos portugueses conscientes e compassivos, por este massacre se passar no nosso país?
Embora se comprometa a reputação de Portugal pelo desrespeito cruel pelos animais, ao contrário do que aqui devia ser princípio?
É claro, que uma verdadeira democracia não permite e legaliza a tortura.
Por estas razões apelamos a que não assistam a touradas e afirmem e divulguem o vosso repúdio por esta cruel actividade.
Vasco Reis (13.6.13)
(*) Este artigo é escrito por um Médico-Veterinário, Dr. Vasco Reis, que foi, em tempos, veterinário nas touradas e assistiu in loco, às barbaridades infligidas a Touros e Cavalos, antes, durante e depois dos espectáculos tauromáquicos, sendo, por isso, um testemunho absoluta e indiscutivelmente credível.