Quinta-feira, 6 de Novembro de 2014

Dom João VI – Como um Príncipe Valente Enganou Napoleão e Salvou o Reino de Portugal e o Brasil (I Parte)

 

I Parte

 

Dom João VI – Como um Príncipe Valente Enganou Napoleão e Salvou o Reino de Portugal e o Brasil

 

(Contestação do livro «1808», de Laurentino Gomes)

(2ª edição corrigida e aumentada)

© Isabel A. Ferreira

 

(Este texto não pode ser reproduzido, no todo ou em parte, por qualquer processo mecânico, fotográfico, electrónico, ou por meio e gravação, nem ser introduzido numa base de dados. Difundido ou de qualquer forma copiado para uso público ou privado, além do uso legal como breve citação em artigos e críticas, s em a prévia autorização por escrito da autora)

 

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(Imagem © J. A. Ferreira)

 

A minha "Contestação" refuta o modo como a história de Dom João VI foi apresentada pelo jornalista brasileiro Laurentino Gomes, no seu livro «1808 – Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil», cuja narrativa amesquinha Portugal, a Monarquia Portuguesa e os Portugueses, e é excessivamente desprestigiante para Dom João VI que, apesar de não ter sido “talhado” para reinar, reinou o melhor que pôde, conservando a dinastia de Bragança e o império português, com dignidade, não se vergando ao grande e poderoso Napoleão Bonaparte, que subjugou praticamente todos os monarcas europeus da época - mas não Dom João VI, a quem o próprio Napoleão reconheceu tal mérito.

 

Escrevi uma nova versão intitulada «Dom João VI – Como um Príncipe Valente Enganou Napoleão e Salvou o Reino de Portugal e o Brasil (Contestação ao Livro «1808», de Laurentino Gomes…» o qual repõe o período da História narrado no «1808», integrando as circunstâncias dos acontecimentos históricos apresentados no contexto da época; analisa, sem preconceitos, as acções e consequências dos actos assinalados; e realça as virtudes da alma grande portuguesa, em contraponto ao que escreveu Laurentino Gomes.

 

Esta 2ª versão foi corrigida e aumentada no seu conteúdo, tendo sido acrescentadas notas marginais e a bibliografia consultada, e foi prefaciada pelo jurista brasileiro Arthur Virmond de Lacerda.

 

Para Laurentino Gomes, Dom João VI foi um rei covarde.

 

Para a autora desta «Contestação» e para muitos outros historiadores, Dom João VI foi um rei corajoso, que deixou uma obra notável no Brasil.

 

Ao ler-se o livro de Laurentino Gomes chega-se ao final com a ideia de que os Portugueses foram (e ainda são) Feios, Porcos, Maus e Ignorantes.

 

Os factos que Laurentino narrou, fora do seu contexto, soam a preconceito.

 

Logo, defender a Honra e a História de Portugal foi um dever que se impôs à autora.

 

***

 

DE COMO PORTUGAL TEM O DEVER DE DEFENDER A SUA HONRA E A SUA HISTÓRIA

 

PREFÁCIO

por Arthur Virmond de Lacerda Neto (***)

 

«Se há livros recomendáveis, que acrescentam informação, lucidez, reflexão e merecem leitura (e, freqüentemente, releitura) há, em contrapartida, maus livros, que disseminam inverdades, interpretações tendenciosas, fortalecem preconceitos e que merecem descrédito e esquecimento.

 

No primeiro caso acham-se as obras de historiadores como Rocha Pombo, Oliveira Lima, Afonso Taunay, Carlos Mendonça Lisboa, Jaime Cortesão, Jorge Couto e não só. No segundo, o livro "1808", de Laurentino Gomes.      

 

Publicou-se 1808 no ano de 2008, por ocasião do bicentenário do deslocamento da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, acontecimento que se recordou, no Brasil, nos meios de comunicação de massa e que, em alguma proporção, despertou a atenção do grande público para tal livro, que, rapidamente, obteve assinalável êxito de vendagem.    

 

Não terá sido, no entanto, a coincidência (certamente intencional) da efeméride com o tema e o título do livro a razão decisiva da sua propagação no Brasil: para tal efeito terão concorrido a condição de Laurentino Gomes de antigo diretor da revista Veja e as facilidades, disto decorrente, de divulgação, como, sobretudo, o seu enfoque tendencioso, o seu vezo lusófobo, a sua adjetivação fanfarrã, combinação de defeitos que o assemelham a certas telenovelas, que cativam a fidelidade do espectador graças ao insólito, ao emocional, ao artificial (caso contrário, desgraciosas, pouco atrairiam): lê-se 1808 como quem assiste a alguma telenovela escassa em arte e sôfrega de audiência.        

 

Assim é 1808: esteticamente mediano, destituído de graças que o distingam, ao mesmo tempo em que, pelo seu teor, constitui obra de lusofobia.   

 

Chama-se de lusofobia a animadversão, quando menos, a má vontade, presente em abundantes brasileiros, coevos e pretéritos, relativa a Portugal, à colonização do Brasil e à herança cultural portuguesa.       

 

Originária das paixões políticas que, ao tempo da independência do Brasil, opuseram brasileiros a portugueses; reavivada ao tempo do governo do marechal Floriano Peixoto, como elemento emocional que se mesclou a outras paixões políticas; reiterada pelo ensino de história do Brasil, dela resultou, no senso comum brasileiro, a espontaneidade com que se inculpa a colonização pelos males do Brasil, com que se desmerece a sua origem portuguesa, com que se lamenta não haver o Brasil sido colonizado por ingleses ou holandeses (inculpação, demérito e lamento injustos e que o escrutínio do passado brasileiro, empreendido por autores como Gilberto Freyre, Carlos Mendonça, Rocha Pombo, Mário Neme, permite desmentir).        

