Segunda-feira, 3 de Outubro de 2011

Testemunho do Doutor Vasco Reis *

 

Um importante testemunho sobre o que é, verddaeiramente, uma tourada.


 

 
 

«A pior forma de cobardia, é testar o poder na fraqueza dos outros»

 

(Um texto do Doutor Vasco Reis, Médico-Veterinário, que subscrevo inteiramente e que transcrevo com a devida vénia)

 

Importa debater a questão da Tauromaquia em Portugal, abordando-a com toda a objectividade e publicitar este debate, para que os portugueses compreendam bem do que se trata e formem uma opinião sobre a sua utilidade, o seu mérito ou demérito e a sua aceitação ou repúdio. 

... 

Para isso é preciso argumentar profunda, científica, ética, cultural, socialmente.

O touro é o elemento sempre massacrado da tauromaquia, desde intensa prolongada ansiedade, repetidos e dolorosos ferimentos, esgotamento anímico e físico e quase sempre a morte em longa agonia.

O cavalo, dominado e violentado pelo cavaleiro tauromáquico é o elemento obrigado a arriscar tudo e a sofrer perante o touro, desde ansiedade, ferimento físico até a morte.

Estes factos, inegáveis e indissociáveis da tauromaquia, seriam suficientes para interditar a sua existência numa sociedade culta, consciente, pacífica e compassiva.

É esta a opinião dos anti-tauromáquicos, que dispõem de imensos argumentos ditados pelo senso comum e confirmados pela ciência.

Da parte dos tauromáquicos e dos seus aficionados colhem-se argumentos falaciosos, não ditados pelo senso comum, não confirmados pela ciência, baseando-se na tradição, no gosto pelo “espectáculo”, em interesses económicos, omitindo praticamente (ignorado ou não) o sofrimento sempre presente destes condenados a serem “actores” à força - o touro e, no toureio montado - o cavalo.

Na verdade, plantas não têm sistema nervoso, não têm sensibilidade, não têm consciência.

Animais são seres dotados de sistema nervoso mais ou menos desenvolvido, que lhes permitem sentir e tomar consciência do que se passa em seu redor e do que é perigoso e agressivo e doloroso. Este facto leva-os a utilizar mecanismos de defesa e de fuga para poderem sobreviver. Sem essas capacidades não poderiam sobreviver.

Portanto, medo e dor são essenciais e condição de sobrevivência.

É testemunho da maior ignorância ou intenção de ludíbrio o afirmar que algum animal em qualquer situação possa não sentir medo e dor, se for ameaçado ou ferido.

A ciência revela que a constituição anatómica e a fisiologia do touro, do cavalo e do homem são extremamente semelhantes. Os ADN são quase coincidentes.

As reacções destas espécies são análogas perante a ameaça, o susto, o ferimento.

O senso comum apreende isto e a ciência o confirma.

O especismo é uma atitude que, arrogantemente coloca o Homem numa posição de superioridade, que lhe permite dispor sobre os animais como entender.

A compaixão selectiva visa tratar bem certas espécies (em geral cães e gatos) e menos outras, quase consideradas como objectos.

Os animais não humanos são considerados menos inteligentes do que os seres humanos. Podem estar mais ou menos próximos e mais ou menos familiarizados connosco, mas eles são tanto ou mais sensíveis do que nós ao medo ao susto e à dor.

É, portanto, nosso dever ético não lhes causar sofrimento desnecessário.

"A compaixão universal é o fundamento da ética" - um belo pensamento do filósofo alemão Arthur Schopenhauer.

A tauromaquia está eivada de especismo sobre o touro e sobre o cavalo.

O homem faz espectáculo e demonstração da sua "superioridade" provocando, fintando, ferindo com panóplia de ferros que cortam, cravam, atravessam, esgotam, por vezes matam o touro, em suma lhe provocam enorme e prolongado sofrimento, para gaúdio de uma assistência que se diverte com o sofrimento, a agonia e morte de um animal.

Isto é comparável aos espectáculos de circo romano, há muito considerado espectáculo bárbaro, onde escravos e cristãos eram obrigados a lutarem e matarem-se uns aos outros ou eram atirados aos leões para serem devorados.

O cavalo é dominado com ferros castigando as gengivas bucais e por esporas mais ou menos agressivas, até cortantes, no ventre.

