Inacreditável! Inaceitável! Absolutamente abominável!
Como se não bastasse a morte de um touro debaixo de um cobertor, em Monsaraz, mesmo com queixas umas atrás das outras (e, este ano, com a vergonhosa autorização expressa da IGAC), vem a "cereja no topo do bolo": como poderão ver no cartaz abaixo e também no FB da Comissão das Festas locais, Monsaraz encoraja as crianças a uma actividade violenta.
E tudo em honra do Senhor Jesus dos Passos
A Associação ANIMAL já enviou a devida queixa para a COMISSÃO NACIONAL DE PROMOÇÃO DOS DIREITOS E PROTECÇÃO DAS CRIANÇAS E JOVENS, e pedem-nos que façamos o mesmo.
Poderão enviar a mensagem abaixo sugerida, ou, caso prefiram, a vossa própria mensagem (que vos pedimos que seja sempre respeitosa, por favor):
Para: cnpdpcj.presidencia@cnpdpcj.pt
CC: presidente@cm-reguengos-monsaraz.pt; info@animal.org.pt
Exma. Senhora Dra. Rosário Farmhouse,
Digníssima Presidente da CNPDPCJ,
(Com conhecimento ao Senhor Presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, Dr. José Calixto)
Tomei conhecimento de que estão a ser promovidas e encorajadas actividades tauromáquicas com menores, no âmbito das Festas de Nosso Senhor Jesus dos Passos, em Monsaraz.
Pois bem, Portugal ratificou, em 1990, a Convenção sobre os Direitos das Crianças da ONU, significando que se comprometeu a acatar as suas recomendações. Em Fevereiro de 2014, o Comité dos Direitos das Crianças da ONU enviou uma recomendação ao Estado Português para que afastasse as suas crianças da actividade tauromáquica. Cito parte da referida recomendação:
"O comité está preocupado com o bem-estar físico e mental das crianças envolvidas em treino para touradas, bem como com o bem-estar mental e emocional das crianças enquanto espectadores que são expostos à violência das touradas", refere um relatório divulgado nesta quarta-feira por aquele organismo das Nações Unidas. Por isso, é recomendado que Portugal tome medidas legislativas para proteger todas as crianças envolvidas em touradas, "tendo em vista uma eventual proibição. O comité também exorta o Estado a empreender medidas de sensibilização e consciencialização sobre a violência física e mental associada às touradas e o seu impacto nas crianças".
Vejo como muito grave que Portugal, nomeadamente através do seu poder local, nada esteja a fazer para seguir a advertência daquele que é o bastião da defesa da dignidade e direitos das crianças. Na verdade, é meu entendimento que, não o fazendo, o próprio Estado Português está em incumprimento para com aquela Instituição.
Nos termos do n.º 1 do art.º 32.º Artigo 1 "Os Estados Partes reconhecem à criança o direito de ser protegida contra a exploração económica ou a sujeição a trabalhos perigosos ou capazes de comprometer a sua educação, prejudicar a sua saúde ou o seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social". Ora, a realização de espectáculos tauromáquicos com menores de idade não respeita o direito dessas/es que neles intervêm de serem protegidas, se não contra a exploração económica, pelo menos contra a "sujeição de trabalhos perigosos ou capazes de comprometer a sua educação, prejudicar a sua saúde ou o seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social", não só porque a criança em causa enfrenta animais com um porte e força superiores à sua, em cujo grau de perigosidade para a criança em causa é extremo -, mas também porque, segundo defendem diversos especialistas de psicologia clínica, psiquiatria e psicologia infantil, a exposição de crianças a touradas pode comprometer, justamente, o seu "desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social".
Importa ainda, a este propósito, salientar que é consideravelmente consensual, entre psicólogos clínicos, psicólogos da educação, psicólogos infantis e pedopsiquiatras, que a exposição de crianças a touradas, não só ao vivo mas também quando são transmitidas na televisão, prejudica o seu desenvolvimento harmonioso, nomeadamente pela contradição que a exposição destas a espectáculos tauromáquicos encerra - uma vez que em tudo contrasta com as mensagens educacionais de que as crianças são especiais destinatárias, incluindo na sua formação escolar.
Ora, tendo as crianças uma capacidade de pensamento crítico, evidentemente ainda pouco desenvolvida, poderão percepcionar a violência exercida contra animais em touradas como sendo normal, banal, aceitável e até vista como uma acção heróica, tendo em conta o modo como essa mesma acção diverte e entusiasma os espectadores, o que, para indivíduos altamente impressionáveis como são as crianças, poderá levá-las a associar a inflicção de lesões e o sangramento de animais a algo de lúdico e heróico, tendo essa situação um perigoso potencial de perda de capacidade de empatia das crianças face ao sofrimento dos outros - de animais e de humanos.
Assim, um processo de aprendizagem no qual o exercício de violência contra animais - que, independentemente de estar inserido numa prática passível de ser reconhecida como cultural, envolve um agente que não tem ainda maturidade intelectual e moral para fazer uma análise crítica dos seus actos e daquilo que lhe é ensinado e permitido fazer - é ensinado a crianças, por acção ou omissão, como algo de aceitável, belo e até heróico. E tal é, claramente, susceptível de comprometer o "desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social" das crianças que se encontram nesta situação.
Uma vez que nos termos do artigo 1.º da Convenção sobre os Direitos da Criança, adoptada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada pelo Estado Português em 21 de Setembro de 1990, "criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo", venho pedir a V. Exas. se dignem tomar uma posição para impedir tal acto de violência para com as crianças.
Dois pesos e duas medidas
Enviarei este texto também para as autoridades políticas e eclesiásticas do meu desventurado país, no qual existem dois pesos e duas medidas no que respeita à protecção de crianças e jovens. Já vi retirarem crianças a pais desempregados, que não tinham meios para os alimentar. Esta era a única "violência" que lhes faziam. E em vez de dar meios a esses pais para alimentar as crianças, o governo português retira-as cruelmente do seio familiar.
No entanto, lançam à crueldade e à violência crianças que tiveram a infelicidade de serem filhos de aficionados de selvajaria tauromáquica, com progenitores que as incentivam a essa crueldade e violência, e não vejo as autoridades (in)competentes a mexerem uma palha para as retirar desse meio familiar doentio, perverso e depravado.
Isabel A. Ferreira