 

Neste contexto mental de verdadeiro preconceito é que se instalou 1808 e graças também a ele é que grassou como epidemia.         

 

Não se trata de mais um livro de história, dentre outros. Ele não ilumina com interpretações pioneiras, não esclarece com informações inéditas, não enriquece com percepções lúcidas, sequer informa com dados imparciais. Ele não é melhor do que outros.        

 

Ao contrário, ele constitui o pior da historiografia brasileira contemporânea: esforça-se por reiterar, esmiuçar, documentar o que, no Brasil, corre como lugar-comum antipático a D. João VI, a Dona Carlota Joaquina, ao deslocamento da corte, aos modos dos cortesãos no Rio de Janeiro, às mazelas da corte, ao sistema colonial, à herança portuguesa no Brasil.   

 

É perceptível a predileção de 1808 por dados selecionados para combinarem-se com o senso-comum lusófobo: é livro que diz o que as pessoas acham-se acostumadas a ouvir, sentido no qual, longe de esclarecer o grande público, de elevar o nível cultural do povo brasileiro, ele prestou-lhe o desserviço de corroborar-lhe um preconceito. 

 

Livros combatem-se com livros; os maus livros combatem-se com refutações, da parte dos autores e com leituras outras, da parte dos ledores. Era urgente que alguém denunciasse a parcialidade de 1808: a tal correspondeu a iniciativa oportuna de Isabel A. Ferreira, que lhe identificou os vícios mais flagrantes e contrapôs-lhes ponderações acertadas.       

 

A loucura de Dona Maria I, os méritos da sua governação; a argúcia de D. João VI ao haver-se com Napoleão; o feitio de D. João VI; a insistência em certa adjetivação; o mito de que a colonização do Brasil foi pior do que a de outros países colonizadores; o cotejo entre o Brasil e os Estados Unidos da América; a presença da escravidão; a sujidade do Rio de Janeiro; a governação de Portugal durante a estada de D. João VI no Rio de Janeiro; as circunstâncias em que se deram os fatos, constituem alguns dos pontos sobre os quais Isabel A. Ferreira exerce o contraponto.

 

Anti-1808, Dom João VI transcende a condição de mera refutação: ele demonstra que os livros de ampla divulgação nem sempre o são por mérito intelectual e que há medalhões que não o merecem ser; que D. João VI e a obra de Portugal no Brasil andam a ser objeto de juízos injustos, que corrige; patenteia a necessidade de compreensão das circunstâncias históricas como condição de compreensão dos respectivos atores; ensina o quão empobrecedor é o maniqueísmo na narrativa histórica.

 

Para se produzir obra minimamente credível, cumpre haver informações corretas e isenção: eis o que nos propicia Dom João VI, como ensinamento. Como conteúdo, transmite-nos ponderações e dados que é urgente popularizar no Brasil, em favor do esclarecimento do senso-comum, funestamente viciado por 1808».

 

Arthur Virmond de Lacerda Neto ***

9 de agosto de 2014

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(***) Arthur Virmond de Lacerda Neto nasceu em Curitiba, Brasil, em 1966. Formou-se em Direito pela Universidade Federal do Paraná; tem mestrado em História do Direito pela Universidade de Lisboa. É adepto do Positivismo de A. Comte, e autor de vários livros, tais como «Breve História das Codificações Jurídicas», «Dilema em Braga», «As Ouvidorias no Brasil Colonial» e «A República Positivista», publicados pela Juruá Editora. E também «A Desinformação Anti-Positivista no Brasil» e «Provocações», pela editora Vila do Príncipe. E ainda «Estudos de Direito Romano», «Novos Estudos de Direito Romano» e «Direito Penal Romano», pela JM Livraria Jurídica.

 

***

 

NOTA INTRODUTÓRIA

 

A presente crónica «DOM JOÃO VI – Como um Príncipe valente enganou Napoleão, e salvou o Reino de Portugal e do Brasil (Contestação ao livro «1808» de Laurentino Gomes» nasceu da indignação de ver o meu país amesquinhado no livro, apesar de tudo, interessante, «1808 – Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil», da autoria do muito ilustre jornalista brasileiro Laurentino Gomes.

 

Uma vez mais, Portugal e os Portugueses foram expostos ao ridículo, publicamente.

 

Basta!

 

Portugal é um país territorialmente pequeno, mas não deve deixar que o amesquinhem deste modo tão acintoso, porque a sua alma é grande. Um povo deve celebrar os valores do seu país mais do que gritar ao mundo as suas desvirtudes. Estas devem ser redimidas na intimidade da sua auto-estima.

 

E porque tudo vale a pena quando a alma não é pequena (citando Fernando Pessoa), este pretende ser o meu contributo no sentido de resgatar o bom-nome de Portugal, que foi vilipendiado por Laurentino Gomes.

 

Todos os povos têm virtudes e defeitos. Portugal não foge à regra. Contudo, o maior defeito do povo Português é o de não acreditar nas suas virtudes, e encolher-se perante os juízos menores que dele fazem os que desconhecem a grandeza do seu percurso histórico, e de como sempre conseguiu manter-se na corda bamba, sem nunca perder completamente o equilíbrio.

