Copyright © Isabel A. Ferreira 2009
A missão de quem escreve não será apenas a de informar a opinião pública do que se vai passando ao seu redor, mas também a de opinar ou a de transmitir conhecimentos adquiridos através da sua própria vivência, os quais possam esclarecer ou mesmo dar uma outra visão de coisas que, por vezes, passam despercebidas à maioria das pessoas.
Ouvimos dizer por aí que este ou aquele povo tem uma Cultura elevada ou uma Civilização notável. Contudo, saberemos nós verdadeiramente o que é Cultura ou Civilização? Serão conceitos semelhantes ou haverá alguma diferença entre ambos?
É esta a reflexão que proponho.
Quando frequentava o curso de História, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, uma das disciplinas que me ajudou a compreender melhor a Humanidade foi a de Cultura Medieval, ministrada pelo ilustre Professor, já jubilado, Dr. José Maria da Cruz Pontes.
Entre a filosofia medieval, nomeadamente a dos grandes Doutores da Igreja e o legado da Cultura Greco-romana transmitida aos bárbaros e transformada pelo Cristianismo (visão da Idade Média sob o ponto de vista cultural), o Prof. Dr. J. M. Cruz Pontes ensinou-nos a distinguir CULTURA de CIVILIZAÇÃO, dois conceitos inerentes ao Homem, os quais podem transformar o mundo num paraíso ou num caos, conforme o maior ou menor grau de inteligência desse mesmo Homem, isto é, da sua capacidade de se adaptar, consciente e racionalmente, às situações criadas pelo desenrolar da própria vida.
Uma das definições mais comuns é a de que Cultura é tudo o que resta quando se esqueceu o que foi aprendido.
Segundo o vulgar dicionário da Língua Portuguesa, Cultura é a totalidade das manifestações espirituais que constituem a herança social de um povo e determinam a sua persistência histórica.
Na Universidade, aprendi com o Professor Cruz Pontes que Cultura é o resultado da acção positiva do Homem sobre a Natureza; é igualmente a actividade preparatória que conduz o espírito do Homem a produzir frutos; é a realização de valores espirituais; é o conjunto orgânico dos valores expressos pela actividade intelectual do Homem, na sua faceta construtiva.
Cultura é posse espiritual; é conquista interior; é a grandeza moral do Homem irradiada no seu agir construtivo; é a capacidade de escolher entre o saber e a erudição, e ser capaz de utilizar positivamente esse saber.
A Cultura produz valores; é o conhecimento elaborado; é a assimilação do saber pela inteligência. Como formação, Cultura é a agilidade do espírito; é capacidade de síntese, de apreciar, de criticar e seleccionar os valores que nos são apresentados.
Cultura é, em suma, a atitude positiva do Homem em relação ao Mundo.
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Quanto à Civilização, como poderemos defini-la?
Civilização pode ser definida como a perfeição do estado social ou o progresso nas Artes, nas Ciências, nos Saberes, nos Costumes e noutras manifestações culturais e espirituais de um povo.
A Civilização é produzida pela Cultura; é o património de bens materiais que determinam as características do bem-estar colectivo; é bem material; é o avanço no progresso criativo de conquistas exteriores: progresso social, económico, político.
Civilização é o avanço bem-intencionado do Homem no mundo, desfrutando os valores adquiridos pela Cultura; é o produto da sua acção positiva.
No seu fazer-se e como resultado da acção criativa do Homem, Civilização é uma parte da Cultura; é a potência da grandeza moral do Homem; é, enfim, a fase final do ciclo cultural.
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Posto isto, se analisarmos o que se passa no nosso país, e o compararmos com o que atrás ficou escrito, verificamos que, relativamente à Cultura, os Portugueses andam dela muito distanciados: uns, porque se limitam a aceitar indiferentemente, sem o menor sentido crítico, aquilo que lhes é impingido; outros, porque a Cultura não lhes diz nada; outros ainda, enchem a boca com a palavra Cultura, mas não fazem a mínima ideia do seu significado, e então contentam-se com a mediocridade, promovem e cultuam a mediocridade.
Naturalmente existem excepções honrosas, em posições-chave para poderem alterar o statu quo. Porém, é muito mais cómodo acomodarem-se.
No que diz respeito à Civilização, estamos muito por baixo, pois se considerarmos um dos seus aspectos, por exemplo, a potência da grandeza moral do Homem, verificamos que a única grandeza do nosso país está no imenso Oceano Atlântico que afaga as praias de Portugal.
O homem, porém, não nasce sabendo, daí existirem instrumentos próprios que lhe proporcionam toda a espécie de ensinamentos, os quais, em princípio, deveriam servir-lhe para alguma coisa útil. No entanto, não servem, e a apatia cultural e civilizacional instalou-se entre o nosso povo, e pelo que se vê, não há grandes perspectivas de melhoras.
Teremos nós, no nosso país, uma Cultura e uma Civilização apuradas?
Será que a atitude dos Portugueses em relação ao rumo que o país leva é positiva?
Terá o nosso país um património de bens materiais que determinam as características do bem-estar colectivo?
Não me apetece, neste momento, responder a estas perguntas.
Apetece-me apenas dizer: desventurados os ignorantes que, por falta de motivação superior, não se apercebem do Bom e do Belo, que nunca chegarão a usufruir, simplesmente por desconhecerem a sua existência!
Todavia, nos tempos que passam, só é ignorante quem quer...
Isabel A. Ferreira