Copyright © Isabel A. Ferreira 2010
Vivemos num mundo onde a MORTE de seres humanos e de seres não-humanos (a destes muito mais) se banalizou a tal ponto que a essência da Humanidade se afundou no pântano da iniquidade.
Até onde nos levará esta loucura colectiva?
O mundo afunda-se num abismo imenso, e ainda há quem se divirta com a depravação de actos e de factos consumados por indivíduos sem dignidade, sem palavra, sem consciência, sem respeito por si próprios.
Impera uma ignorância obscura, assente numa mentalidade estagnada, que nos faz retroceder ao tempo em que dominavam os brutos, lançando o caos e espalhando a morte à sua passagem, pilhando, exterminando povos, violando mulheres, raptando crianças...
Isto soa a passado?
Não, não soa.
Ainda hoje vi, ouvi e li notícias tão semelhantes a estas de tempos idos...
Hoje, precisamente ainda hoje, um dia do ano de 2010, depois de Cristo.
O que aconteceu?
Existirá uma idiotice congénita que é transmitida através do Poder, e a partir desse poder, essa idiotice rasteja até aos mais perversos indivíduos, e estes vão espalhando o terror, a morte e a miséria mental pelo mundo?
Se não vejamos o que temos:
Fome; sede; doenças misteriosas; novas bactérias; novos vírus; poluição; tráfico de drogas; tráfico de armas; tráfico de seres humanos; tráfico de animais não humanos; escravatura infantil; pedofilia; violações de mulheres novas, idosas e crianças; assassinatos; guerras “santas”; terrorismo; lutas fratricidas; mortes gratuitas; roubos; condenações à morte; lapidações; mutilações; massacres; prisões arbitrárias; tortura de seres não humanos para divertimento...
Novas mentes velhas andam por aí...
Na verdade, este mundo é um lugar sinistro, cheio de gente sinistra que odeia e ri-se dos seres humanos que tentam semear girassóis nos campos onde jazem os que morreram às suas mãos...
São eles, os comedores de carne putrefacta e ossos, que se riem, mostrando uns dentes já apodrecidos pelo tempo antigo que neles estagnou...
Isabel A. Ferreira
Uma vez que a história deste amigo é a história que eu teria para aqui contar, vou transcrever o artigo (com a devida vénia) porque o autor "tirou-me as palavras da boca".
Afinal, não me acontece apenas a mim.
Por João José Brandão Ferreira
«Já plantei árvores, tenho filhos e escrevi livros. Posso pois, segundo um ditado popular, partir desta vida e passar a outra “dimensão”. Mas lamento já cá andar há 56 anos e não ver melhorar um rol de coisas extenso, que não pára de aumentar. E da melhoria das pequenas coisas se poderia partir para outras mais importantes. Foi desse modo que Nova Iorque se tornou, possivelmente, mais segura, hoje em dia, que Lisboa…
Livros escrevi cinco, mas só deste último consegui auferir, até hoje, alguns direitos de autor. O mundo editorial não foge à pandemia geral (essa sim, real), de desonestidade em que vivemos. Já fui vítima de algumas coisas que se tornaram corriqueiras: deslizamento temporal das promessas de pagamento; falências, quiçá fraudulentas; desaparecimento do mercado por fraude; e até um “não tenho dinheiro para lhe pagar, pois ninguém me paga, olhe só lhe posso pagar em livros…”.
Quando finalmente recebo uns assinaláveis 10% (!) pelo preço de venda de cada exemplar, sou informado que tenho que pagar 7,5% de IRS para os cofres da Fazenda Pública.
Usando de um pouco da ousadia que me prégaram nos bancos da escola militar, que frequentei, resolvi interrogar-me porquê?
Ou seja com que direito e porque bulas, as finanças – que na Idade Média só cobravam impostos depois de aprovados em Cortes onde estavam representados o Clero, a Nobreza e o Povo – se arroga o direito de me espoliar de 7,5% do meu trabalho a que pomposamente apelidam de “propriedade intelectual”?.
Vejamos, eu não sou profissional desse território; escrevi o livro nos meus tempos livres, não tendo para isso usufruído de nenhum “serviço” do Estado; usei papel, canetas, computador, net, consultei bibliotecas, comprei outros livros e mais um conjunto de consumíveis sobre os quais esse mesmo Estado já me cobrou impostos – para além de estar a contribuir para o PIB - dou trabalho à editora, à distribuidora e ajudo no negócio dos livreiros – ou seja estou a contribuir para o emprego de muita gente ; finalmente, dou o meu contributo para a cultura nacional – notem que até escrevo com pontuação e tudo! – e que fez o Estado? Pois o Estado vai-me esbulhar de 7,5% de uma pequena mais valia que obtive exclusivamente com a iniciativa e trabalho próprio. O Estado não me taxa, agride-me e tira-me, por completo, a vontade de com ele colaborar.