 

E isso não é coisa pouca!

 

São essas virtudes que pretendo realçar nesta crónica.

 

Isabel A. Ferreira

Dezembro de 2011

 

***

1

 

DE COMO DOM JOÃO, PRÍNCIPE REGENTE DE PORTUGAL, TEVE A CORAGEM DE NÃO SE VERGAR AOS PÉS DE NAPOLEÃO BONAPARTE

 

Começo com duas citações de José Ortega y Gasset (1883-1995) – filósofo espanhol, activista político e jornalista, que muito prezo:

 

«O homem é o homem e as suas circunstâncias».

 

«Debaixo de toda a vida contemporânea encontra-se latente uma injustiça».

 

Sigo com duas asserções e um comentário sobre História:

 

Um livro que foque factos históricos deve ser concebido como se estivesse a ser escrito para pessoas que nada sabem de História.

 

Há fontes fiáveis e fontes não fiáveis. Há fontes fidedignas e fontes não fidedignas. Há fontes imparciais e fontes altamente facciosas. Palavras certas para descreverem realidades, e palavras obscuras para dizerem dos preconceitos. Aos cronistas cabe seleccioná-las com imparcialidade criteriosa – às fontes e às palavras.

 

A História é a ciência que estuda o Homem em toda a sua plenitude.

 

O Homem do passado, o Homem do presente, e, devido a um específico processo empírico e métodos dedutivos, pode até prever o que será o Homem do futuro. A História estuda a evolução do Homem como um ser animal (Antropologia Física); a evolução do Homem como um ser que constrói, um ser que pensa, um ser que produz cultura, mas também como um ser que destrói, irracionalmente, o que constrói (Antropologia Cultural); estuda igualmente a evolução do Homem como um ser que vive em sociedade, com as suas instituições sociais, políticas, económicas e religiosas (Antropologia Social).

 

Tudo isto é História. Qual o seu valor? Um valor positivo. Qual o seu método? Um método de relação de factos, de dedução por experiência; um método de verificação, análise e selecção racionais de documentos escritos e artísticos. Qual o seu interesse? O interesse para o conhecimento mais aprofundado do Homem e da sua obra; o de querer saber de onde veio o Homem, quem é o Homem, para onde vai o Homem.

 

A História é o Homem. O Homem é a História. Ambos estão relacionados e não podem separar-se. O Homem sem História não existe, e a História sem o Homem não tem qualquer sentido prático.

 

O rumo do Mundo, o rumo da História é coisa do Homem, mas também da Natureza de que o Mundo é feito.

***

Ao ler o subtítulo do livro «1808», de Laurentino Gomes, ocorreu-me que não devia calar-me, uma vez que as palavras “louca”, “medroso” e “corrupta” adjetivando “rainha”, “príncipe” e “corte” feriram a minha sensibilidade, não só de cidadã portuguesa, mas também a de simples leitora, além de, evidentemente, considerá-las demasiado desprestigiantes para Portugal, assim, fora do seu contexto.

 

Dona Maria I seria “louca”? Sim, talvez! Não se encontrava na posse das suas faculdades mentais, por ocasião dos factos relatados. O príncipe Dom João era “medroso”? Sim, talvez! Mas como não ser medroso, se todo o homem, por natureza, ainda que não o admita, é medroso? O medo é um sentimento básico, comum a todos os animais, quer sejam humanos ou não humanos. Mas seria Dom João VI, de facto, medroso? Vamos provar que não. A corte era “corrupta”? Sim, talvez! Mas não mais corrupta do que, por exemplo, a espampanante, luxuosa e elegante corte de Versalhes. Uma tal corte necessitava de muito dinheiro para se manter. E quem a mantinha? Naturalmente o povo, com os seus impostos, tal como ainda hoje acontece em todos os países do mundo. Certamente, Luís XVI e Maria Antonieta não foram guilhotinados devido a uma governação criteriosa.

 

A corrupção sempre foi um mal de todas as épocas, de todas as cortes, de todos os reinos, de todas as governações, desde o dia em que o homem descobriu que se acumulasse riquezas tornar-se-ia todo-poderoso.

 

Temos, portanto, de situar a “loucura” da Rainha, o “medo” do Príncipe e a “corrupção” da corte, dentro das circunstâncias temporais e individuais, e não apresentá-las, como as apresentou Laurentino Gomes, assim, cruamente, como se esses epítetos fossem exclusivos dos Portugueses, nomeadamente daqueles Portugueses.

 

Como se sabe, a “loucura” da Rainha foi provocada por uma perturbação mental, oriunda das muitas amarguras que Dona Maria sofreu ao longo da sua vida privada e pública. Num período de sete anos, ela viu morrer a sua mãe, o marido (Dom Pedro III) e o filho (Dom José, herdeiro do trono); também a afectou sobremaneira a violência da Revolução Francesa, que conduziu à decapitação de Luís XVI e de Maria Antonieta. Aqui, o medo latente, de poder vir a acontecer-lhe o mesmo, perturbou-a. Ela também era Rainha. Os ecos da Revolução Francesa andavam no ar. Tudo poderia acontecer, se o povo se amotinasse. Não foi coisa pouca para uma mulher sensível, que ficou para a História com o cognome de a “Piedosa”, e que no livro de Laurentino Gomes é tratada simplesmente como a “louca”.

