Será natural o homem desperdiçar o seu tempo, o seu engenho e arte e os seus recursos com coisas que servem apenas para o destruir a si e ao mundo que o rodeia?
Quanto mais civilizado é o Homem, menos precisa de leis
No início do mundo, no tempo em que o Homem desconhecia o caos, não havia leis. A ordem existia naturalmente. O Homem vivia em comunidade, com interesses comuns. A vida não era fácil. O maior problema era sobreviver, e só a união de esforços mantinha as sociedades vivas.
Todos trabalhavam para o mesmo fim. Todos eram iguais dentro da mesma caverna. Repartiam a caça, aqueciam-se ao redor do mesmo fogo, e porque não havia televisão, nem computadores, nem Internet, tiveram tempo para inventar a fala, muito útil à comunicação entre uns e outros, o que lhes permitiu o desenvolvimento da civilização e da cultura.
As coisas, porém, foram-se complicando. No início o Homem era nómada. Seguia o percurso da caça, para poder sobreviver. Um dia fixou-se. Tornou-se sedentário. Começou a cultivar a terra, a domesticar animais, e caiu na tentação de escravizar também outros homens, o que lhe facilitava a acumulação de riquezas, e quando tal aconteceu, foram precisas as tais leis, para pôr ordem nas coisas.
Começava assim a era da incivilização.
O homem deixou de seguir a Lei Natural, a única que entre o Homem devia vigorar por ser da condição humana e, a partir daí, passou a legislar à medida das suas fraquezas.
Contudo, eu não roubo, não porque existe uma lei que mo proíbe, mas porque sou um ser civilizado, e não roubo.
Não mato o meu vizinho, ainda que ele seja má pessoa, não porque existe uma lei que mo proíbe, mas porque sou um ser civilizado, e não mato.
Não maltrato um animal, não pico um touro, não abandono um cão, não porque existem os Direitos dos Animais que me aconselham a não o fazer, mas porque sou um ser civilizado, não maltrato outro ser que comigo partilha o mesmo planeta e tem direito à vida, tal como eu.
Esta é a minha Lei. A Lei Natural da minha condição humana.
Quanto mais civilizado for um povo, menos precisa de leis, de polícias, de juízes, de carrascos, de prisões, de exércitos, de armas, de torpedeiros, de bombas atómicas. E quanto menos um povo precisar destas inutilidades, mais recursos lhe sobram para o que vai gerar a verdadeira civilização: habitações condignas; alimentos q.b.; prevenção de doenças (mais saúde); educação; trabalho, isto é, ocupações úteis à sociedade. Tudo isto num plano de igualdade para todos, visando a construção da sociedade ideal.
É natural que o Homem lute por uma sociedade ideal. Será natural o homem desperdiçar o seu tempo, o seu engenho e arte e os seus recursos com coisas que servem apenas para o destruir a si e ao mundo que o rodeia?
É o único animal que o faz.
© Foto e texto Isabel A. Ferreira
in «Manual de Civilidade»