Esta montada é posta em risco de mais ferimento e de morte pelo cavaleiro tauromáquico, que o utiliza como veículo para combater e vencer o touro.

O sofrimento do cavalo soma-se aqui ao do touro.

Na tauromaquia, touro e cavalo são excluídos de qualquer compaixão, antes pelo contrário estão completamente submetidos à violência e ao sofrimento.

E o espectáculo é legal em Portugal, publicitado e mostrado na comunicação social, aclamado, fonte de negócio.

Mas nesta “arte” não são somente touros e cavalos que sofrem.

São muitas as pessoas conscientes e compassivas, que por esta prática de violência e de crueldade se sentem extremamente preocupadas e indignadas e sofrem solidariamente e a consideram anti-educativa, fonte de enorme vergonha para o país, atentatório de reputação internacional, obstáculo dissuasor do turismo de pessoas conscientes, que se negam a visitar um país onde tais práticas, que consideram "bárbaras", acontecem!

Com certeza que existem boas e inócuas alternativas para os aficionados, para os trabalhadores tauromáquicos, para os "artistas", para os campos e para os touros e cavalos.

Será positivo para os aficionados irem ver e até pagar bilhete para assistir ao sofrimento de animais?

Chamar arte à tauromaquia e compará-la ao ballet, ao teatro, etc., é falacioso.

Afirmar comparativamente que o ballet também provoca dor é infeliz e despropositado.

O que se assiste no enredo do teatro, de uma peça de ballet é representação, sem provocação real, sem ferimento, sem morte e os actores estão ali voluntariamente.

Porque fazem sofrer os animais os chamados “artistas”? Dar-lhes-à isso algum gozo?

Será isso admirável, corajoso, heróico?

Porque não fazer o espectáculo teatralmente e com o belo aparato visual e musical, mas sem os touros e sem o sofrimento animal?

Eu seria espectador para isso.

Os campos podem ser utilizados de outro modo e continuar a serem subsidiados.

A raça pode ser mantida sem a cruel tauromaquia e continuar a ser subsidiada.

Os trabalhadores, campinos e ganadeiros podem continuar o seu trabalho.

Os forcados, cujo papel só surge depois do touro ter sido massacrado previamente, podem dedicar-se a actividades ou desportos onde valentia, luta corpo a corpo são fulcrais, como boxe, luta livre e outros e acrescidos de espírito de grupo, como o rugby, por exemplo.

Creiam, que eu tenho conhecimentos e experiência para escrever este texto.

Sou médico-veterinário desde 1967. Estudei em Portugal e na Alemanha. Trabalhei na Suíça sete anos, na Alemanha 10 anos, nos Açores três anos (na Praia da Vitória, Ilha Terceira, onde existe aficción e onde tive de intervir obrigatoriamente no acompanhamento dos touros nas touradas, na minha qualidade de médico veterinário municipal), 22 anos em Aljezur em Portugal Continental.

Trabalhei sempre com gado bovino e cavalos.

Fui cavaleiro de concurso hípico completo e detentor de dois cavalos polivalentes. Conheço bem cavalos, a sua personalidade e as suas aptidões.

Fui entusiástico jogador de rugby durante três, anos, o que interrompi por acidente, que me impossibilitou a continuação da prática.

Aconselho, pela sua superior qualidade, alguns vídeos extremamente informativos, muito influentes no processo que teve lugar no Parlamento da Catalunha.

(*) Médico-Veterinário municipal aposentado.

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:51

link do post | Comentar | Adicionar aos favoritos
Comentários:
De Nazaré Oliveira a 8 de Outubro de 2011 às 20:39
Excelente!

Ainda há gente que nos dá força para a luta! Ainda há gente séria!
Um abraço fraterno para todos os que estão connosco.
De Isabel A. Ferreira a 9 de Outubro de 2011 às 13:47
Obrigada, Nazaré.
Haverermos de vencer esta causa, porque ela é absolutamente JUSTA.

Nenhum país pode ser considerado civilizado se mantém práticas primitivas.