 

Contudo, antes de enlouquecer, Dona Maria foi uma princesa, bondosa e devota, foi Rainha, foi mãe, foi mulher, casada com Dom Pedro III, seu tio (que teve o título e honras de rei). Eram muito afeiçoados um ao outro, e viveram no Palácio de Queluz, cercados de sumptuosidade. Sim.

 

Subiu ao trono em 1777, a 13 de Maio (dia do nascimento de Dom João VI, em 1767) e também o dia em que Dom Duarte Pio de Bragança, actual Chefe da Casa Real Portuguesa, se casou com Dona Isabel de Herédia.

 

Em 1792, tiveram início os primeiros sintomas da doença mental que viria a afectá-la. Foi por essa altura que o Príncipe Dom João começou então a governar. Porém, apenas em 1799, Dona Maria I foi afastada da governação, por se ter perdido a esperança na sua recuperação, e Dom João toma então o título de Regente.

 

Dona Maria recebeu uma educação refinada; desde muito nova mostrou-se interessada pelos estudos, e dedicou grande parte do seu tempo à música, ao canto e à pintura. Era extremamente devota, e tinha um temperamento tão afável como nostálgico.

 

Foi afastada das questões políticas, ainda durante o reinado de seu pai, Dom José I, pelo Marquês de Pombal, por isso, quando subiu ao trono, o seu saber acerca dos assuntos de Estado não seriam excepcionais, contudo, Dona Maria sempre se manteve atenta ao que a rodeava, o que lhe permitiu pôr em prática uma governação, onde se equilibraram o bom senso e uma lucidez, nada fazendo prever a deterioração da sua saúde mental.

 

Frei Inácio de São Caetano, arcebispo de Tessalónica, homem de uma integridade admirável, foi seu confessor, exercendo no seu delicado espírito de mulher, uma influência misericordiosa. Enquanto este arcebispo viveu, usou dessa sua influência pacífica para acalmar os temores da rainha e serenar-lhe o seu desassossego.

 

Todavia, quando este morreu, em 1788, desafortunadamente o confessor que lhe sucedeu, o bispo do Algarve, Dom José Maria de Melo, era um fanático desmedido, e de tal modo destituído de bom senso que, astuciosamente, aterrorizava a Rainha, acenando-lhe com o crime que estaria a cometer ao não reabilitar o nome dos Távora, ou se não fizesse regressar ao país os jesuítas, que o Marquês de Pombal havia expulsado, em 1759, de todo o território português, terrores que poderiam ter contribuído para agravar o estado de saúde mental de Dona Maria.

 

Foi por essa altura que, com o regresso do estrangeiro de um exilado do tempo de Dom José I, Dom João Carlos de Bragança, 2º duque de Lafões, de espírito aberto e iluminado, juntando-se na governação a Luís Pinto de Sousa Coutinho, um homem que viveu em Londres durante longos anos, adquirindo o gosto pelo progresso, e ainda a Pereira Ramos, o procurador da coroa, considerado um homem de carácter íntegro, começaram a surgir algumas fundações de estabelecimentos de ciência e instrução, comércio e indústria, que muito dignificaram o reinado de Dona Maria I.

 

Entre elas contam-se a Real Academia das Ciências; a Escola de Belas-Artes; a Academia de Marinha; a Academia de Fortificação; a Casa Pia de Lisboa; e a Biblioteca Pública. Fundou ainda a Cordoaria Nacional, situada na zona de Belém, em Lisboa, a qual fabricava as cordas de sisal que equipavam as naus portuguesas; criou a Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação com o objectivo de aumentar a produção nacional e desenvolver estes sectores da economia; criou ainda a Junta do Proto-Medicato, para uma política de auxílio médico ao país; apoiou a Academia do Nu; e a Real Fábrica das Sedas, igualada às melhores da Europa.

 

Devido à sua singular religiosidade, o seu nome ficou ligado à edificação da grandiosa Basílica do Coração de Jesus, de que era muito devota, erguida no lugar da Estrela, e riquíssima em arte, a qual a Rainha doou às irmãs carmelitas da reforma de Santa Teresa, que tomaram posse dela em 1790.

 

Fundou ainda a Igreja da Memória, na Ajuda, no local onde se deu o trágico atentado dos Távora contra o seu pai, em Setembro de 1755, a pedido do próprio Dom José, no seu leito de morte.

 

A bondosa Rainha sempre incentivou a criação destas obras, sobretudo quando tinham um propósito caritativo.

 

Durante o seu reinado promoveram-se igualmente as viagens e as explorações científicas de Alexandre Rodrigues Ferreira, ao Brasil; de Manuel Galvão da Silva, a Moçambique; de Frei João de Sousa, a Argel; de Ferreira Gordo, a Madrid; e de José Bonifácio pela Europa.

 

Foi também no reinado de Dona Maria I que se iniciaram os trabalhos geodésicos.

 

Foram melhorados os serviços da Marinha, tendo o ministro da Marinha, Martinho de Melo e Castro, desenvolvido substancialmente a esquadra portuguesa, que chegou a contar 71 navios, havendo entre eles 12 naus, o que contribuiu para que a Marinha Portuguesa se tivesse destacado ao lado da esquadra espanhola, no célebre bombardeamento de Trípoli.

 

A actividade legislativa, sobretudo no que respeita à gestão económica, foi fecunda, durante os 15 anos de reinado de Dona Maria I, com o desenvolvimento de novas manufacturas; a assinatura, em 1789, de um tratado de amizade, navegação e comércio com a Rússia, que beneficiou sobremaneira o nosso comércio, sobretudo o dos produtos que vinham das colónias; e um aumento significativo da exportação de Vinho do Porto, entre 1788 e 1797. Foi no seu reinado que, pela primeira vez, desde 1740 a balança comercial com a Inglaterra nos foi favorável.

