Antes de dizer ao que venho, e porque a MORTE de um ser vivo, seja ele humano ou não-humano, não me é indiferente, e, neste caso, nem que seja apenas pela família, a ela quero enviar, em primeiro lugar, as minhas condolências, esperando que o espírito de Jorge Sampaio, esteja onde estiver, possa fazer um acto de contrição, agora que sabe, uma vez que passou para outra dimensão, que a VIDA não é uma exclusividade do Homem, e deve ser respeitada enquanto Vida, e não desprezada, para divertir “humanos” insensíveis.
A Morte é um caminho que nos leva à Luz que há-de iluminar os Espíritos que, em Vida, viveram nas Trevas...
Estive calada desde o dia em soube da morte de Jorge Sampaio, por respeito à morte, por respeito à família, por respeito à Dr.ª Maria José Ritta, a quem um dia, numa cerimónia pública, na Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, tendo sido dado aos fotógrafos pouco espaço entre a mesa de honra e a primeira fila dos convidados, onde se encontrava Maria José Ritta, ao tentar apanhar o melhor ângulo, para fotografar o Presidente da República Portuguesa, Jorge Sampaio, pisei-lhe o pé, e quando me virei para pedir desculpa, vi que tinha pisado o pé da primeira-dama de Portugal. Pedi-lhe muita desculpa, e ela, com uma extraordinária simpatia e um belo sorriso no rosto disse-me «não se preocupe, já estou habituada». Tal gentileza sensibilizou-me e nunca a esqueci.
Este episódio aconteceu antes do fatídico ano de 2002, quando Jorge Sampaio, talvez levado por um impulso irreflectido, ou porque já estaria no seu ADN uma apetência por divertir-se com o sofrimento de seres vivos, primeiro, ao serem torturados, depois ao serem mortos na arena, sob o aplauso de gente estranha, alucinada, delirante diante dos estertores da MORTE de um animal não-humano, tão animal quanto um ser humano, e com um ADN muito semelhante ao do homem, e com todas as necessidades vitais iguais à do homem, e dotados de um sistema nervoso central, que lhes permite sentir a DOR que os animais humanos, nas mesmas condições, sentem, como dizia, no fatídico ano de 2002, Jorge Sampaio outorga uma incompreensível excepção à lei, e introduz os Touros de morte no vilarejo medieval de Barrancos.
Milan Kundera diz que a verdadeira bondade humana só pode manifestar-se, em toda a sua pureza e liberdade, em relação aos que não têm poder.
Jorge Sampaio, nos elogios fúnebres, no dia do seu funeral, foi recordado como um homem bom, generoso, humanista, ético, herói, político de excepção, enfim, não foram poupados elogios ao presidente da República Portuguesa que banalizou a Morte, fazendo dela um “espectáculo” público em Barrancos.
Jorge Sampaio chegou a receber, na ONU, o Prémio Nelson Mandela, cujo objectivo é reconhecer as realizações daqueles que dedicam as suas vidas a serviço da Humanidade, promovendo os propósitos e princípios das Nações Unidas.
Não me parece que apoiar a tortura e a morte em público de animais sencientes, sirva de exemplo à Humanidade.
Isto fere. Magoa no mais fundo, a Alma de quem respeita a VIDA de todos os seres, porque a VIDA de cada ser é importante para esses seres. Eles nascem para cumprir uma missão, e cumprem-na na perfeição. O homem, o exterminador (não o outro HOMEM, o criador) é o único ser, na Natureza, que vem ao mundo com a missão de destruir a harmonia da VIDA no Planeta.
O que eu gostaria de perceber, é como o cidadão Jorge Sampaio, Presidente da República Portuguesa, nascido em berço de ouro, um homem que estudou no estrangeiro, e com um reconhecido currículo, e que até era afável, pôde descer tão baixo ao defender uma prática bárbara a que chamou, indevidamente, de "tradição" como TORTURAR e MATAR seres vivos sencientes?
Faço minhas as palavras de duas senhoras, que tal como eu, não compreendem estes comportamentos desviantes, vindo de pessoas que não nasceram em berço de lama:
«Jamais lamentarei a morte de quem foi capaz de atraiçoar a Arte e a nossa Cultura, alargando o espectro do gozo alarve de quem assiste a uma tourada, à boçal aceitação e "legalidade" da tortura e morte horrenda de bovinos em praça pública: Pelos touros mortos e sangrados em Barrancos!» (Teresa Botelho)
«Eu lamento, lamento que tenha morrido sem se retratar, já que não poderia mudar o erro. É bom que se fale das coisas boas e que se lembre igualmente as coisas más. Calar os erros é normalizar a indiferença sobre tamanha crueldade.» (Paula Russel)
Para tentarmos perceber o que levou Jorge Sampaio a outorgar a lei que levou a Barrancos a MORTE, vejamos o que nos diz o Jornal “i” (podem consultar neste link: http://www.ionline.pt/509784 )
Diz o “i” que Jorge Sampaio e Vera Jardim, dois aficionados assumidos, nados e criados entre a barbárie, viajavam até Madrid para assistir a touros de morte. Não esqueçamos que Jorge Sampaio, enquanto presidente da República, levou os “touros de morte” para Barrancos, uma das mais atrasadas localidades portuguesas, talvez para não ter de ir tão longe satisfazer os seus mais mórbidos instintos.
Ainda recorrendo ao jornal “i”, este referiu que andando Jorge Sampaio em campanha eleitoral para a Presidência da República, em Vila Franca de Xira [um outro antro de selvajaria tauromáquica] um jornalista perguntou-lhe se gostava de touradas. Os que o rodeavam esperaram dele uma resposta politicamente correcta, mas Sampaio deixou falar mais alto a sua carga genética involutiva e os seus instintos mais mórbidos e disse; “Gosto muito e só tenho pena de não poder assistir mais vezes.”
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Quando as crianças são levadas, desde tenra idade, a assistir à tortura de Touros, quando tal desgraça acontece na vida delas, um instinto cruel enraíza-se nelas e, quando crescem, tornam-se sádicas, ávidas de ver sangue e sofrimento, sem o menor escrúpulo, sem a menor compaixão. Típico da síndrome da apetência para a crueldade que nelas se desenvolve. O que não desculpa as atitudes, porque quando crescem, têm a oportunidade de evoluir, e não a aproveitam.
Tudo o que Jorge Sampaio pudesse ter feito de bom, de ético, de generoso, de humano, de heróico, cai por terra com tamanha falta de bondade, de ética, de generosidade, de humanismo, de heroicidade ao deleitar-se com a DOR e com a MORTE de um animal senciente, e de ter feito valer este desvalor em Barrancos, mergulhando nas trevas a sua Vida que poderia ter sido de Luz.
Esteja onde estiver, Dr. Jorge Sampaio, sei que está a dar-me razão, agora que sabe que a VIDA não é uma exclusividade do homem. E também sei que o que me levou a escrever este texto, não veio de mim, mas de uma força exterior a mim, mais forte do que eu.
Quem sabe se essa força não é a sua consciência, numa derradeira tentativa de exorcizar a culpa por todas as vidas indefesas, inocentes e inofensivas, que foram ceifadas em Barrancos, e poder alcançar o perdão de todos os que se horrorizaram com tal inconsciência.
Isabel A. Ferreira