Mas as autoridades que deviam ser competentes (e não são) tinham de intervir, e só não o fazem por dois motivos: entre elas há alguns aficionados, que empancam o processo de abolição, e, obviamente, o lobby do lucro, se bem que um lucro manchado do sangue de inocentes seres vivos.
De joca a 30 de Outubro de 2011 às 01:53
Este senhor até pode ter sido veterinário dos cães do Presidente da República, e dos cavalos dos soldados romanos...O que aqui está escrito não é sério. Então o cavalo e o toiro acabam por morrer?Agora a tourada mata touros e cavalos?Tornou-se matadouro? Como é que um veterinário diz que o touro só investe porque é ameaçado?Conhece aqueles ferros que sao espetados em que é o próprio toiro que vai ter com o cavaleiro? Já viu isso? Tem uma explicação para isso? Deve ser porque se sente ameaçado pelo ar, só pode...E o cavalo? Não treinou cavalos para andar aos saltos? O que faz ali o cavalo de mais stressante do que no hipismo? Fazer do cavaleiro um boneco, é demonstrar profundo desconhecimento pelas corridas e acham que têm razão porque têm um diploma na parede. E se sabe tanto, acha que iam continuar a subsidiar ganadarias, sem touradas, para quê???Por amor de Deus...
De Isabel A. Ferreira a 30 de Outubro de 2011 às 11:12
Sr. Joca, se era para vir aqui dizer asneiras, mais valia estar calado.

O Dr. Reis sabe o que está a dizer, aliás não é preciso ser Veterinário para sabermos que os Touros e os Cavalos não são para ser utilizados em parte alguma, como joguete do homem predador.

São animais com sensibilidade muito maior do que esses que os torturam.

Os cavalos também não existem para serem utilizados no Hipismo.

Enquanto vocês, homens predadores, não se consciencializarem de que os animais não humanos, sejam quais forem, não são objectos para serem manipulados, mas sim seres vivos, com dignidade, sensibilidade e inteligência, o mundo será um lugar desagradável tanto para os seres humanos, como para os seres não humanos.

Os homens predadores são dispensáveis, neste mundo. E você também, sr. Joca.

Comentar post

Mais sobre mim

Pesquisar neste blog

 

Setembro 2024

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30

Posts recentes

Fogos florestais: em Port...

Triunfo histórico: Colômb...

«Bicadas do Meu Aparo: “...

«Amo Portugal», por Eduar...

«Um país de bacocos?»

Aconteceu em Alcochete, u...

Pausa para descanso...

Carta Aberta à socialista...

O que as escolas NÃO te c...

«Bicadas do meu Aparo»: C...

Arquivos

Setembro 2024

Agosto 2024

Junho 2024

Maio 2024

Abril 2024

Março 2024

Fevereiro 2024

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Agosto 2022

Junho 2022

Maio 2022

Abril 2022

Março 2022

Fevereiro 2022

Janeiro 2022

Dezembro 2021

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Agosto 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Agosto 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Setembro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Direitos

© Todos os direitos reservados Os textos publicados neste blogue têm © A autora agradece a todos os que os divulgarem que indiquem, por favor, a fonte e os links dos mesmos. Obrigada.
RSS

AO90

Em defesa da Língua Portuguesa, a autora deste Blogue não adopta o Acordo Ortográfico de 1990, nem publica textos acordizados, devido a este ser ilegal e inconstitucional, linguisticamente inconsistente, estruturalmente incongruente, para além de, comprovadamente, ser causa de uma crescente e perniciosa iliteracia em publicações oficiais e privadas, nas escolas, nos órgãos de comunicação social, na população em geral, e por estar a criar uma geração de analfabetos escolarizados e funcionais. Caso os textos a publicar estejam escritos em Português híbrido, «O Lugar da Língua Portuguesa» acciona a correcção automática.

Comentários

Este Blogue aceita comentários de todas as pessoas, e os comentários serão publicados desde que seja claro que a pessoa que comentou interpretou correctamente o conteúdo da publicação. 1) Identifique-se com o seu verdadeiro nome. 2) Seja respeitoso e cordial, ainda que crítico. Argumente e pense com profundidade e seriedade e não como quem "manda bocas". 3) São bem-vindas objecções, correcções factuais, contra-exemplos e discordâncias. Serão eliminados os comentários que contenham linguagem ordinária e insultos, ou de conteúdo racista e xenófobo. Em resumo: comente com educação, atendendo ao conteúdo da publicação, para que o seu comentário seja mantido.

Contacto

isabelferreira@net.sapo.pt