 

Quanto à Cultura, sendo a Rainha dada aos estudos, não descurou este sector, tendo-lhe dado um grande impulso.

 

Tudo isto aconteceu, obviamente, tendo em conta algumas circunstâncias, tais como a insurreição das colónias norte-americanas e a Guerra da Independência que dificultaram a expansão do tráfico britânico; e a Revolução Francesa, a qual debilitou o domínio marítimo da França e da Holanda, e tais conjunturas contribuíram para que o comércio português tivesse a oportunidade de aumentar consideravelmente, pela rota do Cabo.

 

Portanto, dito assim, cruamente, “rainha louca”, fica-se com a sensação que Dona Maria sempre foi louca, e reinou “louca”, de uma loucura do género da de Hitler, esse sim, um louco, dos verdadeiros, que muitos outros loucos colocaram na governação e apoiaram durante todo o tempo em que durou a sua loucura. Pelo menos, Dona Maria I estava retirada da vida pública, e não impôs a sua perturbação mental ao seu povo, tendo sido então nomeado como Regente do Reino seu filho Dom João.

 

O Príncipe Dom João seria realmente “medroso”, no sentido pejorativo da palavra, como aparece no livro de Laurentino Gomes, com uma despropositada frequência? Só o facto de ter sido o único monarca a enganar Napoleão Bonaparte, o todo-poderoso Imperador da Europa e arredores, já é um feito extraordinário. Todos os outros reis foram submissos e vergaram-se aos caprichos do general. O Príncipe Regente Dom João não só não se prostrou aos pés de Napoleão, como conseguiu acautelar o grande território brasileiro, alvo da cobiça dos Ingleses, dos Franceses, dos Espanhóis, dos Holandeses, aventurando-se (embora provavelmente morrendo de um medo instintivo) mar adentro, mais a sua corte e o seu governo. Que outro soberano o fez, naqueles tempos, quando atravessar os oceanos era aventura apenas para marinheiros muito destemidos?

 

Penso que isto não é atitude de um “medroso”, mas de alguém que, apesar do medo que tal aventura lhe apresentava, teve a coragem suficiente para partir, salvando desse modo o seu reino de Portugal e dos Algarves, d’Aquém e d’Além-mar, e também a colónia do Brasil, mas preservou principalmente a sua dignidade e a da Corte, não tendo de rastejar aos pés de Napoleão, como o fizeram outros monarcas europeus. Certamente com o sacrifício do bom povo português que, apesar de empobrecido e atormentado pela retirada estratégica da corte para o Brasil, conseguiu, à custa de muita coragem, de muito sacrifício e de muita astúcia, escorraçar os grandes generais de Napoleão, que invadiram o território português: Junot (em 1807); Soult (em 1809); e finalmente Massena (em 1810).

 

Entretanto, aconteceu o que se sabe: o grande Napoleão perdeu o seu prestígio e o seu poder, foi derrotado na batalha de Waterloo, e deportado depois para Santa Helena (ironicamente uma ilha descoberta pelos Portugueses, mais tarde tomada pelos Ingleses), onde acaba por morrer sem glória, provavelmente envenenado.

 

E no entanto, quanta emoção, quando me vi diante do fabuloso túmulo de Napoleão, na l’Eglise Royale des Invalides! Quanto assombro, perante o que dizem ser o seu famoso cavalo branco, embalsamado! Que sensação ao ver a réplica do quarto onde Napoleão morreu, ao visitar o museu da École Militaire!

 

Quanto a Dom João, este, em 1822, regressa a Portugal, ao seu reino, ao seu povo, não propriamente cheio de glória, mas enfim, como Rei de um Portugal ainda em pé, e que se mantém até aos dias de hoje, graças a um monarca que, num passado longínquo, teve a coragem de “segurar” o reino, utilizando uma estratégia notável.

 

Napoleão, Júlio César, Alexandre Magno, os grandes guerreiros da História do Mundo, ou mesmo os pequenos guerreiros, não sentiriam medo, quando faziam as guerras? Um homem não tremerá diante de um canhão prestes a disparar contra si, ou diante de um vulcão em erupção?

 

Em 1992, tive uma metralhadora apontada para o meu nariz, num auto-stop, na Irlanda do Norte, e posso garantir que não é nada interessante. Embora morrendo de medo, reagi sorrindo para o soldado (ou terrorista, dependendo do ponto de vista) do IRA (Irish Republican Army), que mantinha a arma apontada para mim. Talvez o sorriso ajudasse. Não sei! Ele acabou por mandar-nos seguir. Eu ia acompanhada por um “segurança”, um homem, que ficou branco como uma parede caiada.

 

Uma coisa é ter medo, e outra coisa é ser covarde. Dom João podia “morrer” de medo de determinadas coisas (ele era um homem comum, um ser mortal, um ser humano) mas isso não o impediu de ir aonde devia ir, ou de fazer o que devia fazer. E a isso eu chamo coragem. Durante os meus vinte anos de jornalismo vi-me envolvida em trabalhos onde o medo foi uma presença angustiante, mas não deixei de os fazer (o caso de drogas, assassinatos, roubos, corrupção). Morria de medo, mas ia. Morria de medo, mas escrevia. Expunha-me. E expus-me ao ponto de, um dia, ser escorraçada do meu trabalho, devido à interferência de uns determinados governantes, que se sentiram ameaçados por uma investigação que eu andava a fazer, e que iria comprometê-los. Isto é ser medroso? Não me parece. Morri de medo do IRA, mas fui à Irlanda do Norte, fazer o trabalho que tinha de fazer. Apenas quando regressei ao meu pacato país, soube que durante todo o tempo em que permaneci em Belfast, fui escoltada por elementos do IRA. Sim, sou mulher, mas o medo dos homens não há-de ser diferente do medo das mulheres.