O Estado está assim a incorrer na falta em garantir a Justiça e o Bem-Estar dos cidadãos que é suposto servir, que, juntamente com a Segurança, são os três únicos desígnios para os quais existe e foi inventado.
Poder-se-á argumentar que este imposto contribui para o Bem Geral, mas essa tirada só faz ouvir o gargalhar mais longe e mais audível.
Nem os outros cidadãos têm o direito de usufruir de nada para o que não concorreram, nem eu me sinto no dever de tal partilhar, a não ser por deliberação própria.
Um Estado que esminfra quem trabalha, protege quem especula e subsidia quem não quer fazer nada (ou está preso!) além de privilegiar as cunhas de parentesco, “grupo” ou partidárias, é um estado de um país sem futuro, à beira dos maiores precipícios.
Não se acerta uma.»
28/6/2010
TCor/Pilav(Ref)
Copyright © Isabel A. Ferreira 2010
DUAS EXPERIÊNCIAS DE VENDA DE LIVROS EM ESCOLAS DO MEU PAÍS
Primeira Escola. Primeira vez. A meu pedido.
Lá fui eu com um saco cheio de livros: o «Manual de Civilidade» e «A História Fantástica de Pepino».
O local da venda era a Sala de Professores, e o período de venda era das 10 às 11 horas e 30 minutos, e da parte da tarde, a partir das 15 horas.
De manhã, durante o intervalo maior, alguns (poucos) professores ao entrarem na sala, mostraram-se interessados em ver e tocar nos livros que, para o efeito, havia pousado em cima da mesa grande, no meio da sala.
Desses poucos professores apenas alguns compraram livros. Vendi onze, no total, não necessariamente a onze professores, pois alguns (os que me conheciam) compraram um de cada. Desconhecidos, apenas dois professores se interessaram por adquirir os meus livros.
Até aqui, nada de especial, uma vez que não é obrigatório, depois de se tocar num livro, folheá-lo, considerá-lo interessante, comprá-lo depois.
Não é.
Porém, durante a tarde, quando regressei à escola, nenhum professor, à excepção de uma familiar minha, se dignou sequer ter a curiosidade de se chegar perto do canto da mesa, onde estavam os livros para, pelo menos, olhar para eles. Eram os professores do turno da tarde.
Nem sequer os mestres da Língua Portuguesa. Nem por mera curiosidade ou por amor a livros (fosse qual fosse o autor)... Nenhum se interessou.
Pensei: num país com uma percentagem ainda razoável de analfabetos, juntando aqueles que não o são, mas não se interessam por livros, ficamos com uma percentagem ainda maior de gente que não lê.
Os livreiros queixam-se de que os portugueses não lêem...
Pudera! Se nem os professores (nomeadamente os de Português) a quem também cabe incutir aos alunos o gosto pela leitura e pelos livros, se abeiram deles, para saberem, ao menos, do que tratam, nem por curiosidade... o que podemos esperar?
E isto foi o que mais me chocou nesta experiência. Não foi ter vendido apenas onze livros (o que aliás, já foi muito bom).
Contudo, há ainda uma outra nota curiosa, acerca desta minha deslocação a uma Escola do meu país, para vender os meus livros, em edição de autor, a professores.
Na sala, no meio da confusão: muitos professores, ao redor da mesa, à conversa... Eu sentada numa cadeira, à espera... quando zás! uma professora surripiou um «Manual» e saiu apressadamente, porta fora. Alguém que viu o acto, chamou-me a atenção.
Então pedi a esse alguém que pusesse os olhos nos meus livros, que eu tinha uma coisa a fazer...
Fui pelo corredor, a correr atrás da professora, que ia de passo apressado, até que a alcancei...
Interpelei-a: leva um livro meu e esqueceu-se de o pagar. Disse eu.
«Ai era para pagar? Eu pensei que era para pegar e levar...». Foi a resposta que me deu.
Pois não era para pegar e levar.
Devolveu-me o livro. Mas não pediu desculpa.
Quando me retirei daquela Escola, saí com um aperto no coração: que exemplo poderia dar aquela
professora aos seus alunos?...
***
Segunda Escola. Segunda vez.
Desta vez fui convidada pelo próprio Director, para ir à Escola mostrar a minha obra. E tudo foi previamente combinado. Ficaria o dia todo, e almoçava com o corpo docente, na Escola.
Aceitei, com agrado, como deve calcular-se.
Fui à Escola no dia previsto, à hora prevista, por volta das 10 horas. Perguntei pelo Professor “X” Presidente do Conselho Directivo. Ao que vinha? Vinha a seu convite, apresentar a minha obra literária.