 

Quando se tem pela frente uma arma, medo é medo.

 

Além disso, é preciso ter em conta uma outra circunstância: os medos não instintivos, geralmente geram-se na infância. Os príncipes eram meninos como os outros, tinham os seus medos, as suas ansiedades, com uma diferença: os outros, sentindo medo, corriam para os colos das mães. Os príncipes, para os colos das amas, e embora as amas, na sua maioria, não fossem megeras, amas são amas. Mãe é mãe. Nessa época ainda não se tinha descoberto a psicoterapia, e os príncipes, mais dados ao medo, cresciam ao Deus dará, e tornavam-se homens inseguros. Algo perfeitamente compreensível, hoje, à luz da Psicologia. Se percorrermos a história da realeza europeia (ou de qualquer outra parte do mundo), encontramos muitos casos de reis e de rainhas com medos, com cismas, com perturbações mentais, e que, ainda assim, “governaram” os seus reinos, se bem que à custa do sofrimento do povo.

 

Portanto, se Dom João tinha os seus medos, era como os outros. E quem nunca sentiu medo que atire a primeira pedra.

 

Quanto à corrupção da corte, todas as cortes europeias da época de Dom João VI, ou as mais antigas ou as posteriores, umas mais do que outras, possuíam meandros, aqui e ali, de alta corrupção. Não era apenas a corte portuguesa que era corrupta. Por vezes os reis até eram grandes reis, mas os seus ministros, os seus conselheiros, uns intriguistas e corruptos de primeira espécie. E isso provocava grandes equívocos, porque os homens têm a tendência para tomarem o todo pelas partes. Um erro muito frequente e fatal, no fazer da História.

 

No livro «1808», o modo como se expõe o assunto da corrupção, dá a entender que só a corte portuguesa é que era corrupta. Pergunto: qual o governo político daquela época, anterior ou actual que não tenha o seu “quê” de corrupto?

 

Laurentino Gomes, que denomina o Brasil de colónia extractivista, esqueceu-se de que todas as outras colónias dos outros colonizadores foram-no de igual modo, e facto bastante relevante e sempre esquecido, as colónias de então eram território legítimo dos colonizadores, escreveu um livro que é simplesmente uma caricatura de Dom João VI, de Dona Carlota Joaquina, de Dona Maria I, e dos Portugueses.

 

Nessa altura, na Espanha, o trio Carlos IV, Maria Luísa e o ministro Godoy era o cúmulo da inépcia e da má-fé, a ele se juntando o Príncipe Fernando, (o que viria a ser o VII), um príncipe rebelde, tímido e irresoluto.

 

De outros reis diz-se que eram velhos obtusos e teimosos, fanaticamente devotos, dominados por mulheres também devotas, autoritárias e de carácter azedo.

 

Outros reis foram adversos à entrada de ideias liberais nos seus países, como Nicolau I da Rússia.

 

Pela América andaram também os Ingleses, os Franceses, os Holandeses, os Espanhóis a caçar riquezas e o império colonial espanhol era um dos maiores do mundo.

 

Disso não fala Laurentino Gomes.

 

Confúcio, notável filósofo chinês, diz que saber o que é certo e não o fazer é a maior covardia. Ora Dom João, soube o que era certo e fê-lo. Logo, não foi o covarde que Laurentino Gomes tanto proclama no seu livro.

 

Dom João VI, cognominado de o “Clemente”, era o que chamamos um paz de alma. Gostava dos seus franguinhos assados, talvez gostasse do dolce fare niente, e não era ele que deveria ter sido rei. Não foi preparado para tal. Na corte portuguesa, tal como em todas as outras cortes do mundo, o Príncipe destinado a ser rei era educado diferentemente dos outros príncipes. Posso dar como exemplo, o nosso Rei Dom Dinis. Dom Afonso III, seu pai, deu uma primorosa e cuidada educação ao Príncipe Dom Dinis, futuro Rei de Portugal, e para tal contratou grandes mestres e sábios, como o português Domingos Jardo e o francês Américo de Ebrard.

 

Dom Dinis (1261-1325) não só apreciava Literatura, como foi, ele próprio, um poeta extraordinário e um dos maiores e mais inventivos trovadores do seu tempo. Deixou-nos «139 cantigas, a maioria de amor, de um imenso lirismo, mostrando elevado domínio técnico, tendo reavivado a cultura numa época em que ela havia entrado em declínio em terras ibéricas» (estas terras ibéricas são Portugal e Espanha).

 

Dom Dinis foi um rei relevante para Portugal, não só pelas suas realizações culturais, com a fundação da Universidade de Lisboa, depois transferida para Coimbra, e com a aplicação do uso da Língua Portuguesa, mandando redigir os documentos em Português e não em Latim, como até aí era usual; mas também e principalmente por ter impulsionado a agricultura, ordenando a drenagem de pântanos, a plantação de florestas (como o ainda hoje famoso pinhal de Leiria); por ter iniciado uma reforma agrária; e igualmente por ter activado a economia, estimulando o comércio interno e externo, e a política, apaziguando a Igreja com a Concordata de 1290.

 

Isto foi apenas um aparte para salientar que Portugal foi um reino de grandes reis, um ou outro mais fracote, admito, mas sem eles nós hoje não existiríamos como povo autónomo; seríamos apenas mais uma província da vizinha e gigantesca Espanha. Por isso, não devemos renegar o nosso passado, nem menosprezar o que os que vieram antes de nós fizeram, no sentido de preservar a nossa independência, a nossa Cultura, a nossa Língua. A herança portuguesa no mundo é imensurável e digna de qualquer país que se preze. E como em todos, incluindo o Brasil, há coisas muito boas e coisas muito más. Dependendo de quem nos governa, ora somos grandes, ora somos pequenos.

***

2

 

DE COMO OS FACTOS HISTÓRICOS FORAM “DESVIADOS”

 

Poderei ter uma explicação para o “desvio” da apresentação dos factos já referidos, descritos no livro «1808», baseada na minha experiência como aluna, em escolas brasileiras: é que o colonizado tem uma certa tendência para rejeitar o colonizador. Neste caso, os Brasileiros, melhor dizendo, alguns Brasileiros (pois nem todos têm esse complexo, talvez possa dizer mesmo os menos cultos) tendem, ainda hoje, para menosprezar a cultura do colonizador português. E sonham: Ah! Se em vez de os Portugueses, o Brasil tivesse sido descoberto por Ingleses, ou Franceses, ou Espanhóis, ou Holandeses seria um grande país! Os Portugueses permitiram-lhe ser apenas um país grande.

 

E nada mais desacertado do que isto.

 

Enquanto estudei no Brasil, tive de sair para a arena em defesa de Portugal e da Cultura Portuguesa, em várias ocasiões (inclusive na Faculdade, onde os professores tinham obrigação de não brincar com coisas sérias), porque ouvia autênticos disparates quando se abordava a História de Portugal relacionada com o Brasil. Cheguei a ouvir um professor de Geografia Económica dizer que a Península Ibérica (Espanha e Portugal) não pertencia à Europa civilizada, mas sim à África inculta. O professor (descendente de italianos) chegou a desenhar no quadro um “quadrado” (com toda a carga pejorativa que o termo quadrado tem no Brasil) afastado da Europa e ligado à África.

O estreito de Gibraltar separaria não a Europa da África, mas a Península Ibérica da França. Evidentemente, pensei logo que aquilo era uma brincadeira de muito mau gosto, mas como vi que o professor ia continuar a aula sem retroceder naquela sua recreação, tive de me levantar e dizer à turma que o professor estava a deturpar a verdade. Também ficou claro que, daí em diante, as minhas notas a Geografia desceram bastante. Mas o que vale uma nota mais baixa, diante da defesa dos valores em que acreditamos, e, neste caso, da verdade geográfica?

 

É preciso conhecer a História de Portugal e do Brasil, interligada à História dos outros povos para desmontar todos estes equívocos e más vontades, encontrados no livro «1808».

 

Nós, Portugueses, somos fruto de uma miscelânea de povos que começou com as invasões dos Iberos e a seguir dos Celtas, a uma Península já habitada desde os tempos pré-históricos. Dos Celtiberos descendeu o povo Lusitano, aguerrido e valente, que habitava a Lusitânia. Depois vieram os Fenícios, os Gregos e os Cartagineses. A estes seguiram-se os Romanos, os Vândalos, os Suevos e os Alanos; por último vieram os Visigodos e os Muçulmanos (ou Sarracenos, Árabes, Maometanos ou Mouros).

 

O povo português, aquele que «navegou por mares nunca dantes navegados» e «deu novos mundos ao mundo», (como cantou Luís de Camões, no seu grande poema épico «Os Lusíadas») – entre esses mundos, o Brasil – descende de todos os povos aqui referidos. De todos eles recebeu saberes, sabores e dizeres, por isso, a Cultura Portuguesa e a Língua Portuguesa são tão ricas, tão diversificadas, tão cheias de colorido. Tão proveitosas. Incluindo nessa Cultura, a gastronomia, o folclore, as lendas… Quem não conhece as lendas de Portugal, não pode dizer-se culto!

 

Tivemos grandes reis, grandes guerreiros, grandes descobridores, gente brava, audaciosa. Grandes poetas, grandes escritores, grandes artistas. Conseguimos acautelar um minúsculo rectângulo de terra, para dele fazer um reino. E esse reino pequeno, apesar de pequeno, fez-se grande. Nunca temendo os grandes, igualou-se aos grandes, no que de bom e de mau todos fizeram, sem excepção, numa época marcada pelo descobrimento de novas rotas para chegar a terras longínquas. E isto, o Mundo deve-o aos Portugueses.

 

Em todas as Histórias, de todos os povos, em todos os tempos, sempre houve conquistadores e conquistados. Parece ser da natureza dos homens não se contentarem com o que têm, ou terem pouco, para poderem contentar-se. Então uns invadem as terras dos outros, conquistam reinos, subjugam povos, violam as suas mulheres, pilham as suas riquezas, para se dizerem imperadores de muitos reinos (como foi o caso de Napoleão, entre muitos outros “Napoleões” do mundo). Outros, vão à conquista de novas terras por serem pequenos, e por não haver sustento para tantas bocas (foi o caso dos Portugueses).