«O senhor Presidente não está, nem deve vir hoje».
Como??? A recepção estava a ser da melhor.
Uma vez que me tinha deslocado até ali, fui conduzida até à sala dos Professores pelo funcionário que me atendeu. Só se algum deles souber de alguma coisa. Disse-me. Não sabiam. Mas deram-me um canto, onde havia uma mesinha. Se quisesse ficar ali...
Não sou de ficar... O primeiro pensamento foi o de sair dali o quanto antes. Porém, queria ver até onde iria esta história.
Fiquei, e armei a “minha tenda” ali mesmo, na mesinha, a um canto, na sala dos professores.
Entretanto, o funcionário foi chamar alguém do Conselho Directivo, um professor que me apresentou aos professores de Português.
Ninguém na Escola sabia desta minha deslocação.
Ah! Quem é? Uma escritora?! Sorrisos. Simpatia.
Ai sim? Muito prazer. Fique à vontade. Vou ali tomar um cafezinho e venho já ver os livros. Disse-me uma professora de Português.
Escusado será dizer que nunca mais apareceu, e o cafezinho tomava-se, ali, na mesma sala onde eu estava, a um canto.
Os outros, ao redor, nem sequer olharam para mim, nem para os livros que estavam em cima da mesinha.
Eram 11 horas e 15 minutos. Ainda ninguém havia se dignado “tocar” num livro sequer. Manuseá-lo. Ter a curiosidade de saber do que se tratava... O que estaria eu ali a fazer...? Uma estranha à escola!
Entretanto, uma professorinha, muito nova, trazia uns cartazes na mão, cheios de coraçõezinhos. No dia seguinte comemorava-se o Dia de São Valentim. E vá de colocar os cartazes em cima dos meus livros, enquanto foi tomar cafezinho. E nem reparou no que fez.
A indiferença era total. Absolutamente total.
A responsável pela Biblioteca da Escola, entretanto, foi avisada que eu ali estava. Veio ver-me. Ah! Sim, estava muito interessada em ficar com livros (mas nem sequer os viu). Sim, ia ver se havia dinheiro. E saiu.
O membro do Conselho Directivo aproximou-se novamente para me dizer que tinha de sair, ia ali e vinha já, meia hora... e viria ter comigo...
À minha volta, fazem-se preparativos para as comemorações do dia seguinte. Oito jovens, não sei s e professores, se alunos, aplicam-se a encher balões vermelhos, em forma de coração.
O dia estava lindo. Soalheiro. Quente. Apeteceu-me sair para o bosque que dali vislumbrava lá fora. O ar daquela sala sufocava-me.
Pensei então: não ficarei para a tarde. Mal regresse o Professor que ia ali e vinha já, e me comprem os livros para a Biblioteca, vou embora. Não estava ali a fazer nada.
Chegou o meio-dia.
Aleluia! Uma professora aproximou-se dos livros. Manuseou-os, leu algumas referências. Releu. Viu. Reviu. São para vender? Perguntou. Sim... São seus. Sim. Até que horas vai estar aqui? Perguntou. Até à hora do almoço. Respondi. Obrigada. Disse a professora.
Eu vi logo que o que tinha de acontecer ali, já acontecera, e acabava com aquele gentil «obrigada». Contudo, já fora alguma coisa!
Eram 12 horas e 10 minutos. O telefone que estava numa outra mesinha, à minha frente, tocou. Havia várias pessoas na sala. Mas ninguém atendeu. Novamente. O telefone tocou. Tocou. Tocou. Ninguém se mexeu.
E outra vez mais. Então, a funcionária do bar, que estava a servir cafezinhos e bolos, e não tinha mãos a medir, veio atender. Finalmente. Demasiado tarde. Ninguém no outro lado da linha.
Meio-dia e meia hora. Como nem o Professor, que ia ali e vinha já e a responsável pela Biblioteca, que ia ver se tinha dinheiro para comprar livro não vieram, comecei a levantar a minha “tenda”, entre vários professores que se encontravam na sala. Ninguém se manifestou.
Saí sem que ninguém tivesse dito sequer um “já vai tarde”...
Ia eu por um corredor, em busca da porta da saída, encontrei, por acaso, a responsável da Biblioteca, que ao ver-me, disse-me simplesmente: «Não podemos comprar livros porque não temos dinheiro». Tudo bem.
Com licença.
Dirigi-me para uma porta de vidro que dava para o pátio da entrada e lá ao fundo o grande portão, que estava ansiosa por atravessar, para me ver longe dali.
Foi então que vi um cartaz fixado no vidro da porta de saída, a anunciar a minha visita àquela escola, naquele dia...