 

Encravados entre o oceano imenso e a gigantesca e poderosa Espanha, que sempre cobiçou o nosso pequeno território, connosco mantendo guerras sem conta, os Portugueses viram-se, a certa altura da sua História, obrigados pelas circunstâncias, a fazerem-se ao mar, porque essa era a sua única saída. A falta de recursos obrigou o povo a procurar outras paragens, tal como ainda hoje acontece. Vemos migrações de povos buscando melhores condições de vida noutros países. Sempre foi assim. Esperemos que um dia essa necessidade deixe de existir, e que todos os povos possam bastar-se a si próprios.

 

E, desse modo, nasceu o Reino de Portugal, do Brasil e dos Algarves, d’Aquém e d’Além-mar em África, Guiné, e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia. E se mais mundo houvesse, os Portugueses, e mais ninguém, o achariam…

 

Enfim, isto não é coisa pouca, para um pequeno país.

 

Daí que, no meu entender, a humilhação de que Portugal é alvo no livro «1808» comece logo pelo subtítulo, que poderia ter sido redigido de um modo mais cortês, não fugindo à verdade: De como uma rainha mentalmente perturbada, que já não reinava, um príncipe tímido, mas astucioso, e uma corte desacreditada, mas pertinaz, enganaram Napoleão e mudaram o rumo da História de Portugal e do Brasil.

 

© Isabel A. Ferreira

(Continua) 

 

(II Parte)

http://arcodealmedina.blogs.sapo.pt/dom-joao-vi-como-um-principe-valente-485454

 

(III Parte)

http://arcodealmedina.blogs.sapo.pt/contestacao-ao-livro-1808-de-laurentino-487321

 

(IV Parte)

http://arcodealmedina.blogs.sapo.pt/dom-joao-vi-como-um-principe-valente-489691

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 18:20

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Comentários:
De Manuel Cabral a 16 de Fevereiro de 2015 às 14:45
Comentários? Apenas um: Obrigado!
De Isabel A. Ferreira a 16 de Fevereiro de 2015 às 18:32
Obrigada, Manuel Cabral.
De Manuel Cabral a 18 de Fevereiro de 2015 às 00:00
Isabel,
Na verdade conheço essa questão muito bem, já que vivo no Brasil desde 2002, e senti essa aversão ao português - com origem especialmente nas camadas menos cultas - na carne.
Um pequeno exemplo, que se encaixa bem no contexto, passou-se com um sobrinho meu.
Estou no Brasil desde 2002, casei aqui com uma brasileira que tem um sobrinho adolescente.
Naturalmente o rapaz fez referência na escola ao facto da sua tia ter casado com um português, o que serviu de pretexto para uma aula extraordinária de história, em que o ilustre professor apontou os portugueses como causa de todos os males, nomeadamente do morticínio dos índios...
Por isso ter sentido necessidade de lhe agradecer...
Abraço
De Isabel A. Ferreira a 18 de Fevereiro de 2015 às 10:15
Sei o que isso é, Manuel Cabral, porque já passei pelo mesmo, quando estudei no Brasil, e vi-me obrigada a colocar o professor, literalmente, no "lugar dele". Ele era descendente de italianos, ministrava a disciplina de Geografia Económica. E nada sabia sobre Portugal. Tive de lhe dar uma "lição".

Realmente é triste dizer, porque considero o Brasil a minha segunda Pátria, uma vez que aí vivi e aprendi a ler e a escrever (o que depois me obrigou a reaprender a Língua), mas uma demolidora ignorância envolve o ensino brasileiro, que não forma cidadãos para a cultura. Mas tão-somente para a mais profunda incultura.

Por isso, temos o DEVER de os ensinar a História deles próprios.

E não precisa de agradecer. Cumpri o meu DEVER CÍVICO ao escrever este livro.
De Anónimo a 18 de Fevereiro de 2015 às 19:44
Comentário apagado.
De Isabel A. Ferreira a 19 de Fevereiro de 2015 às 09:43
É exactamente isso que destaco neste meu livro, Carlos Gomes.

Lamento que no Brasil (onde iniciei os meus estudos de História, na Universidade Gama Filho) ensinem esta disciplina com o preconceito do colonizado mal informado, cheio de erros, cheio de rancores, cheio de mentiras.

A D. João VI se deve o salto para um Brasil mais civilizado, e devemos a nossa independência como País. Se não fosse ele, hoje seríamos uma região de Espanha.

E já agora, se tiver tempo e paciência, tente ler a II, III e IV partes do texto.

O lobby editorial é bastante "poderoso" e estou com dificuldades em publicar o livro. Daí o ter disponibilizado na Internet.

Obrigada.

De José Verdasca a 2 de Julho de 2015 às 21:00
Eata leitura é para todos quantos - despidos de preconceitos - desejam sinceramente aprender HISTÓRIA, de verdade, séria, instrutiva

Entretanto, quem apenas desejar ler ESTÓRIAS da carochinha, pode deliciar-se com alguns capítulos e ou passagens de "1808" e "1822", livros que - apesar de tudo - inserem algumas verdades. Afinal, só a inverdade é condenável´
j.verdasca@uol.com.br
De Isabel A. Ferreira a 6 de Julho de 2015 às 18:11
Obrigada, caro amigo José Verdasca.

A História (gloriosa) do Brasil não pode ser contada sem a História (também gloriosa) de Portugal.

E é isso que falha no ensino da História, nas escolas brasileiras.

Nos livros do Laurentino Gomes, então, nem se fala... A História do Brasil é contada virada do avesso.

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